Milagre Metaleiro posiciona-se nos lugares cimeiros dos festivais de metal em Portugal
Pindelo dos Milagres recebeu mais uma edição do Milagre Metaleiro e a edição open air cresce a olhos vistos. Num ano onde a organização apostou forte no cartaz, os frutos foram recolhidos no final com três dias de casa cheia!
Pela primeira vez, o festival mudou-se para o Parque Industrial de Pindelo dos Milagres devido à forte adesão que era expectável para este ano e foi uma aposta vencedora. Apesar do aumento do espaço e do forte cartaz, os preços dos bilhetes e passes – quando comparados com outros festivais – eram acessíveis e o resultado foram as enchentes diárias. A organização previu uma média de 5/6 mil pessoas por dia, e foi isso que se verificou. Dentro do recinto, os preços das comidas, tal como o preço dos bilhetes, eram acessíveis e a comida era tradicional e de boa qualidade. O único senão do recinto foi o pó e as malditas raízes no chão que ainda nos fizeram tropeçar umas quantas vezes. Mas estes são pormenores que podem ser resolvidos na próxima edição do festival. No primeiro dia, a segurança atrasou-se na chegada ao festival, mas não houve incidentes nenhuns.
Falando de música, em todos os dias os horários foram escrupulosamente cumpridos e, no geral, tanto o som como o jogo de luzes estiveram em grande nível desde a primeira até à última banda.
★DIA 1★
No primeiro dia do festival, os Vøidwomb tiveram a sempre ingrata tarefa de abrir um festival e subiram ao palco na mesma altura que as portas do festival abriram oficialmente. Praticantes de black/death metal, a banda de Viana do Castelo esteve em bom plano.
No palco principal, subiram ao palco as suecas Frantic Amber, reduzidas a quarteto – faltava a terceira guitarrista – deixaram uma boa impressão com a sua entrega em palco e praticantes do death metal melódico.
De Alicante chegaram os Hadadanza que trouxeram a alegria circense a Pindelo dos Milagres. Trovadores da era moderna, o seu espetáculo folk/metal trouxe animação, alegria e com direito a circle pit a meio da actuação.
Um dos concertos que gerava mais curiosidade era o de Angus McSix. Depois da sua saída inglória dos Gloryhammer, Angus McFife renasceu como Angus McSix e apresentou temas do disco de estreia, “Angus McSix and the Sword of Power”. O concerto teve todos os clichés que há direito de uma banda de power metal, neste caso tivemos um dinossauro T-Rex insuflável durante o tema “Lazer-Shooting Dinosaur” e ainda um pégaso insuflável que levou um fã da frente de palco numa missão até ao bar mais próximo para trazer um copo de cerveja a Thaletris – guitarrista da banda – que, aparentemente, estava sedenta. A missão foi cumprida com sucesso! O outro guitarrista da banda – Seebulon aka “Seeb” Levermann – não teve vontade de aparecer em palco e foi substituído por um goblin! Obviamente, que Seeb estava em Pindelo, mas ia actuar com a sua outra banda, Orden Ogan, e precisava de descanso. Na bateria estava o musculado Skaw!, ex-Rhapsody of Fire e mostrou-se um autêntico relógio suíço, apesar de ser de nacionalidade alemã. Foi uma excelente estreia de Angus McSix em Portugal e muita vontade de ver a banda novamente no nosso país.
Diz o ditado que de Espanha nem bons ventos, nem bons casamentos, mas pelo menos vêm bandas com excelente qualidade, como foi o caso do Opera Magna. Praticantes de power metal sinfónico, onde se destacam o guitarrista Javier Nula com uma técnica exímia e o vocalista Jose Broseta que tem um alcance vocal impressionante. Uma banda obrigatória para os fãs de Rhapsody of Fire ou Symphony X, onde temas como “Por Un Corazon de Piedra” ou “El Corazon Delator” são obrigatórios!
No palco principal os Orden Ogan provaram o porquê de serem uma das melhores bandas de power metal da atualidade. Notou-se logo um profissionalismo assim que banda sobe ao palco e soam os primeiros acordes de “In The Dawn of the AI”, do mais recente disco de estúdio, um tema mais atual que nunca e que fala sobre a inteligência artificial. E foi de “Final Days”, o prato principal da atuação, de onde foram retirados quatro temas, onde se destaca também “Heart of the Android”. Antes de “Inferno”, houve tempo para uma interação entre Seeb, o baixista Steve e o público para ver quem conseguia cantar “burn”. Ainda houve tempo para “Gunman” e a fechar, “The Things We Believe In”.
Os nacionais Blame Zeus aproveitaram bem os 40 minutos e a hora para mostrar o seu talento. O rock musculado que navega um pouco entre Alice in Chains e A Perfect Circle, onde se destaca a voz de Sandra Oliveira, a banda aproveitou para tocar o seu mais recente tema, “Left For Dead” acabando a noite com “Lust” e “Burning Fields”.
De regresso a Portugal – depois de cancelada a tour de digressão prevista para o outono de 2022 – os Therion do maestro Christofer Johnsson, iniciaram as hostilidades ao som do clássico de Carl Orff, “O Fortuna”, logo seguido por “Blood of Kingu”. A banda apresentou reduzida a duas vozes – Thomas Vikstrom e Rosalia Sairem – devido à gravidez de risco da soprano, Chiara Malvestiti. Demorou algum tempo para nos ajustarmos a esta novidade e acho que os próprios Thomas e Rosa também demoram alguns minutos a adaptarem-se. A partir de “Tuonela”, Rosalia já se tinha libertado e a máquina que são os Therion parecia um rolo compressor. A trilogia de luxo que são “The Rise of Sodom and Gomorrah”, “To Mega Therion” e “Cults of the Shadow” levaram o público ao rubro. O alinhamento encerrou com o belíssimo “Sons of the Staves of Time”. Foi uma atuação imaculada e onde Christofer Johnsson lembrou a noite que a banda atuou no Hard Club numa digressão conjunta com os Moonspell já lá vão muitos anos e que foi uma noite que ficou na memória do músico devido à participação do público.
Surpreendente, o concerto que os Shutter Down deram no palco dois do Milagre Metaleiro. O hard rock dos viseenses encheu as medidas dos presentes, muito graças às boas canções que a banda apresentou e a excelente voz e presença do vocalista Sérgio Maia. Não faltaram os singles, “Sorrow” e “Save Me”, e a certeza de ser uma banda a seguir bem de perto.
Quem já não surpreende são os Moonspell. Em dia de aniversário de Fernando Ribeiro, a banda passeou por todos os momentos da sua carreira ainda em jeito de celebração dos 30 anos de carreira. A participação do público ajuda sempre a tornar a noite especial, principalmente em temas como “Opium”, logo a abrir e “Alma Mater”, mesmo antes do encore e claro, “Full Moon Madness” a fechar a noite onde o público encheu o recinto. O cansaço da viagem no dia de Lisboa até Pindelo dos Milagres, já não deu para ficar para ver a estreia dos Graveworm em Portugal.
★DIA 2★
O dia começa com os Resurge, banda de Tomar, que conseguiu reunir público na frente de palco ao longo da atuação e que levantaram bastante poeira com o seu death metal com vibes old school a fazer lembrar, em certos momentos, Obituary. Acabaram por dar algum trabalho aos seguranças logo cedo, o que é bom sinal.
Já os asturianos Arenia mostraram o seu power metal/hard rock com contornos épicos, muito influenciado pelos anos de 1980, e apesar das dificuldades iniciais do vocalista Fran Santos, a banda deu boas indicações e a curiosidade ficou para descobrir a discografia da banda. Também de Espanha, mas de Vigo, os Xhamain deram a conhecer a Pindelo dos Milagres o seu som que mistura power metal com influências folk onde o som da gaita galega ia criando uma melodia quase constante ao longo das músicas, e onde a presença forte e captivante da vocalista Mariah Fosado são pontos fortes da banda.
Já com muito público pela frente e diretamente da Catalunha, os Ravenblood impressionaram com o seu death metal melódico, com o guitarrista Arnau Gispert a brilhar nos solos de guitarra.
Os Toxikull começam a ser um caso de sério na cena nacional com todo o seu talento para o heavy metal de raízes tradicionais. A banda de Lex Thunder fez aquilo que faz bem: dar grande espetáculo. Temas como “Nascida no Cemitério”, “Killer Night” ou “Metal Defender” a fechar o alinhamento, provaram que a banda de Cascais é o futuro do metal nacional.
Em estreia absoluta em Portugal, os suecos Eclipse são uma máquina de fazer grandes canções. Não será exagero dizer que Erik Mårtensson é o génio na composição de melodias. Desde “Roses In Your Grave” logo a abrir, passando pelo recente “The Hardest Part Is Losing You”, “Runaways”, “Hurt” e terminando com “Viva la Victoria”, foi um destilar de hard rock do melhor que é feito nos dias de hoje, e onde o som e as luzes estiveram ao nível do que foi apresentado em palco. Não faltou também “The Downfall of Eden”, um dos temas preferidos de Erik. Esperemos por um regresso rápido dos Eclipse a Portugal.
Os belgas Aktarum trouxeram temas do seu mais recente disco, “Trollvengers”, a Portugal. Muita energia da banda que pratica um folk/black metal e que conseguiram criar uma wall of death com o público que assistia.
Os Dark Tranquillity dispensam apresentações. Os suecos regressaram a Portugal passados cinco anos e na bagagem traziam o muito aplaudido, “Moment”. Mas foi ao som de “Encircled” dos disco “Atoma” que se iniciou a atuação da banda de Gotemburgo. A banda percorreu boa parte da sua carreira, indo ao baú do disco, “Projector” de 1999 sacar o tema, “ThereIn”. A finalizar a noite ficaram os temas “Final Resistance” e “Misery’s Crown”, mostrando que a banda é uma máquina bem oleada e bastante profissional.
Seguiu-se o black metal old school dos Bliss of Flesh, que apresentaram quase na íntegra o seu mais recente disco, “Tyrant”. Só o último tema, “Pariah”, foi retirado do disco de 2013, “Beati Pauperes Spiritu”.
No palco principal, o regresso dos finlandeses Stratovarius. Banda muito acarinhada pelos fãs portugueses, e apesar de terem tocado alguns temas mais recentes, não faltaram clássicos como “Father Time”, “Speed of Light”, a belíssima balada “Forever” ou ainda “Black Diamond” e “Hunting High and Low” a fechar o set. O som não foi perfeito, mas ouvir estes temas sabe sempre muito bem.
Os nacionais Sacred Sin fecharam a noite dois do Milagre Metaleiro, mas, na minha opinião, merecem um horário melhor do que subirem ao palco quase às duas da manhã.
★DIA 3★
O último dia de festival pareceu ser um dia mais lento na afluência de público ao festival, só mesmo quando os Cradle of Filth subiram ao palco é que ficou mais compacto. O dia iniciou-se com a banda de black metal de Barcelona, Erzsébet. E é a vocalista Erzsébet o grande foco da banda, com a sua teatralidade e presença hipnotizante.
Os Enchantya abriram o dia no palco principal, e a banda de Rute Fevereiro trouxe também para o palco de Pindelo dos Milagres o seu lado teatral, com alguns convidados como foi o caso de um violinista. Foi uma atuação curta, mas bastante positiva dos Enchantya.
De regresso a Portugal, os Dark Embrace trouxeram o seu “Dark Heavy Metal”. O vocalista Oscar Rilo teve algumas dificuldades vocais ao início, mas nada que comprometesse a restante atuação da banda, que teve na linha da frente uma legião conhecedora do seu trabalho.
Power metal puro e duro foi o que trouxeram os Serious Black. Com um alinhamento a percorrer três dos seis discos da banda, acabaram por ser as versões de Neil Young do tema, “Keep On Rocking In A Free World” e de “The Story” de Brandi Carlile que se destacaram, e, claro, a voz de Nikola Mijić!
Já os Franceses Boisson Divine pareceram um pouco deslocados no cartaz neste dia, mas acabaram por deixar uma excelente imagem com o seu folk metal.
No palco principal as coisas aqueceram e que maneira com os lendários Grave Digger. A banda de Chris Boltendahl não deu tréguas desde o início com “Lawbreaker”. Seguiu-se “Hell is my Purgatory” e “Ballad of a Hangman”, com o guitarrista Axel Ritt a ir brilhando ao longo dos temas. Na banda, ainda está o lendário baixista Jens Becker, que se mostrou sempre bastante coeso. Não faltaram temas como “Highland Farewell”, “Excalibur” e “Rebellion (The Clans Are Marching)”. Os Grave Digger fecharam a noite em alta com “Heavy Metal Breakdown”.
Os Lujuria do vocalista Óscar Sancho deram um concerto de encher as medidas. Praticantes de heavy metal tradicional, Óscar é mesmo o centro das atenções, sem papas na língua e com um lado louco. Logo no início da noite, resolveu subir para a estrutura lateral do palco e simular um ato sexual com a trave de ferro. Entrega total em palco da banda, que deixou boa impressão em Pindelo dos Milagres.
A grande atração deste último dia foram os Cradle of Filth e uma hora em palco foi quanto bastou para a banda de Danil Filth deixar o público rendido. Claro que há quem preferisse que a banda tocasse mais tempo, mas os 60 minutos foram mais do que suficientes para saciar a falta de visitas dos Cradle a Portugal. Dani Filth voltou a referir o primeiro concerto que a banda deu em Penafiel logo no início da carreira, sendo Portugal um dos primeiros países a receber de braços abertos a banda britânica, algo que Dani não esquece. “Heaven Torn Asunder” foi o tema que abriu o concerto da banda e depois foi um desfilar de êxitos. “Gilded Cunt” e “Cruelty Brought Thee Orchids” levaram o público ao rubro. A acompanhar Dani Filth estavam os guitarristas Ashok e Donny Burbage, Daniel Firth no baixo, Marthus na bateria e a bela Zoe Maria Federoff nas teclas e voz. Seguiu-se “She’s a Fire”, um dos temas originais incluído no mais recente disco ao vivo dos Cradle of Filth, depois a viagem ao primeiro trabalho da banda com o tema que dá nome ao disco, “The Principle of Evil Made Flesh”. Já com o público completamente rendido, a banda seguiu com “Nymphetamine (Fix)” e o excelente “Crawling King Chaos” do último disco de estúdio, “Existence is Futile”. Nova viagem ao passado com “Born in A Burial Gown” do EP “Bitter Suites to Succubi” de 2001 e “Her Ghost In The Fog” de “Midian” de 2000. A terminar, “From The Cradle To Enslave”. Foi uma atuação imaculada dos Cradle of Filth e fica a esperança de os ver, em nome próprio, numa sala mais intíma.
Ainda houve para os festivaleiros os concertos de Hate Legions e Gigatron, mas já não havia pernas para ficar mais tempo.
Agora que o festival superou todas as expetativas, fica a pressão para fazer mais e melhor em 2024 em Pindelo dos Milagres, uma localidade que começa a ser a meca do heavy metal em Portugal.