PAUS, Forward & Rewind
Desde o primeiro disco, em 2011, que, como cantam no single “Yess”, os PAUS são aquilo que lhes apetece. Um modo de estar que se percebe, lendo e ouvindo os seus cinco álbuns de estúdio de uma das mais excitantes bandas portuguesas.
Dia 5 de Junho, foi a vez dos Paus, nas sessões Gigs em Casa (na sala Lisboa Ao Vivo), visitarem os seus 5 trabalhos de originais com foco especial no mais recente “YESS”. Todos os concertos estão disponíveis no site do Gigs em Casa, em www.gigsemcasa.com. Motivo para fazermos também uma retrospectiva à permanente mutação sónica da banda que reúne Joaquim Albergaria e Hélio Morais nas baterias e vozes, Fábio Jevelim nas sintetizações e Makoto Yagyu no baixo.
Na altura entre o álbum homónimo de estreia e o segundo álbum, Joaquim Albergaria disse-nos, em entrevista que «o processo nos Paus é sempre igual. E foi uma espécie de ilha de salvação que achámos para nós porque, acima de tudo, somos músicos preguiçosos. Preguiçosos no sentido de ensaiar e escrever na sala e repetir, toda a gente a tocar uns por cima dos outros e ninguém a perceber nada, depois chegas ao estúdio e reparas que não era nada disso que tinha percebido. Isso é extremamente extenuante. E nós tivemos a sorte e a benção de a primeira vez que entrámos em estúdio foi, sem nada feito, ligar as coisas, “micá-las”, começar a tocar e percebemos que esse processo resultava connosco. Usando exactamente os mesmo dias que íamos usar para gravar uma coisa que tínhamos pré-escrito e pré-ensaiado».
Nesse sentido, o processo é muito imediato e reactivo às ideias que vão surgindo. Dizia o mesmo interlocutor: «É um bocado escrita auto-consciente. As coisas vão saindo conforme entra um ritmo, entra uma linha de baixo, entra um som de teclado. O processo é quase cadáver-esquisito. Daí não haver uma consciência do que vai ser o todo, vamos fazer uma música, depois outra, e por aí fora. Algures lá no meio pensamos que é fixe dar uma guinada e fazermos uma mais calma, mas quando queremos ser mais conscientes do que é que épreciso, acaba no inverso ou sai uma coisa qualquer horrível que acabamos por não utilizar».
Desde o primeiro disco, em 2011, que, como cantam no single “Yess”, os PAUS são aquilo que lhes apetece. Um modo de estar que se percebe, lendo e ouvindo a discografia (despida dos EPs) de trás para a frente ou da frente para trás, ou como vos der na gana…
10 anos, 4 discos, 3 EPs e múltiplas digressões por vários continentes, deixam o quarteto de Lisboa num sítio positivamente novo, num momento no qual, para cada novo desafio e oportunidade, a resposta parece ter evoluído para “YESS”. Depois de uma visita inspiradora a São Paulo e várias experiências de colaboração e mistura, “YESS” é positivamente um disco de PAUS, a banda que muda por natureza e que ao fim de uma décadaa continua sem medo de arriscar, de se desconstruir e de mudar. O disco conta com a colaboração nos arranjos para sintetizadores modulares do brasileiro Grass Mass. Este trabalho de texturas electrónicas ajudou a expandir o imaginário do que pode ser um disco de PAUS – das pistas de dança de Lisboa aos escuros clubes de punk rock, das rodas de batuque das ruas de São Paulo às raves de Berlim.
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Essa constante reconstrução é evidente há muito. Lia-se numa das várias notas de apresentação de “Madeira” que «os PAUS continuam a ser Hélio Morais, Makoto Yagyu, Fábio Jevelim e Quim Albergaria. Um baixo, teclados e uma bateria siamesa ainda são as ferramentas do seu ofício». A convite de Pedro Azevedo e da família ALESTE, os PAUS partiram em Setembro de 2017 para filmar e fotografar todo o aspecto visual de um disco que tinham começado a preparar em Julho desse ano. A ideia de uma ilha que flutua e não tem sítio certo na geografia, uma ilha esquecida por um continente e de tão feliz por estar esquecida que se encontra na intercepção das Américas, África e Europa, pareceu-lhes naturalmente um retrato preciso do som que estavam a ouvir. Um mapa com fronteiras apagadas, uma ilha que se deixa levar e gosta de quem quer e está sempre à espera do barco é a forma como os PAUS olham para a Madeira e para si próprios, enquanto plataforma criativa. «“Madeira” é o som da banda a apaixonar-se pela ilha e os seus ilhéus, são 9 canções e vídeos onde vemos e ouvimos os PAUS sempre em viagem e sempre em casa». Se precisam de saber, é o nosso álbum favorito na discografia.
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Passavam, sensivelmente, 6 anos desde o lançamento do EP “É Uma Água” e que os Paus emergiram como uma das mais refrescantes propostas do panorama musical do país. Desde aí, de todas as invejáveis qualidades agregadas pela banda, com o decorrer de sucessivos lançamentos de valor, é difícil identificar a contenção ou a delicadeza entre elas. Todavia, é esse o caminho que seguem no seu terceiro longa-duração. Em “Mitra” há mais exploração vocal e nas baterias siamesas, mas uma redução da pujança que deu corpo à obliquidade de “Clarão” (2014) e ao primitivismo de “Paus” (2011). “Mo People”, “Mancha Negra” e “Fumo” são resquícios da banda que nos trouxe bigornas como “Nó” e “Negro” no trabalho anterior. “Olhos de Asma” lembra “Língua Franca”. Não é como se as inovações fossem total e imediatamente descartáveis, até porque os Paus conseguem fazer transparecer aspectos da sua intrínseca estranheza nas suas músicas; simplesmente se lamenta que essa sua característica colida com a reformulação estética, removendo algum poder e frontalidade ao álbum. Tal como o mitra não é nem da cidade nem do subúrbio, subsistindo em ambos, os Paus deambulam esteticamente neste disco.
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Em “Clarão”, a electrónica mantém-se misturada com uma boa dose de rock, ainda há ligação com ritmos “quentes”, e continua a configuração rítmica de bateria siamesa, mas há uma ruptura com o passado cristalino de algumas músicas do álbum homónimo de Paus. Menos etéreo e mais concreto em cada música, mas mais disperso como disco, “Clarão” traz uma abordagem mais in your face, que pode demorar a entrar naqueles com bolhas de gosto com regimes mais rígidos. O facto de os temas serem mais abrasivos é algo que funciona melhor ao vivo. Perguntamo-nos se falta um certo sentido de equilíbrio em disco? Talvez a questão se afigurasse mais fácil de resolver com mais temas com a limpidez e ritmo dançável do single “Bandeira Branca” (o tema mais icónico da banda) ou, pelo inverso, assumir-se mais o peso de “Primeira” e “Negro” como um norte a seguir. Não obstante o facto de ser um álbum menos imediato de que o álbum anterior, “Clarão” está aí às claras: um disco assumidamente mais complexo, que passava a exigir mais atenção ao ouvinte.
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O disco homónimo é o mais português, nas batidas, na ginga Paião e Variações. Para o pessoal que gosta mais de coisas brutas, é o álbum mais porcalhão e, genericamente, mais pesado. É um manifesto dessa intenção de fazer o que bem lhes apetece, exposto no cruzamento electrónico e na propulsividade das baterias, na fusão entre rockalhada neo-milenar e balanço para danceteria, tudo uniformizado, por aquilo que talvez seja o elemento mais estanque na sonoridade da banda, o monstruoso som do Ibanez Jazz Bass de Makoto, um infame lawsuit dos anos 70 (de 72, sendo preciso), capaz de realmente «soar maior que a tua mãe», como se lia num dos primeiros textos que apresentava a banda nessa época.