Há laivos de estéticas pop em “No One Deserves Happiness”. Ou pelo menos daquelas correntes de pop experimental de Björk. Há aqui a mesma violência dos álbuns anteriores e a mesma impressão de desespero e demência, de cujas traduções musicais Chip King e Lee Buford são mestres, mas a excentricidade de arranjos nos temas obedece mais a um formato convencional de canção. Aliás, no anúncio do álbum isso foi assumido pela banda, que se preparava para criar «o álbum pop mais nojento de sempre».
A brutalidade do álbum é atenuada pelas vozes femininas de Chrissy Wolpert e Maralie Armstrong, que surgem como seda delicada a forrar um caixão imundo
Ainda assim, o recurso a sintetização ao melhor jeito da electrónica dos anos 80, usado como um dos grandes vértices do álbum, não deixa de ser surpreendente. E surpreende também pela forma como revitaliza os paradigmas sonoros da banda. Ferramentas incomuns na banda, que a dupla foi capaz de inserir sem beliscar a sua autenticidade. Violoncelo, trombone ou beats processados de uma clássica Roland TR-808, passam pelas músicas com o mesmo peso e demência do sinal de guitarra uber sujo tradicional de Chip King. A brutalidade do álbum é atenuada pelas vozes femininas. Chrissy Wolpert e Maralie Armstrong surgem como seda delicada a forrar um caixão imundo. As intrincadas e suaves vocalizações tornam o disco atraente e até “orelhudo”. A banda assume estes momentos sem qualquer snobismo, confessando até que um tema como “Two Snakes” é inspirado numa canção de Beyoncé!
“No One Deserves Happinness” é um álbum repleto de camadas instrumentais e processamento sonoro, por contraste com o crude de guitarra e bateria de álbuns anteriores, com dinâmicas de contrastes intensos, misturando fontes sonoras acústicas, analógicas e electrónicas, com várias intensidades de peso e distorção, tudo congregado numa grande mistura assinada pelos engenheiros Seth Manchester e Keith Souza, nos estúdios Machines With Magnets.