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ROCKIN‘1000 – That’s Live: Maior banda de rock do mundo bate record

ROCKIN‘1000 – That’s Live: Maior banda de rock do mundo bate record

Ricardo Rego
Viviana Vitale, Yari Boschetti, Paolo Ciriello

O evento decorreu na Commerzbank Arena em Frankfurt no dia 7 de Julho de 2019.

Foi batido um novo recorde mundial para a maior banda de rock a dar um concerto. O evento organizado pela ROCKIN‘1000 – That’s Live reuniu 1002 músicos na Commmerzbank Arena em Frankfurt no dia 7 de Julho de 2019, perante uma assistência de 15.000 espectadores. O repertório do concerto consistiu em clássicos de Deep Purple, Rolling Stones, Oasis, entre outros. O record foi aprovado pelo juiz da RID Record Olaf Kuchenbecker.

Ricardo Rego, colaborador da Arte Sonora, esteve presente no evento e conta-nos como foi a experiência.

Desde que, em Julho de 2015, lançaram o vídeo da “Learn to Fly”, gravado em Cesena, que andava de olho na malta do Rockin 1000. Fui vendo os vídeos das diferentes iniciativas e até comprei o CD “That’s Live 2016″. Mas quando no ano passado, a caminho do festival Punk in Drublic, cheguei ao centro de Milão e vi cartazes enormes a anunciar o concerto dos Rockin 1000 num estádio grande em Florença com a Courtney Love como convidada especial, apercebi-me que as coisas estavam a tomar outra dimensão. Foi nesse momento que decidi tentar a minha sorte para tocar com eles.

 

O CASTING

Uns meses mais tarde fui ao site www.rockin1000.com e vi que estava aberto o casting de músicos para concertos que se iam realizar em 2019. Gravei um vídeo a tocar a linha de baixo da “Give it Away”, com a minha filha a pular de um lado para o outro para compensar a minha falta de presença, submeti e passado uns dias recebi um mail a dizer que já pertencia à “maior banda do mundo”. Finalmente foram anunciados os tais concertos: Stade de France em Paris a 29/06/2019, não fui a tempo de arranjar vaga, e na Commerzbank Arena em Frankfurt a 07/07/2019, onde consegui ser um dos primeiros a garantir uma vaga como baixista.
Seguiram-se umas semanas de alguma ansiedade, muita expectativa, intercalados com alguma desconfiança. Será que ia ser efectivamente uma boa experiência, ou será que ia ser uma convenção de músicos falhados a tocar numa banda de covers gigante?

DICA: Há boatos de que para o ano vão organizar mais uns concertos. Quem estiver interessado em tocar é só ir a www.rockin1000.com e clicar em “Come and play”. A aprovação não demora mais do que 4 ou 5 dias. O registo nos concertos é feito na base do primeiro a registar, primeiro a entrar.

OS ENSAIOS

O processo de selecção é simples e o dos ensaios também. Tudo é gerido através de uma App onda vão sendo colocadas informações sobre o concerto e onde vai sendo inserida uma setlist para cada concerto com os respectivos tutoriais, tablaturas, partituras e clicktracks. Os clicktracks são a base que cada músico tem para tocar com os tempos, backtrack e dicas para entradas de cada instrumento, pausas, refrões, etc.
Os ensaios no local começam dois dias antes do concerto e é aí que as coisas começam a ficar interessantes. Como o estádio estava ocupado para o concerto dos alemães Frei Wild (disseram-me por lá que são uma banda rock de extrema-direita que gosta muito de vocês sabem quem, e não estou a falar do Voldemort), os instrumentos são instalados num terreno, próximo, no meio da floresta e começam os ensaios. Todos os músicos usam headphones de onde se ouvem os clictracks e as instruções dadas pelo maestro e pelos “gurus”, responsáveis pelos arranjos e tutoriais dos diferentes instrumentos. Primeiro só baixos, depois só guitarras e finalmente só baterias. Os restantes instrumentos e vozes estão a ensaiar num pavilhão.

O Maestro de serviço é Wolf Kerschek. Tem uma assertividade, simpatia e sensibilidade fora do normal. É compositor, condutor, músico, produtor e professor universitário. Detém, inclusive, o record mundial da maior orquestra do mundo, com 7,548 músicos. Outra dos pontos positivos dos ensaios com Wolf Kerschek são as histórias que vai partilhando durante os ensaios. Por exemplo, enquanto nos falava sobre a dinâmica chorus + verse da “Smells Like Teen Spirit”, contou-nos a história que um dos seus melhores amigos participou na gravação do “Nevermind”. Todos os amplificadores foram colocados atrás de uma porta. Quando entrava o refrão, abriam a porta para dar mais poder e força ao som.

Rockin1000_Frankfurt_photo by Paolo Ciriello15

Do primeiro dia de ensaios destaco duas coisas verdadeiramente impressionantes:
1 – Já toquei em bandas e sei bem a luta que é às vezes ter 3 ou 4 músicos a tocarem ao mesmo tempo. Em Frankfurt, e com centenas de músicos, é admirável a coordenação que houve logo a partir do primeiro segundo de ensaios;
2 – 250 baterias a tocar ao mesmo tempo fazem um estrondo de som que até hoje ainda não tinha ouvido.
O segundo dia de ensaio, já dentro do estádio, foi bastante tranquilo. Serviu para montar toda a estrutura e afinar alguns detalhes. Para os nerds da música, como eu, é uma experiência incrível passear por um relvado com centenas baixos, guitarras, baterias e amplificadores espalhados por todo o lado.
Para o último dia ficou reservado um ensaio geral, das 09:00 às 12:00, descanso e convívio e finalmente, às 20:30, a entrada em campo. E aí as coisas ganham uma dimensão gigante.

DICA: Sobre o material, há duas opções: Ou cada músico leva os seus instrumentos ou podem alugar a uma empresa de backline. Se soubesse o que sei hoje tinha alugado. Os baixos disponibilizados eram de Fender Jazz Bass para cima e os amplificadores eram, na sua maioria, combos. As guitarras ou eram Strats americanas ou Les Pauls e os amplificadores Hughes & Kettner.

O CONCERTO

O que começou como uma brincadeira do italiano, e mentor deste projecto, Fabio Zaffagnini, que apenas queria chamar a atenção dos Foo Fighters, tornou-se agora na realização de algo inconcebível para a maioria dos mortais: a oportunidade para tocar rock n roll do bom, em estádios de futebol e com públicos de dimensões bastante consideráveis (55.000 pessoas em Paris e 15.000 em Frankfurt). São muitas experiências numa só. É o prazer de ouvir e tocar músicas que muito nos dizem, o prazer de ouvir um som pujante de centenas de instrumentos em uníssono e o prazer de ver um público a aplaudir, vibrar e gritar com o que estamos a fazer. Tudo isto feito por pessoas que 48 horas antes eram perfeitos desconhecidos. Eu não sou grande fã da nossa raça, acho mesmo que fomos a pior coisa que aconteceu ao planeta, aos animais e até mesmo a nós próprios. No entanto, o que vi e vivi em Frankfurt deu-me aquela esperançazinha e a sensação de que se calhar nem tudo é assim tão mau.

Em baixo, vê a fotoreportagem.

 

A SETLIST

Highway to Hell – Clássico absoluto! Fácil de tocar.
Should I Stay or Should I Go – Ginga boa. Uma das preferidas da minha filha mais velha nesta setlist.
Smells Like Teen Spirit – A entrada das baterias é indescritível!
Learn to Fly – A razão pela qual estivemos todos lá.
Seven Nation Army – É bonito de ouvir 200 baixos a interagirem com 250 baterias nesta música. Talvez tenha visto a minha filha a saltar lá na antepenúltima fila do estádio.
Don’t Look Back In Anger – Balada#1.
Bitter Sweet Symphony – Entram as cordas. Balada#2 e um cenário incrível com todas os telefones com a lanterna ligada. Muito emocional. Descanso dos dedos para o que aí vem.
Smoke On The Water – Outro clássico. Boa linha de baixo.
Hier Kommt Alex – Primeira das três músicas alemãs. Até ao dia do primeiro ensaio nunca a tinha ouvido. Amplificador em mute e a fazer de conta que estava a curtir.
Jumpin’ Jack Flash – Ao descobrir a linha de baixo, a música ganhou outra dimensão. Funcionou com 1.002 músicos muito melhor do que tinha imaginado.
Won’t Get Folled Again – Linha de baixo a roçar o impossível parte I, pelo menos para mim e para outro alemão que estava ao meu lado. O resto da malta tocou a bom tocar. Oportunidade única para dar aquele Lá Maior bem dado, logo a seguir ao instrumental a meio da música.
Hard to Handle – Entram os sopros. Bom groove no baixo.
Sexy – Segunda das três músicas alemãs, e a única que toquei. Tem a minha linha de baixo preferida de todo o setlist.
Oh Jonny – Terceira das três músicas alemães. Amplificador em mute.
Born to Run – Linha de baixo a roçar o impossível parte II. Outra música que ganhou nova dimensão ao (tentar) aprender a tocar.
Uptown Funk – Outra das preferidas da minha filha. Bom Groove e toda a gente a curtir.
Killing in The Name – Apoteose total. Dos headphones vinham a instruções “Destroy the stadium!” e quase que veio a baixo!
Medley Zeppelin/Hendrix – Encore. Passagem pela Purple Haze, Foxy Lady, Kashmir, Moby Dick, Heartbreaker, Communication Breakdown e Whole Lotta Love.

O RESCALDO

No jorro de comentários que foram sendo partilhados pelos músicos que participaram nos concertos, há um em particular que me marcou e se aproxima do que senti. Um dos músicos de Paris escreveu que participar no concerto do Stade de France tinha sido o cumprir de um sonho que nunca sequer tinha ousado a sonhar. Mais de um mês depois do concerto, a experiência ainda não parece real.
Foram duas horas de concerto que souberam a 15 minutos. Uma experiência incrível, uma das mais incríveis que tive a oportunidade de viver. Diz quem viu da bancada que a experiência de assistir a isto foi igualmente única e incrível, diferente de qualquer concerto que alguma vez tenham assistido. Além do óbvio, são duas experiências completamente diferentes. Quem toca houve 5% o que está a fazer, 25% os instrumentos do grupo onde está, 70% as baterias e 0% do resto. Quem está no público ouve e vê tudo.

Há um grande ambiente de comunhão e partilha. Mesmo num lugar onde estão centenas de guitarristas, não há egos. Num cenário onde o caos seria um dado adquirido, tudo corre bem. E corre bem porque quem lá está, está por amor à música, por amor ao rock e quando se faz as coisas por amor, não há como correr mal. Cereja no topo do bolo, foi record mundial reconhecido pelo Rekord Institut da Alemanha. “The largest performing rock band”.

Uma palavra final de agradecimento a todos os que participaram e organizaram esta aventura, em especial ao Fabio por ter tornado o sonho dele, num sonho nosso. Nas palavras do próprio «já é tempo de nos unirmos. Ninguém consegue perseguir um sonho sozinho e nós nunca estamos sozinhos, estamos apenas isolados. E neste isolamento não nos conseguimos aperceber do que conseguimos realizar.»

Um grande obrigado também à minha família por lá ter estado, em especial à minha mulher, aos meus pais, por serem os melhores roadies que tive até hoje, e à minha filha Clara por me ter inspirado para saltar e dançar.