Falling In Reverse, A Consagração de um Monstro Popular
2024-11-07, Campo Pequeno, LisboaLiderados pelo controverso Ronnie Radke, os Falling In Reverse estrearam-se finalmente em Portugal perante um Campo Pequeno em apoteose.
Entre clássicos que marcaram uma geração, temas mais recentes que introduziram novos fãs à banda e uma visita inesperada aos Escape The Fate, primeiro projeto de Radke, os Falling In Reverse brindaram-nos com um concerto arrebatador e demonstraram que já dominam a arte dos concertos de arena.
Ronnie Radke é muitas vezes apresentado como um artista polémico. Por um lado, é desprezado por muitos devido ao seu ego e ao controverso histórico criminal que o levou a cumprir uma pena de prisão de dois anos e meio, e que resultou na sua expulsão da banda Escape The Fate. Por outro, é um artista respeitado e idolatrado por toda uma geração que durante vários anos viu em Radke um dos grandes representantes da subcultura juvenil scene, uma ramificação da cultura emo. Esta subcultura, que floresceu na segunda metade dos anos 2000 e que se manteve fortemente ativa até aos primeiros anos de 2010s, teve em Radke uma das suas figuras mais influentes, tendo este contribuído para a disseminação global do fenómeno scene não só através da sua música, primeiro com os Escape The Fate e depois com os Falling In Reverse, mas também em termos visuais, com Radke a apresentar uma estética extravagante que combinava o uso de roupas coloridas, um penteado com cabelo comprido e espetado, uso de maquilhagem e ainda o corpo extensivamente tatuado.
Porém, tudo isto deu-se num contexto semi-underground e para compreendermos melhor o crescimento exponencial que os Falling In Reverse tiveram nos últimos anos é necessário recuarmos até 2019, ano em que editaram o single “Popular Monster”, cuja sonoridade resulta numa fusão perfeita entre o rap e o metalcore mais comercial e radiofónico. Já com vários temas editados que faziam a ponte entre os dois géneros, como é o caso da sua versão de “Gangsta Paradise” de Coolio e L.V., “Losing My Mind”, “Losing My Life” e “Drugs”, “Popular Monster” apresentou-se como o aperfeiçoar de uma fórmula que hoje em dia é indissociável do processo de composição de Ronnie Radke, como podemos comprovar pelos mais recentes singles “Voices In My Head” e “Watch The World Burn”.
Aliando métrica a refrães épicos, Radke conseguiu atrair toda uma nova falange de fãs que o catapultou para o estrelato e para um mediatismo nunca antes alcançado, particularmente na Europa, onde tinha atuado pela última vez em 2018 e em salas com capacidade para 1000-1500 espetadores. Desta forma, não é de estranhar que os Falling In Reverse estejam agora a estrear-se em muitos países como é o caso de Portugal, Espanha, Itália e, pasmem-se, o Reino Unido onde Radke esteve impedido de entrar durante anos devido a questões judiciais.
Sleep Theory
Provenientes da nova escola que funde o metal alternativo com o metalcore melódico, os Sleep Theory subiram ao palco do Campo Pequeno para apresentar os temas do seu único trabalho discográfico, o EP “Paper Hearts” (2023). Durante cerca de 35 minutos mostraram-se empenhados em atrair novos fãs com composições focadas na articulação entre os diferentes registos dos vocalistas Cullen Moore e Paolo Vergara, este último também divide funções como baixista, e de Daniel Pruitt, guitarrista, e o responsável pelos vocais berrados. “Fallout”, “Numb” e as novidades “Stuck In My Head” e “Paralyzed”, receberam a aprovação do público e deixaram curiosidade para o álbum de estreia que se avizinha.
Hollywood Undead
Foi ao som de Ennio Morricone, mais precisamente do tema principal de “O Bom, O Mau e o Vilão”, que os Hollywood Undead fizeram a sua entrada em palco. Banda de culto no universo do rap rock, os Hollywood Undead atraíram para o Campo Pequeno uma legião de fãs que já aguardava há muito a sua estreia em Portugal. Além dos vários clássicos de uma carreira que conta com quase duas décadas, a banda de Los Angeles trouxe ainda na bagagem o seu mais recente álbum “Hotel Kalifornia” (2022). Num jogo de cadeiras entre vocalistas, a banda apresentou-se na fronteira entre uma boy band e um grupo de hip hop dos subúrbios de LA, preenchendo um palco que por vezes pareceu pequeno para tamanha interação entre membros e público.
A novidade “California Dreaming”, e os êxitos “Everywhere I Go” e “Comin’n In Hot”, esta última com um fã, de seu nome Marco Vieira, a partilhar funções de vocalista, foram alguns dos temas que se destacaram numa setlist que também contou com momentos caricatos. Um deles surgiu numa brincadeira com o tema “Stand Up and Shout” do filme “Rockstar”, num momento que levou a banda a apontar um suporte de microfone gigante para o público para que este pudesse dar a sua melhor interpretação de Mark Wahlberg. Já a cover de “Sweet Caroline” foi também recebida de surpresa e com algum humor à mistura numa interpretação que aproximou Neil Diamond do universo do rap.
Falling In Reverse
Bem ao estilo da personalidade jocosa de Ronnie Radke, o espetáculo começou ainda com os Falling In Reverse nos camarins. Com “Highway To Hell” dos AC/DC a tocar no PA, a banda levou-nos numa transmissão em direto do seu percurso entre os camarins e o palco. Com alguma descontração foram parando em vários pontos do percurso para que Ronnie pudesse fazer uma das suas gracinhas, enquanto do outro lado da cortina mais de 4000 fãs entoavam fervorosamente o seu nome.
Entre a chegada ao palco e as primeira notas de “Prequel”, faixa que também abre o álbum “Popular Monster”, foi um instante. Ainda sem a banda a suportar o instrumental, foi possível ter logo uma audição nítida da qualidade vocal e do flow que Ronnie consegue imprimir nos concertos. É verdade que na maioria das músicas que foram tocadas existiu um grande auxilio nas vozes por parte do baixista Tyler Burgess e do guitarrista Christian Thompson, mas isso em nada interferiu com a prestação do músico.
Nesta que é a sua primeira tour europeia de arenas, a banda também procurou apostar fortemente na componente visual do concerto, ao recorrer a uma produção assente maioritariamente na projeção dos videoclipes gravados e em pirotecnia com labaredas a serem disparadas em todas as direções.
“Zombified”, tema que se seguiu, combinou essas duas vertentes na perfeição enquanto do lado público veio um coro de vozes avassalador que levou Ronnie a regular o níveis dos seus in-ears. «Vocês cantam muito alto! Não me consigo ouvir», disse o vocalista mais à frente, mas com um sorriso de satisfação.
A primeira visita a um passado mais longínquo veio com “I’m Not a Vampire”, do primeiro álbum “The Drug In Me Is You” (2011). Já com uma moldura sonora bem robusta, este foi o primeiro momento em que percepcionámos algumas deficiências sonoras na região mais aguda das guitarras, particularmente nas secções da intro e do solo, que não conseguiram furar a mistura com a nitidez ideal. “Fuck You and All Your Friends”, única passagem por “Coming Home” (2017), “Bad Guy” e “Losing My Mind” mantiveram o pé no acelerador com um Ronnie Radke endiabrado sempre de um lado para o outro na plataforma situada na dianteira do palco. Longe de ser um dos melhores frontmen da cena, Ronnie pode não ter a melhor presença de palco, mas o seu carisma é suficiente para ter o público sempre na palma da mão.
Radke é sem dúvida a cara da banda, apresenta-se sozinho numa plataforma, acima dos restantes elementos. Aliás, além de ser o fundador é o único membro original que permanece no grupo desde o início. Desta forma, não é de estranhar que o nome que se ouve sempre a ser entoado por parte do público seja o do vocalista e não o da banda. Todavia, isso não impede-nos de destacar todo a qualidade dos outros músicos que compõem os Falling In Reverse. Além de Tyler Burgess, que não largou o seu Spector e de Christian Thompson, que recorreu a sua Mayones, a banda ainda é composta por Mark Ocubo, guitarrista dos Veil of Maya, contratado como músico de tour, que recorreu à sua Kiesel Headless Custom, e Luke Holland, um dos melhores bateristas da cena metalcore e que contribui para bandas como The World Alive e I See Stars (banda que passou recentemente pelo Capitólio, em Lisboa).
Continuando a recuar no tempo, eis que surgiu a grande surpresa da noite com “Situations”, tema que lançou Ronnie Radke na cena musical quando ainda ocupava o lugar de vocalista na banda Escape The Fate.
«Estavam à nossa espera há muito tempo, certo?», perguntou Radke. «Então esta é definitivamente para vocês». A dedicatória veio então na forma da nostálgica “The Drug In Me Is You” que foi entoada por todos a plenos pulmões. Continuando a recuar no tempo, eis que surgiu a grande surpresa da noite com “Situations”, tema que lançou Ronnie Radke na cena musical quando ainda ocupava o lugar de vocalista na banda Escape The Fate. A euforia instalou-se na sala, principalmente entre os “elder emos” que cresceram a ouvir o álbum “Dying Is Your Latest Fashion” (2006). Como se isso não bastasse, no final da música ainda houve uma fã que mandou para o palco uma bandeira portuguesa que Ronnie fez questão de exibir em jeito de agradecimento para com a entrega do público.
Sem muito tempo a perder surgiu logo de seguida “Just Like You”. Em mais uma demonstração de que Radke não se leva muito a sério… fomos brindados com a “asshole cam” (câmara dos idiotas) a apontar não só para Ronnie, mas também para o público, numa referência ao refrão da música.
Já em jeito de encore, a banda saiu do palco, mas, após alguns apupos carinhosos dos fãs, foram recebidos nos camarins por um cowboy em tronco nu e tatuado que lhes apontou uma arma e os levou de volta para o palco. Já todos sabiam que vinha aí a coboiada “All My Life”, tema gravado em conjunto com o rapper/ cantor de country Jelly Roll e que resultou em mais uma inteligente fusão sonora criada pelos Falling In Reverse, desta vez a partir da junção do metal com o country.
“Popular Monster”, “Voices in My Head” e “Ronald” ficaram guardadas para o fim com Ronnie a mostrar todos os seus atributos no rap ao debitar barras a uma velocidade frenética e com guturais capazes de abalar com os alicerces do Campo Pequeno, particularmente no triplo breakdown de “Watch The World Burn”, música que encerrou o espetáculo. Com o cronómetro a marcar 1h15m de concerto, foram muitos os fãs que clamaram por mais músicas, mas este era mesmo o momento das despedidas e de uma última foto com o público e com a bandeira portuguesa em mãos. “We Are The Champions” dos Queen acompanhou a saída da banda do palco, deixando os fãs a processar a efemeridade de um concerto pelo qual tinham esperado durante anos e que num ápice se desvaneceu.
SETLIST
- Prequel
- Zombified
- I’m Not a Vampire
- Fuck You and All Your Friends
- Bad Guy
- Losing My Mind
- The Drug in Me Is You
- Situations (Escape The Fate Cover)
- Just Like You
- All My Life
- Popular Monster
- Voices in My Head
- Ronald
- Watch the World Burn