Quantcast
10 Anos depois, a carga política dos Kalashnikov regressa ao NOS Alive

10 Anos depois, a carga política dos Kalashnikov regressa ao NOS Alive

António Maurício

«…nessa altura era o Bush que estava no poder. Hoje, é o Trump. Acho que há uma grande possibilidade dos Kalashnikov só aparecerem em Portugal quando os republicamos estão no poder.»

A música produzida com base na sátira destaca-se normalmente pela comédia, mas em certos casos também informa, alerta e educa. Os Kalashnikov tocam “war metal” alimentado pelos conflitos mundiais. Na verdade, é um exercício que se alimenta de vários problemas políticos e sociais. Com a participação nos programas “A Revolta dos Pastéis de Nata”, “Vai Tudo Abaixo” e o álbum “Oh Yeah Motherfucker!” editado em 2007, os Kalashnikov encontraram popularidade e concertos: em 2008 passaram pelo Alive, em Lisboa, e pelo South By Southwest, em Austin. Este ano, estão de regresso ao NOS Alive 18′ e vão fechar o palco comédia no dia 13 de Julho. Estivemos à conversa com Vasco Duarte e Bruno Simões.

Qual foi a vossa preparação para este regresso? Quais são as vossas ideias para o concerto no NOS Alive 18?
Vasco Duarte: Vai ser o concerto clássico de Kalashnikov, aquele concerto que costumamos tocar na Síria, no Afeganistão, naquelas zonas boas para se tocar.
Bruno Simões: Andamos sempre em cenários de guerra. Como há sempre guerras a acontecer, estamos sempre a tocar (risos)! Temos duas abordagens possíveis. Podemos falar em personagem ou podemos falar sem ser em personagem. Se falarmos em personagem, podemos dizer que nunca parámos de tocar. Se há coisa que é transversal na história da humanidade são as guerras, portanto os Kalashnikov estão sempre lá. Sem ser em personagem, tocamos pela última vez em 2008, salvo erro, na voz do operário. Realmente é um comeback.
Vasco Duarte: O que é interessante é que nessa altura era o Bush que estava no poder. Hoje, é o Trump. Acho que há uma grande possibilidade dos Kalashnikov só aparecerem em Portugal quando os republicamos estão no poder.

Vão aproveitar este novo clima político para produzir novo material?
Vasco Duarte: Não, não! Os temas de Kalashnikov são universais. A guerra não acaba! No meio da guerra não há muito tempo para compor (risos)!
Bruno Simões: Andamos lá no meio dos bunkers e das selvas e não temos tempo para compor. Na verdade, o sumo de cada tema é sempre um sumo actual.
Vasco Duarte: Vão existir canções, ou cantigas, neste caso, que têm algumas letras mudadas. Ou seja mais actualizadas com a actualidade. E o Duro (Jel) vai explicar como é que se dizem algumas palavras… Como por exemplo, hezbollah. Vamos ensinar como é que se diz hezbollah.
Bruno Simões: É uma novidade, porque caso tu vás para aqueles países, tens que perceber bem o que é que estás a dizer. Tenho a fé de que isto vai tudo abaixo.
Vasco Duarte: Na verdade foi um erro meter Kalashnikov no segundo dia do festival porque pode não existir terceiro.

A comédia é uma excelente forma de referenciar e debater assuntos mais delicados, mais polémicos.
Bruno Simões: E essa é uma das finalidades. O conceito que está por trás dos Kalashnikov, que é a banda mais internacional de sempre, a banda que toca em todo o lado… Tem que tocar sempre em cenários de guerra, porque há sempre guerras a acontecerem! Nós não nos lembramos de uma fase de paz na humanidade!
Vasco Duarte: E agora com a trilogia Trump, Kim Jong-un e Putin é sempre possível mais um destes cenários. É um “ai tamos bem, rés vés, temos guerra”.
Bruno Simões: O rés vés não deixa de ser uma guerra. A guerra fria foi muito caracterizada pelo rés vés. Há sempre uma forma de podermos rir das tragédias e das desgraças. Com a comédia, criamos a lente para podermos situar as dificuldades. No fundo, com Kalashnikov, estás a rir e a abanar o capacete porque tão cinco otários lá em cima a perdoar a cena da guerra. É uma cena contra-natura. Mas na verdade, se rirmos um bocadinho das desgraças criamos a lente para conseguirmos superar.

Nunca aconteceu receberem ameaças ou queixas pela vossa música?
Bruno Simões: Não, não. Mas tenho uma história muito gira. Tocámos aqui (no Alive) em 2008 e numa reunião em contexto de outro trabalho, calhou em conversa falar-se em Kalashnikov. Estava a falar com um brasileiro que tinha chegado a Portugal em 2008, passou pelo Alive e ouviu-nos no palco principal. A mensagem era tão audível e a dicção tão boa que ele disse «uma banda nazi!». Ou seja, ele levou aquilo a sério! Nessa mesma reunião, quando disse que fazia parte da banda, ele respondeu «nossa, essa banda! Essa puta banda que tava cantando nazi!» E expliquei-lhe que o conceito foi criado num programa de comédia, que era uma cena para rir. No fundo, quem percebe a mensagem, percebe e ri-se. Quem não sabe o conceito, pode ser um bocadinho mais duro. A verdade é que nós tivemos a tocar nos Estados Unidos e a cena foi um sucesso.
Vasco Duarte: Quando chegámos ao Estados Unidos, no Texas, toda a gente compreendeu. Em Austin, o pessoal que vai ao South By Southwest é pessoal inteligente. Nós é que vemos o Texas com rednecks. É a mesma coisa que as pessoas ainda pensarem que Portugal é só mulheres com bigode… É uma coisa que tá ultrapassada.

Quais são as bandas que querem ver no NOS Alive 18′?
Bruno Simões: Queens of The Stone Age, claramente. Também gosto muito de Black Rebel Motorcycle Club. E quero ver Pearl Jam e Alice in Chains porque fazem parte da minha juventude.