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Descobrir o Lisboa Dance Festival em 5 pontos

Descobrir o Lisboa Dance Festival em 5 pontos

Tiago Varzim

O festival lisboeta por excelência para dançar é nada mais nada menos do que o Lisboa Dance Festival.

Estamos ainda no Inverno, com a Primavera a espreitar (principalmente este ano com as temperaturas à noite quase a roçar o Agosto), e os corpos precisam de aquecer. Na segunda edição, o evento demonstrou que é capaz de deixar a música eletrónica mainstream de lado e, em contrapartida, de ser um melting pot para vários estilos de música e nacionalidades.

Esta incursão na EDM alternativa – mas tolerante a influências exteriores – de dois dias é uma descoberta constante. Este é um festival para tod@s, com um cartaz que não está dependente de certos padrões. Pelo contrário: é nessa luta contra o que é comum ou dado por adquirido que acaba por criar a surpresa. Seja nos nomes portugueses que, quem não está tão ligado ao meio não conhece, seja nos nomes internacionais, havia sempre uma sala a alargar-nos os horizontes.

1. A antiga fábrica de Alcântara
O Super Bock Super Rock tornou-se num festival citadino, mas o ambiente não se compara com aquele que o LDF consegue criar. O festival realiza-se na antiga fábrica de Alcântara que, atualmente, alberga uma variedade de empresas. Contudo, acima de tudo, o LX Factory é um poço de arte que se vai alimentado diariamente, capaz de nos surpreender a cada visita. Diríamos até que, por se ter transformado num dos lugares mais trendy de Lisboa, é o local que mais fotografias proporciona para o Instagram. Certo? Certo. O ambiente constrói-se logo a partir do momento em que vemos o lettering luminoso à entrada deste hub criativo onde fica mais fácil dançar. Se por um lado o isolamento dos espaços não deverá ser o melhor para os DJ sets, não há dúvidas de que o toque vintage dos edifícios cria a envolvente perfeita para o momento artístico.

2. Às vezes apetece-me apenas ouvir um instrumental, sem palavras
Foi uma entrevistada quem o disse, mas aproprio-me aqui da ideia para a corroborar e a sustentar com argumentos. Foi a californiana TOKiMONSTA (Jennifer Lee) quem proferiu as palavras: «[A parte de não ter letras] é o que faz da música eletrónica diferente. Às vezes as pessoas nem querem ouvir palavras». E acredito que isso seja verdade para muitos dos que se deslocaram até Alcântara para ouvir os artistas que passaram pelo festival. Não é falta de significado. Pelo contrário: cada pulsação da música entranha-se nos movimentos do corpo que, por sua vez, incorpora de forma única a sua interpretação. Não estamos a falar de meter as mãos no ar. Nada disso. A melhor comparação que me surge é a forma como a artista neozelandesa Lorde se expressa ao vivo ou nos videoclips. 

3. A música europeia dançável está na moda?
“Eurodance, a sério?” Sim, a sério. Se por um lado parece aquele tipo de música que se ouvia (ou ainda ouve) junto de carrinhos de choque, também se pode argumentar que as novas gerações têm conseguido renovar o estilo. Não quero aqui fazer uma ponte entre o que se ouviu no LDF e a eurodance dos anos 80 e 90 que tantos hits nos deu. Mas enquanto ouvia alguns dos sets, principalmente de Hercules & Love Affair, vieram-me à cabeça esses instrumentais repetitivos, mas tão únicos e inesquecíveis que nos fazem recordar essa junção de techno e house. Acima de tudo, faz lembrar como é cada vez mais necessário cumprir com o verdadeiro ímpeto da música dançável… fazer dançar.

4. As talks e os workshops
Num festival tão internacional por metro quadrado, não há receio em ceder à dominação anglo-saxónica no palavreado. Mas o conteúdo foi bem português: entre a emancipação feminina, a emancipação do hip hop, a emancipação da música portuguesa no contexto internacional e a emancipação das redes sociais como método de comunicação primordial houve muito a aprender. Se as paredes da Fábrica L falassem de lá sairia bastante sabedoria depois de um sábado alimentado pelas personalidades pensantes do meio. Sem preconceitos e com uma abertura que me surpreende pela positiva, até pelos desbravar das fronteiras entre estilos. Já as materclasses devem ser sido mel para os produtores (ou aspirantes a) dada a diversidade de formações, dicas e conselhos que por ali passaram. Limitei-me a observar e apreciar a criação musical que acontecia à minha frente.

5. A EDM portuguesa tem alcance internacional
Não é por acaso que, quando perguntei a TOKiMONSTA que artista português conhecia, a norte-americana não hesitou em dizer Buraka Som Sistema com o seu sotaque que até torna, para nós, o nome mais sofisticado. Será, claro, influenciada pelos festivais que percorre, de géneros compatíveis com o som da banda portuguesa, mas é também um indicativo de que o trabalho da Enchufada – apoderando-se das influências da lusofonia e não só – consegue construir um sentido global que agrada a seres humanos, independentemente de raças, etnias, berço ou ar que respiram. O mesmo acontece para o projeto de Moullinex e Xinobi (Discotexas) que nos abriu a sua Open House no primeiro dia de festival. O quão internacional consegue ser um abacaxi? Luís Clara Gomes responderá melhor, mas posso atirar que esta música tem muito sumo. E o espaço é o limite.

Nota: o portento musical que é o projeto Batida revelou-se ainda mais inspirador no seu formato DJ set. As mensagens, os sons da rádio e a atmosfera criada pelo cenário em palco fazem-nos acreditar que se pode embrulhar sempre de maneira diferente um “produto” já testado e vendido. A sala foi demasiado pequena para tal imensidão de talento. Neste caso agradecemos que haja letra, uma mensagem política e de libertação.

Até para o ano. Com amor.