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O culto Aphex Twin

O culto Aphex Twin

2017-06-10, NOS Primavera Sound'17
Pedro Miranda
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O grau a que Aphex Twin goza do estatuto de fenómeno é qualquer coisa de verdadeiramente extraordinário – e não menos entre os portugueses.

Começando pelas tshirts, várias e variadas, que se avistavam nas imediações, passando pelas conversas de antecipação e até aos boatos que circulavam, sempre sem confirmação (espalhou-se que o próprio Richard D James estaria mesmo pelo Maus Hábitos nos dias que antecederam o seu espetáculo), a onda por trás da personagem fez-se sentir sem mãos a medir. Sem surpresas, tendo em conta todo o mistério por trás do qual Aphex Twin esconde a sua pessoa, qual manifesta recusa da notoriedade geralmente associada a estas profissões.

Uma ferramenta, aliás, perfeitamente visível e empregue sem moderação ao longo do seu concerto, um dos melhores e mais notáveis da noite de fecho do NOS Primavera Sound. A aliar à destreza do jogo de luzes trazido, imagens pervertidamente distorcidas de si surgiam e desapareciam nos grandes ecrãs, como que ridicularizando a cara que se colava a políticos, figuras públicas e mesmo à plateia que era filmada no local. Uma visão em iguais partes surreal e sinistra, que muito contribuía ao ambiente da sua música que, não por acaso, poderia ser descrita da mesma maneira. É que aquilo que Richard James cria não é, em qualquer medida, música de fácil acesso, e muito menos propícia a ser exibida num palco da dimensão do principal do Primavera Sound – o que tornou a experiência, de certa forma, ainda mais desconcertante.

Nunca seria, portanto, daqueles concertos de que se apanha um par de temas e se faz, logo ali, um diagnóstico expresso e a pronto pagamento. Aphex Twin é muito mais subversivo do que isso, atinge com nuance no lugar de estrondo, e exige mais paciência do que o primeiro contacto pode dar a entender. Mas, deixando o espectador os olhos postos e a mente atenta no sujeito pelo tempo necessário, e tornava-se difícil não se envolver na transe que, tendo o seu epicentro na música, não deixava de transcendê-la a largos passos, pelo menos a quem se deixasse levar pela sua corrente. Uma experiência a poucas comparável, cujas 2h de duração só se tornaram mais magníficas pelo esplendor do contexto em que se situava. Mais cabeças-de-cartaz assim para 2018, e o investimento não será, com certeza, em vão.

Foto: © Hugo Lima | www.hugolima.com | www.fb.me/hugolimaphotography