Quantcast
65daysofstatic, Paralaxe Sónica

65daysofstatic, Paralaxe Sónica

Nero

A banda fala-nos do ambicioso trabalho de criação da banda-sonora para o jogo “No Man’s Sky” e do álbum que a levou aos Chapel Studios, Castle Of Doom, dos Mogwai, e a Abbey Road.

O seu mais recente álbum parte de desafio algo incomum para uma banda: escrever a banda sonora para um videojogo. Os 65daysofstatic, a convite da Hello Games, passaram cerca de um ano a escrever a música para o jogo homónimo ao álbum, agora editado pela Laced Records, “No Man’s Sky: Music For An Infinite Universe”.

Durante duas horas de música, mostra a banda a aumentar a dificuldade do desafio, gerindo o equilíbrio entre o apelo musical para o jogo e para o ouvinte casual, respondendo àquilo que o jogo exigia e, ainda assim, criando um álbum a que qualquer ouvinte se pudesse relacionar sem qualquer relação com o jogo. «Permitimos que as canções fossem verdadeiros temas dos 65daysofstatic. Estávamos determinados em criar um álbum que funcionasse como ideia em si, independentemente do conhecimento das pessoas em relação ao jogo», diz Joe Shrewsbury, que entrevistámos.

“No Man’s Sky: Music For An Infinite Universe” é um álbum tão ambicioso quanto gracioso, com paisagens sonoras grandiosas e seguras num sentido musical experimentalista, mas com bases rítmicas e melódicas bem sólidas. A banda passará por Portugal, a mostrar o álbum, com duas datas: no Porto, no Hard Club (26 de Outubro), e em Lisboa, no Musicbox (27 de Outubro), dentro do cartaz Jameson Urban Routes 2016.

Poderá pensar-se que escrever uma banda sonora para um videojogo é semelhante a fazê-lo para um filme. Mas no jogo há interacção (por parte do jogador) que define a acção e, por consequência, também o som, em oposição ao filme que tem um argumento fixo. Como é que contornaram esta questão?
Acho que o truque foi termos abordado as formas de “banda sonora enquanto disco” e “banda sonora enquanto música de jogo” como duas coisas distintas. Ambas foram construídas com os mesmos ingredientes, mas do zero, baseadas no contexto em que seriam ouvidas. Então, na verdade, o mais semelhante a escrever uma banda sonora para um filme foi escrever canções mais tradicionalmente estruturadas para um álbum. Porque tínhamos controlo sobre a narrativa e o desenvolvimento delas, sabíamos que não iriam mudar. O som de um videojogo responsivo foi completamente diferente porque, como disseste, nunca se sabe exactamente o que vai acontecer, ou quando.

É surpreendente olhar para trás, para as bandas sonoras em MIDI dos jogos antigos, e ver o quanto evoluíram até chegar a algo como o que vocês fizeram. Foram influenciados por música de algum jogo antigo? Há algum elemento de música 8-bit que utilizaram como tributo a isso?
Não particularmente. Quero dizer, estamos familiarizados com música de velhos videojogos e temos uma profunda apreciação pela geração da música baseada em MIDI. E algumas das coisas que as pessoas conseguiram criar em jogos mais antigos, dadas as suas limitações, são impressionantes. Para além disso, é com certeza importante estabelecer-se parâmetros segundo os quais trabalhar, mesmo que sejam arbitrários. No entanto, pareceu-nos mais emocionante tentar criar algo de novo. Há bastantes jogos de computador por aí a escrever tributos à estética 8-bit. A Hello Games claramente não tinha interesse em fazer nada do género em termos visuais, pelo que não tivemos interesse em fazê-lo musicalmente.

Não gostamos muito de manter o digital dentro das máquinas do início ao fim.

Consegues recordar-te das unidades mais importantes das vossas pedaleiras e dos sintetizadores e VSTs mais relevantes para o som que atingiram neste álbum?
Na verdade, nada foi usado por si próprio. Quaisquer sintetizadores de software utilizados foram re-amplificados através de uma combinação de amplificadores e pedais. Fizemos uma série de coisas interessantes com patches Max/MSP e usámos um ambiente “live coding” chamado Tidal Cycles, que é uma linguagem baseada em padrões em formato “open-source” que faz música algorítmica em tempo real. Mas, mais uma vez, qualquer coisa desse género tendeu a ser passada por amplificadores para soar um pouco mais sujo. Não gostamos muito de manter o digital dentro das máquinas do início ao fim. Não temos muitos pedais custom ou boutique. Normalmente é o tipo de coisa que se pode encontrar em qualquer loja de música por relativamente pouco dinheiro. Não é necessariamente uma escolha nossa, mas raramente temos dinheiro para coisas caras. Para além disso, temos a tendência de partir muitas coisas em digressão e precisamos de saber que conseguimos encontrar substitutos a tempo.

Como é que geriram o vosso tempo nos Chapel Studios? Takes ao vivo, sessões de overdubbing ou ambos?
Tudo. Os primeiros prazos eram muito apertados, então ainda estávamos a escrever quando chegámos à Chapel. Normalmente, não gostamos muito de trabalhar assim – o tempo de estúdio é caro e sempre limitado. É bom não ter as canções tão pormenorizadamente compostas a ponto de não haver espaço para explorá-las num ambiente de estúdio, mas também se as trouxeres com pouco foco podes perder dias a descobrir o que queres fazer. Então havia muita pressão, mas acabou por ficar tudo ok.

Uma pausa depois da gravação e uma segunda audição, com ouvidos frescos, num ambiente novo é determinante.

Para além dos Chapel Studios, os locais de trabalho para este disco (mistura no Castle of Doom, de Mogwai, e masterização em Abbey Road) são claramente de alto calibre… nenhum músico do mundo recusaria algo do género. Como é que os diferentes estágios de produção foram preparados para cada lugar, e o quão decisivo foi cada um deles na sua função?
Tem tanto a ver com o esticar estes processos no tempo quanto com qualquer outra coisa. No passado cometemos o erro de gravar e misturar imediatamente, no mesmo estúdio. É impossível obter qualquer distância das canções. Então uma pausa depois da gravação e uma segunda audição com ouvidos frescos num ambiente novo é indiscutivelmente tão importante quanto, se não mais importante que, a localização. Não fomos ao Castle of Doom porque é o estúdio dos Mogwai, mas porque o Tony Doogan trabalha lá e gostamos das suas misturas. Ele trabalhou no nosso último disco, “Wild Light”, e funcionou muito bem, então contactámo-lo novamente para este. E Abbey Road – nenhum de nós alguma vez lá esteve, mas é lá que o Frank Arkwright faz a sua masterização. Ele trabalha muito com o Tony, e confiámos nele e na sua decisão de fazer a masterização através do Frank.

Como é que traduzem tudo isto para um formato ao vivo? Há algum compromisso ou fazem uma reprodução fiel do trabalho de estúdio?
Reproduções fiéis do trabalho de estúdio são aborrecidas, e praticamente impossíveis, de qualquer forma. As canções soarão mais altas e sujas, mas os concertos dos 65 são sempre assim. Estamos em digressão agora, a tocar material do “No Man’s Sky” ao lado de canções mais antigas do nosso repertório, e tudo tem funcionado bem até agora.