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SBSR 2023: O último dia pertenceu a L’imperatrice e Parov Stellar, com Kaytranada pelo meio

SBSR 2023: O último dia pertenceu a L’imperatrice e Parov Stellar, com Kaytranada pelo meio

Maria Brito
World Of Academy

Steve Lacy era outro dos nomes mais esperados do Super Bock Super Rock, mas o seu concerto não impressionou. Não aqueceu nem arrefeceu…

Foi neste último dia que mais pó se levantou na Herdade do Cabeço da Flauta, e não só pelo desgaste do tempo e das terras, mas porque foi um dia quase todo dedicado à pista de dança. Com uma afluência que pareceu maior e um público mais específico do que o de outros dias, claramente atraídos por Kaytranada, Steve Lacy, L’Imperatrice e outros nomes que compunham um cartaz mais jovial (como Pinkpantheress ou Chico da Tina), este foi o dia de deixar todos os demónios no Meco.

Depois de nomes como Surma, Ezra Collective ou Kaleo terem estreado a noite, o recinto cresceu de público para Kaytranada.

Apesar de ter tocado relativamente “cedo”, o set do DJ e produtor assemelhou-se a um after, onde usou toda a sua energia e sabedoria para colocar uma multidão a dançar. Se para uns faltou algo mais do que um set dançável, para outros, o trabalho de Kaytranada era aquele mesmo, sem tirar nem pôr, que, no fundo foi o que ele fez para uma multidão que se mostrou satisfeita.

Houve tempo para quase tudo. Kaytranada, que esteve no Meco em 2019 e que tinha estado recentemente em Portugal, há pouco mais de um mês, revisitou o seu álbum mais aclamado, 99.9%, lançado em 2016, e do alto dos seus quase 3 metros de cenário e toda uma preparação visual que incluía mais do que um Louis Kevin Celestin a divertir-se, passou ainda hits de “BUBBA” (2019), e do seu mais recente projeto de parceria com o rapper Aminé, “KAYTRAMINÉ” (2023).

Claramente surpreendida e movida pela comoção do público, e com um repertório algo curto, facto que a própria destacou a meio do concerto, Pinkpantheress, a britânica de apenas 22 anos de idade que canta, compõe e produz, não desiludiu os fãs que a procuraram para um concerto alegre, leve, e sem preconceitos de género musical.

O seu estilo é vasto e criativo: tem temas de curta duração com samples dos anos 90 e navega pela pop, dance, drum and bass. Abriu com “Break it Off”, que assim como outros temas seus, fez sucesso na rede social Tik Tok, o que ajudou, e muito, o lançamento da artista no Reino Unido, mas não só. A jovem talento foi nomeada para os Brit Awards e fez colaborações com nomes como Skrillex, Central Cee ou Halsey. Em 2022 lançou uma versão com remixes do seu primeiro álbum, “The Hell With It”, lançado um ano antes.

Ninguém diz que Steve Lacy não teve toda a atenção do público, que não tem talento que sobra ou capacidade suficiente para compor música ou dar um bom concerto. O apelidado “génio” precoce da cena musical que junta funk, R&B, jazz e indie rock, que colaborou com nomes relevantes como Kendrick Lamar, Tyler, the Creator ou Frank Ocean, e fundou a sua banda The Internet em 2011, deu um concerto que parece ter agradado à maioria dos seus fãs, ainda que prejudicado pelas claras dificuldades técnicas do som durante praticamente todo o concerto.

Relembrando mais do que uma vez que era o aniversário do Grammy que ganhou pelo álbum “Gemini Rights”, Best Progressive R&B Album, do qual faz parte uma canção que ouvimos já perto do final, “Bad Habit”, e que também foi um sucesso viral no Tik Tok, Steve Lacy parecia feliz e contente pelo reconhecimento. Além de temas como “Helmet”, “Mercury” ou “Sunshine”, o primeiro álbum do artista, Apolo XXI (2019) também foi recordado, passando levemente pelo álbum de demos e instrumentais que o artista juntou em 2020, The Lo-Fis.

Mas se por um lado tem a capacidade de mover multidões (pelo menos a sua própria), e não tendo culpa dos fenómenos da internet a que todos os artistas estão sujeitos nos dias que correm, vendo as suas músicas serem cantadas de pulmão aberto por todos, quase que arriscamos dizer que Steve Lacy precisava de aliar algo mais à sua performance, técnica e conhecimento inquestionáveis. Mas o quê? Quem sabe. A verdade é que a sua interpretação e as suas criações levam-nos, muitas vezes, e como naquela noite, a um estado de que nada aqueceu, mas também nada arrefeceu.

 

L’Imperatrice foram a simbiose perfeita entre a máquina e o humano

Os corações, simbólicos e literais (umas formas de luz que traziam ao peito em formato de coração) da banda parisiense apareceram pela segunda vez em Portugal após a sua estreia no verão passado.

Visivelmente emocionados pelo recordar desta última aparição (naquele lugar inesquecível e mágico que é Paredes de Coura, o que tornava a missão de superar esta experiência ainda mais dura), L’Imperatrice voltaram a sentir o amor que recebiam do público que os escutava, dançava, saltava e gritava, devolvendo toda a energia de volta, do início ao fim do concerto.

Afortunados com uma qualidade de som exímia, ali ouvimos de tudo um pouco. Banda com apenas dois álbuns, mas vários singles e EPs lançados desde 2012, ouvimos hits de “Matahari” (2018), o seu álbum de estreia, a mais que conhecida “Agitations Tropicales” do EP “Odyssé” (2015), e hits de “Tako Tusbo”, lançado em 2021.

O sexteto composto por Charles de Boisseguin, Hagni Gwon, David Gaugué, Achille Trocellier, Tom Daveau e Flore Benguigui tem uma entrega sem erros do início ao fim, e uma simbiose perfeita entre todos os géneros musicais que exploram. Disco, soul, jazz, pop, electrónica, uma voz doce e uma energia contagiante ganharam a noite. Foram a consistência que faltou a Kaytranada, e a energia que faltou a Steve Lacy, um forte candidato a melhor concerto deste festival.

 

Parov Stelar tiveram a grande missão de fechar o palco principal, no que foi, provavelmente, o melhor concerto da noite naquele palco. Uma continuação perfeita da festa que estávamos a viver minutos antes, com uma banda composta por músicos proficientes, feitos de voz, baixo e sopros e bateria a acompanhar o DJ, que entregou a sua já conhecida mistura de beats eletrónicos com jazz, criando o electro swing. Vivemos uma roda-viva que durou até a nossa energia (que pensávamos ter ficado esgotada no fim de L’ Imperatrice) não poder mais, que é como quem diz, até ao final do concerto. Uma surpresa para todos os incrédulos que encerraram o dia numa farra coletiva.