Fender Abandona Ash e Explica a Decisão Histórica
A Fender anunciou que vai deixar de usar madeira ash na construção das suas guitarras. O Vice Presidente Justin Norvell explica os motivos e apresenta algumas alternativas.
A Fender anunciou que no futuro deixará de ter instrumentos construídos com ash (freixo). As causas não se prendem necessariamente com a lei CITES, à luz da qual a marca tem vindo a abandonar o rosewood. Em comunicado, a marca refere: «De modo a manter o nosso legado de consistência e elevada qualidade, decidimos, na Fender, remover o Ash da grande maioria dos nossos modelos de produção regular. A madeira desta estirpe que nos foi possível armazenar até aqui continuará a estar disponível em modelos seleccionados e modelos de inspiração histórica vintage, enquanto as reservas durarem».
Em entrevista com a Guitar World, Justin Norvell, Executive Vice President of Fender Product, afirma que a decisão foi tomada após muita ponderação, até porque a marca tem uma longa tradição com esta madeira. «Ninguém tomou esta decisão de ânimo leve. O freixo faz parte do ADN daquilo que fazemos na Fender. Desde logo, numa retrospectiva história, os luthiers fora da Fender sempre usaram materiais como os spruces, além de madeiras tropicais exóticas. Porque o Leo era muito pragmático, costumava dizer, ‘Se tiver 100 dólares para fazer algo, gasto 99 para que fique funcional e 1 para que fique bonito’. Ele recorreu a materiais que estavam disponíveis em enormes quantidades. Visitou depósitos de madeira e o alder, ash e maple eram fáceis de obter».
Norvell prossegue, com uma consideração curiosa: «O nosso perito em madeiras contou-me que o ash nem sequer tinha mercado, por assim dizer, até à chegada dos bastões de baseball e das guitarras eléctricas, devido à Fender. Até aí desflorestavam todo o freixo para poder plantar outras espécies. Portanto, o freixo remete-nos para as próprias origens da Fender – para as Esquires, Broadcasters, ‘54 Strats e por aí fora».
Dada a importância desta madeira na história da Fender, qual o motivo afinal para tal decisão? Norvell explica que a decisão foi tomada face à destruição de árvores freixo causada pelo besouro Emerald Ash Boorer, numa praga que desceu desde o Canadá. Ainda que a Fender use o freixo mais leve e poroso que cresce no sul dos Estados Unidos (o swamp ash), a propagação do infame besouro tem sido rapidíssima. «Tem avançado em cada floresta e o freixo irá desaparecer em poucos anos. Tal como os castanheiros norte-americanos foram destruídos nos anos 30 e acabaram extintos. Não se trata de algo que desapareça algumas estações e eventualmente germine de novo», refere Norvell.
Há ainda outro problema. O swamp ash é recolhido de árvores expostas a águas de cheias, quando estas recuam. Mas as alterações climatéricas estão a interferir com a sua colheita. A Fender apenas utiliza a zona mais próxima das raízes, que retém mais água e, segundo Norvell, «as águas das cheias não têm recuado e estas zonas ficam submersas dois terços do ano, tendo chegado a um ponto em que temos que aguardar entre seis a oito meses por uma madeira em que não podemos confiar inteiramente. O besouro ataca, cheias ou não, portanto começa a escassear».
A chegada do dia em que esta madeira deixará de existir é algo que a Fender sabe há, pelo menos, cinco anos. A decisão actual pretende minimizar os danos que o vácuo irá deixar. «Não podemos mais colocar guitarras em produção, afirmando poder fazer algo que já não podemos fazer. Se arranjarmos freixo, iremos usá-lo e fazer edições limitadas, mas infelizmente a nossa produção com esta madeira irá progressivamente parar».
Há uma série de planos em marcha. Consideradas as circunstâncias, a Fender está a estudar a possibilidade de recorrer a freixo de maior peso e densidade, criando corpos com câmaras de ressonância. A marca está também empenhada num plano de trinta anos para reflorestar o freixo nas zonas de Detroit e Michigan. Todavia, esta madeira irá mesmo tornar-se um componente de luxo na Fender. O alder (amieiro) irá permanecer como a principal madeira da Fender. Tal como o maple, também bastante recorrente nas guitarras, é uma madeira de rápido desenvolvimento. Ainda assim, a marca está também a considerar passar a construir com madeira de pinheiro no futuro.
São muitas a extraordinárias guitarras (e baixos), seja a mais elitista Fender Custom Shop ou a mais modesta Squier, que usam o freixo. Mas, por exemplo, vale a pena lembrar que a Fender Jimmy Page Signature Telecaster, lançada para celebrar os 50 anos dos Led Zeppelin, é construída em ash. É muito provável que se venha a tornar ainda mais valiosa, porque certamente a sua produção será reduzida. No ano passado, fomos com o Mário Delgado até ao Mr. Jack, para testar os dois modelos, a Mirror e a Dragon.