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Super Bock em Stock’18: A Selva & Outros Destaques

Super Bock em Stock’18: A Selva & Outros Destaques

António Maurício
Inês Barrau
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Jungle, Rejjie Snow, Conner Youngblood e Elvis Perkins protagonizaram o segundo e último dia do festival Super Bock em Stock.

O segundo e último dia de festival começou com folk carregado de verdade e sentimento, continuou com um indie assumindo referência a Bon Iver, hip-hop com vários tamanhos e feitios e terminou com eletrónica neo e soul. Assim foram os concertos de Elvis Perkins, Conner Youngblood, Rejjie Snow e Jungle.

ELVIS PERKINS | A noite via-se formosa, com uma lua cheia a iluminar as costas de Elvis Perkins. O artista americano apresentou-se sozinho no palco exterior Rádio SBSR (Estação Ferroviária do Rossio) e, de guitarra na mão, caminhou sozinho pela acústica e sensível “While You Were Sleeping” – uma canção escrita em memória da sua mulher que faleceu no ataque de 11 de Setembro. A comovente introdução em estilo folk marcou o ritmo para um concerto sereno. No entanto, a sonoridade cresceu no momento seguinte, quando chegaram os responsáveis pelo baixo, teclado, bateria e saxofone, elevando o estilo folk até um patamar indie rock simplista.

As palavras expostas por Elvis têm muito peso – contam histórias, criam sentimentos e partilham reflexões – fazendo todo o sentido uma instrumentalização mais descontraída para que a absorção da mensagem seja o mais eficaz possível. A bateria ouviu-se seca durante praticamente todo o concerto e o saxofone entrava periodicamente com toques de jazz. Ouvimos vários surtos de imaginação carismáticos por parte do teclista e, a certa altura, a baixista carregou um acordeão moderno nas mãos. A sincronia entre a banda é evidente e exponencial e em “Send My Fond Regards to Lonelyville” Elvis revelou o seu pico de performance. As baladas, focadas em letras emocionais são o seu grande talento e a camada instrumental simples assenta-lhe que nem uma luva.

CONNER YOUNGBLOOD | A afável Sala 2 do cinema São Jorge recebeu o calmo e ecléctico Conner Youngblood numa performance autenticamente relaxante. Começámos por ouvir uma voz meio robótica (em sample) a repetir a mesma frase, durante alguns minutos, enquanto Conner soltava notas periódicas com o saxofone, mas sempre muito controlado. Em seguida, e com toda a pacatez, pousou o saxofone no seu devido suporte e agarrou na guitarra acústica que antecipou por fim a entrada do baterista, criando a primeira onda de emoções.

A actuação foi dividida em vários fragmentos, momentos que transparecem diferentes tipos de ambientes – sempre homogéneos, sempre baseados na calma e tranquilidade. Com um efeito vocoder (naturalmente associado a Bon Iver) em “Stockholm”, entre outras, o artista norte-americano envolve-se em simples camadas electrónicas que permitem o desabafo de pensamentos e ideias em vocalizos muito leves e hipnóticos. A bateria simplesmente marca o ritmo, nunca assume destaque, funciona como um metrómeno mais composto.

Em “Lemonade”, música retirada do mais recente álbum editado (“Cheyenne”), as melhores qualidade deste género indie foram equilibradas da melhor forma possível – com uma prestação ideal do que se ouve em versão de estúdio. Através de canções ligeiramente ritmadas e outras mais contemplativas (sobre uma instrumentalização quase nua), Conner cria um espectáculo onde a tranquilidade é a base de tudo.

REJJIE SNOW | Estreou-se em Portugal como “cabeça de cartaz” do Capitólio, a sala exclusivamente dedicada a sonoridades hip-hop. Em prol da digressão do álbum “Dear Annie”, o artista oriundo da Irlanda originou uma enorme afluência de público, lotando a 100% a sala e criando um fila que se arrastava até ao cruzamento com a Avenida da Liberdade.

Antes da entrada em palco, o DJ que o acompanha encarregou-se do típico ritual – um aquecimento com as músicas mais populares do hip-hop actual. Mas Rejjie não é categorizado entre o mainstream, a música que distribui em palco relembra alguns dos hits dos anos 90, misturados entre produções mais contemporâneas. “Egyptian Luvr”, um dos sons mais popularizados no novo álbum, levantou a maior onda de movimento entre a plateia, em grande parte fruto da excelente produção de Kaytranada (criador de excelentes instrumentais que aglomeram hip-hop e dance), não retirando o mérito ao flow impecável e metricamente alinhado com o beat e à atitude, carácter e energia.

Recuando até trabalhos mais distantes na sua cronologia, a faixa “Olga (1984)”, da mixtape “Rejovich” (2013), encontrou espaço entre a setlist. A batida boom-bap, com sample de “In A Sentimental Mood”, da majestosa Sarah Vaughan, ecoou extremamente bem ao vivo, com um maior controlo e projecção de voz. Um mimo para os adeptos de rimas e sequências em instrumentais mais “crus”. Apresentou ainda um outro tipo de ambiente nos últimos capítulos, o da energia máxima, conveniente ao mosh. Após o círculo no meio do recinto se formar a pedido do DJ, Rejjie disparou “Flexin” enquanto saltava pelo palco – um hino em género trap às conquistas que soma através da sua carreira, e, sonoramente, desviando-se do estilo presente no seu baralho. Os desvios podem ser dúbios, mas, considerando o total, a diversificação sublinhou a performance da melhor forma possível.

JUNGLE | “Cabeças de Cartaz” da sala principal (Coliseu de Lisboa), começaram com uma potência admirável mas, infelizmente, encontraram dificuldades técnicas perto do final. “Smile”, a faixa introdutória do mais recente álbum editado em 2018, “For Ever”, inaugurou uma qualidade de som que se mostrou em alta-definição. A bateria polida e potente abriu as primeiras notas sonoras e a entrada das vozes retirou qualquer dúvida sobre a capacidade de transpôr os ritmos electrónicos e por vezes psicadélicos – facilmente dançáveis – para uma plateia ao vivo. E “California” reforçou esta ideia de que estávamos perante um talento genuíno, sem truques de pós-produção, com os dois protagonistas Josh Lloyd-Watson e Tom McFarland a liderarem o conjunto de sete músicos.

Em “Happy Man”, pintada com algumas cores de soul e funk, existiu uma intermissão para palmas, comandadas pela banda a meio do verso e em formato de antecipação e entusiasmo até à chegada do refrão. Os breaks confeccionados são também motivo para admiração, além de criarem momentos mais calmos de modo a que os momentos mais intensos se destaquem, são conjugados com um jogo de luzes durante todo o concerto.

Tudo parecia ir às mil maravilhas, até que os instrumentos decidiram fazer aquilo que todos os músicos detestam – problemas técnicos a meio da uma música. Após mais de metade do concerto, uma das peças estava em falta durante o início “Crumbler”, deste modo, Josh Lloyd-Watson, parou a performance a meio para que pudessem recomeçar. Novamente, a peça continuava em falta e a canção não foi terminada. O teclado de Tom McFarland tinha perdido as suas capacidade e toda a banda foi evacuada para que os técnicos de som pudessem resolver a questão. Alguns minutos e muitas palmas depois, os Jungle estão de volta ao palco, totalmente prontos para saírem novamente… Desta vez, era a bateria a causar problemas. Muita desculpas por parte de Josh, mas a tensão no ar ficou inevitavelmente selada.

Regressaram de forma definitiva com “Casio”, mas a confiança apresentada no início tinha desaparecido. Fecharam o concerto com “Busy Earnin” e “Time”, desprovidos do vigor anteriormente apresentado, no entanto, tecnicamente não existiram mais peripécias. Um final inglório.