Se no dia 18 se tinha aberto um leque abrangente, no dia 19 apostou-se numa ventoinha direcionada. Pela reação aos concertos de The Blaze, Ata Kak, Arlo Parks, Chinaskee e Kelly Lee Owens, a aposta compensou.
No Vodafone Music Sessions de dia 18 no Vodafone Paredes de Coura houve Nuno Lopes no meio do rio Coura, no dia 19 houve Chinaskee no meio de uma autoestrada em construção. A banda ia atuar na vila nos dias que antecediam a abertura oficial do festival, contudo a situação meteorológica impediu o concerto, em alternativa surgiu esta oportunidade.
As altas temperaturas sentidas no asfalto fresco só aumentaram, assim que a banda, toda de vermelho, deu de si. “Nunca mais tocamos seis de seguida”, Miguel Gomes quebrou assim o gelo depois de um arranque frenético a estrear o piso do novo braço da A3.
Seguiu-se a malha mais calma até ao momento, mas não por isso menos forte nas guitarradas. Nos saltos rápidos entre canções houve espaço também para um cover do clássico de Las Ketchup num alinhamento que incluiu “Desanimado”, single do último álbum “Bochechas” editado em 2021. Projeto onde já se vê um alinhamento diferente do que editou “Malmequeres” em 2017. Uma música final, sem um “solo grande coisa”, a parecer o oposto, finalizou a Music Session.
Surgiu com mais quatro elementos ao vivo a cantora de 22 anos, Arlo Parks, que editou pela primeira vez aos 18. O álbum completo, esse, só surgiu em 2021. Em “Collapsed in Sunbeans” a Londrina afirmou-se no panorama alternativo com a sua incursão pelo bedroom pop, de certo modo por necessidade, mas ultimamente por querer espalhar a sua mensagem.
No seu concerto ao anoitecer no palco Vodafone, Arlo Parks, nome artístico de Anaïs, falou-nos de esperança, melhores amigos e do próprio quarto numa performance intimista e sentida. Apesar de apenas ter estado em palco por menos de uma hora, os seus maiores êxitos “Eugene” e “Too Good” com rodagem frequente na rádio da Vodafone fizeram parte do alinhamento. Sensivelmente a meio do concerto Arlo dedicou “Black Dog” ao seu melhor amigo e admitiu que “Bluish” começou como demo ainda no seu quarto. No final, Parks anuncia que só faltam mais duas faixas, sendo a primeira “Hope” com a qual espera inspirar os presentes a manterem esperança nas suas próprias vidas.
Arlo Parks faz música para se dançar ligeiramente ao pôr do sol e foi exatamente o que aconteceu no quarto dia do festival, A temperatura amena e o laranja tendencialmente mais escuro fizeram das canções da artista, um tesouro.
Kelly Lee Owens provém do país de Gales mas foi após desistir da carreira como enfermeira auxiliar em Manchester e mudar-se para Londres que começou a sua carreira musical. A artista sucedeu os seus dois bem recebidos projetos com “LP.8”, editado este ano. Este último já não foi tão bem recebido pelo público apesar das consistentes críticas, contudo a sua performance ao vivo mostra que está longe da quebra.
Surpreendeu, quer pela sua entrega, quer pelo dinamismo e vontade de fazer os corpos, ainda moles do concerto de Parks, mexer. Um salto musical bastante notório e diferenciado apanhou quem desconhecia o seu trabalho de surpresa. Sabemos que, por vezes, limitações dos próprios artistas comprometem a programação e os próprios horários, contudo, para uma transição mais suave entre concertos o alinhamento do palco principal no dia 19 deixa qualquer confuso. Kelly Lee Owens entre Arlo Parks e Ty Segall quando depois vinha The Blaze? No mínimo peculiar.
A situação não parece ter afetado muito Kelly, no entanto, e o seu set mostrou que o porquê da artista ter sido a escolhida para compor a música do mundial de futebol feminino de 2023.
Enfrentando a mesma circunstância que Kelly, Ty Segall & The Freedom Band, encontraram à sua frente um público divido. O concerto, ainda assim, rápido e forte na guitarra, como seria de esperar, foi algo salobro para quem não é fã. Sequenciando faixa com faixa, o californiano, Ty, saudou o público já o espetáculo levava mais de meia hora. Lá está, quem gosta deve continuar a gostar, quem tem um gosto especial por guitarras e por alguma razão não conhecia deve ter ficado a gostar, para os restantes: indiferença.
The Blaze apresentou um espetáculo estimulante em mais que um sentido. Quem viu os franceses em palco esquece que só editaram um álbum e um Ep. Membros oficiais do clube, Deep House, género onde se inserem, apresentaram-se no Vodafone Paredes de Coura acompanhados por seis móveis ecrãs que só enalteceram a performance. O concerto do quarto dia veio de um grupo do qual não morria de amores mas ao qual ficarei mais atento.
Tão atento como os presentes, foi o acto que fez levantar o público ainda maioritariamente sentado naquela fresca noite. Ninguém queria perder os visuais e à medida que os ecrãs “dançavam” público dançou também ao som das faixas do duo Francês numa performance que se assemelhou ao espetáculo dado pelos Justice no Primavera de 2017 se estes tivessem mais calma(ainda bem que não têm).
Fechado o palco principal a multidão divide-se entre a área de restauração, a tenda e o palco secundário onde mentes estavam prestes a abrir. Ainda a primeira música de Ata Kak ia a meio e já se ouvia o burburinho entre a multidão, que língua é esta? Ou não percebo nada do que ele está a dizer, ouvia-se entre os presentes.
A história que levou Ata Kak a atuar em festivais pelo mundo e, eventualmente, no Vodafone Paredes de Coura é tão rara quão fantástica, um verdadeiro testamento da música como forma de arte genuína, despromovida do que a reduz. Yaw Atta-Owusu ia, acompanhado pela sua banda, desferindo sérios golpes no convencional para os inicialmente mais relutantes e, mais tarde maiores fãs. Conquistando com o apoio dos que o conheciam o público rendido à sua personalidade e groove da sua música.
Um concerto especial, dançável do primeiro ao último tom, à frente do palco Vodafone FM não se viu um singular corpo parado. A única coisa menos positiva mas mesmo assim especial, a maneira como Yaw lidou com o público a repetir “Obaa Sima” mesmo depois do fim da música. O ganês repetiu agradecimentos e sorrisos enquanto esperava o silêncio da multidão que repetia o título da faixa durante demasiado tempo. Quando essa porção do público finalmente se silenciou, Yaw mostrou classe e ligeireza começando por dizer que o concerto era nos dois sentidos, dele para nós e de nós para ele, desistindo do que queria fazer inicialmente após a faixa, ignorando e seguindo com o concerto.
Para aproveitar o espírito no espaço, rapidamente seguiu-se Mall Grab, o Dj e produtor australiano tem capitalizado e bem no sucesso obtido na internet. Mall Grab passou pelo Indústria em março de 2022 numa passagem que não foi a primeira em territórios lusos. Jordan Alexander que, também tem na bagagem um EP editado em colaboração com os Turnstile que atuaram no dia anterior, fechou a sexta-feira com um set apto e eficaz.