Assistimos à ante-estreia do documentário sobre o Fyre Festival produzido pela Netflix e retiramos algumas lições de trabalho, vida e moral.
Se já ouviste falar no Fyre Festival, provavelmente não foi por uma boa razão. Anunciado e publicitado como um festival de luxo numa ilha nas Bahamas (ilha que pertenceu na Pablo Escobar) em 2017, tornou-se num dos maiores fiascos de sempre na história dos festival de música. Billy McFarland, CEO e cara do evento, foi encarcerado por fraude (entre outras ilegalidades) durante 6 anos. A história contada por membros da equipa (incluindo imagens de Ja Rule e McFarland) participantes e habitantes das Bahamas será apresentada pela Netflix – num novo documentário intitulado “Fyre: o grande evento que nunca aconteceu”, com estreia no próximo dia 18 de Janeiro. A Arte Sonora assistiu à pré-estreia e mostra-te seis pontos a reter.
1.Um festival de grandes dimensões não é pêra doce
A organização de um evento torna-se simultaneamente mais difícil e complexa em prol da sua dimensão. Se um festival dito “normal” possui longos tempos de preparação (meses ou até anos), quanto será o tempo necessário para a produção de um festival numa ilha das Bahamas? Não sabemos, tal como toda a equipa do Fyre Festival não o sabia. O primeiro dia de festival gerou um caos humano que foi referido pelos festivaleiros como «Inferno na Terra» – as tendas (previamente anunciada como salas de luxo) não eram suficientes, a água não era suficiente, a comida não era suficiente nem de qualidade e claro, todos os artistas cancelados, mas esse era o menor dos problemas.

2.Poder dos “influenciadores” digitais
O Fyre Festival ganhou rapidamente popularidade na internet através da publicidade e de uma excelente campanha de Marketing. O festival foi inicialmente apresentado através de um trailer de sonho, e em seguida, divulgado por dezenas de “influeciadores” do Instagram, com milhares de seguidores. Este fluxo de publicidade em redes sociais criou um enorme mexerico online e foi documentado como a razão principal pela qual o festival foi tão bem-sucedido na venda de bilhetes, que esgotou em poucos dias. Apesar da tragédia posterior, a equipa de marketing e publicidade (constituída por profissionais de alto calibre) executou um trabalho inigualável e impulsionou rapidamente uma marca desconhecida no mercado. Uma curiosidade, o Fyre Festival foi apresentado na edição de 2016 da Web Summit que se realizou em Lisboa e em “Fyre” podes assistir a esse momento.
3.Expectativa vs. Realidade
«A melhor comida, estadia e música» – uma promessa que foi substituída por: sandes em pão de forma com fatias de queijo processado, tendas em segunda mão previamente utilizadas como protecção de emergências para vítimas de tempestades e música aleatória disparada num palco vazio. A desilusão dos participantes também é apresentada, com descrições, histórias e imagens em primeira pessoa. Imagina pagares 500€ por um fim-de-semana de luxo e, em vez disso, encontrares um cenário pré-guerra onde não podes voltar para casa porque os aviões estão sobre lotados.
Early report is that many of the tents aren’t assembled. Here’s their tropical private island owned by Escobar! #FyreFestival pic.twitter.com/TNzBDbNAUJ
— FyreFestivalFraud (@FyreFraud) April 27, 2017
4.Quando a esmola é muita, o pobre desconfia
Além do marketing praticado por estrelas do instagram, o preço dos bilhetes acabava por ser atractivo nas categorias mais baixas. Os bilhetes de 750 dólares incluíam uma viagem (ida e volta) de avião, acomodação, comida de luxo e entrada em todos os palcos, basicamente, tudo pago numa ilha nas Bahamas. Foram várias as pessoas que compraram este “pacote” com o intuito de desfrutarem de férias paradisíacas, onde a música era apenas mais extra. Várias entidades tentaram alertar os compradores e até cancelar o evento com informações que rebatiam a impossibilidade destes preços, como o Twitter fyrefraud.
One of the kitchens at Fyre Festival. #fyre #fyrefest #fyrefestival pic.twitter.com/gQIpwxrw6S
— William Needham Finley IV (@WNFIV) April 28, 2017
5.Redes Sociais
As redes sociais foram paralelamente a ferramenta de construção e destruição do festival. Proporcionaram um enorme buzz, com dezenas de fotos e vídeos promocionais que rapidamente fizeram vender todos os bilhetes de uma primeira edição de um festival, sem referências, e organizado por alguém sem experiência. Por outro lado, as redes sociais foram igualmente as responsáveis pela queda livre do festival em velocidade astronómica. Os participantes apressaram-se a partilhar fotos, vídeos e actualizações sobre o não-festival como forma de protesto. Este material, em poucos minutos, tornou-se em memes e propagou-se por todo o mundo. A risada de alguns, o desespero de outros.
Crushed it #fyrefestival pic.twitter.com/H7jz41fw3E
— Allison Vatz (@avatz) April 28, 2017
Uh oh, looks like Ja Rule has gone into damage control mode: pic.twitter.com/bFMVm3TRlr
— official pixelated boat facebook account (@pixelatedboat) April 28, 2017
6.A destruição e os danos irreversíveis
Contas feitas: um festival que nunca aconteceu, um CEO preso durante seis anos, clientes que nunca receberam o que pagaram (à excepção de raros reembolsos), entre outros problemas que nunca encontraram solução. A mão de obra local que trabalhou a alto ritmo nunca foi paga, a entidade responsável pela instalação de todos os palcos e colunas nunca foi paga e MaryAnn Rolle nunca foi paga – a proprietária do Resort Exuma Point expressa no documentário um comovente discurso sobre todo o trabalho que efectuou (com promessas de pagamento) e que a deixou endividada até aos dias de hoje.