Avatar, No Circo do Diabo
2023-03-26, Lisboa Ao VivoIlusionismo, modelagem de balões e um circle pit ao estilo “Apita o Comboio”. Passados 10 anos, os Avatar voltaram a assentar o seu chapitô em Portugal e, com uma produção vistosa, proporcionaram-nos o seu espetáculo circense característico, que só pecou pela fraca afluência do público ao LAV.
Para recordarmos a última passagem dos Avatar por Portugal, que por sua vez também representou a estreia da banda de Gotemburgo em terras nacionais, temos que recuar quase 10 anos, mais precisamente a 27 de Novembro de 2013. Na altura, o grupo de Johannes Eckerström tinha caído de paraquedas numa tour que juntava os Five Finger Death Punch aos Avenged Sevenfold, isto porque à última hora a banda Device, projeto paralelo de David Draiman dos Disturbed tinha desistido da tour. Cientes da oportunidade que tinham à frente, os Avatar apresentaram-se no Campo Pequeno com o intuito de não só darem a conhecer a sua música, mas também todo o modelo de espetáculo que mais tarde os viria consagrar. A resposta do público ao concerto foi certamente positiva, o que nos leva questionar, mais uma vez, o porquê dos Avatar terem demorado quase uma década a regressar. Segundo Johannes tudo se deve ao trabalho dos promotores e da sua agência de booking que, durante anos, defendiam que não havia procura suficiente em Portugal que justificasse o regresso da banda. Infelizmente, essas duas entidades tinham razão, mas ainda assim decidiram arriscar a sua sorte. O resultado foi um espetáculo magnetizante e imersivo, como só os Avatar podem proporcionar, mas com um sabor agridoce, pois o LAV apresentou-se tristemente despido. Os poucos que estiveram presentes fizeram a festa, mas é bem provável que a falta de adesão do público possa vir a ter repercussões num futuro regresso dos Avatar em nome próprio a Portugal.
A Nova Vaga Helvética
Os primeiros a subir ao palco foram os suíços Kassogtha. Num registo semelhante ao de grupos como Jinjer e The Agonist, a banda liderada por Stéphanie Huguenin apresentou durante 30 minutos, o seu death metal melódico progressivo com elementos de metalcore. Competentes, mas pouco deslumbrantes, os Kassogtha apresentaram o seu mais recente álbum “rEvolve” (2022) e demonstraram que têm músicos extremamente dotados. Destacamos, o guitarrista solo Martin Burger, cujo o estilo de tocar remete para esta nova vaga de virtuosos liderada por Tim Henson.
Arrancado a Ferros
Seria expectável que o regresso a Portugal dos norte-americanos Veil Of Maya, após a sua estreia em 2019, fosse recebido com algum entusiasmo, contudo, o cenário não poderia ser mais contraditório. Encaixados num cartaz que não era necessariamente o seu, os veteranos do deathcore/metalcore viram-se aflitos para cativar um público que não era o seu e que durante a grande maioria da atuação, apenas se limitou a ficar especado a contemplar. Afinal de contas onde é que estavam todos aqueles que se descolaram ao Hard Club e ao RCA em 2019 para testemunharem a estreia da banda em Portugal? Estávamos mais ao menos a meio do concerto e o vocalista Lukas Magyar já demonstrava sinais de desagrado perante tanta apatia, mas do nada levantou-se uma réstia de esperança quando foi pedida uma wall of death e daí até ao final do concerto a interação entre público e banda foi mais dinâmica. Ainda a promover “False Idol” (2017) os Veil Of Maya levantaram o véu do próximo álbum “Mother”, a ser editado em Maio, com os temas “Godhead” e “Synthwave Vegan”, mas as reações mantiveram-se no mesmo registo. As despedidas acabariam por surgir naturalmente de forma bastante fria com a banda a ausentar-se de palco logo após terminar “Mikasa”.
O Espetáculo das Aberrações
Quando Alice Cooper surgiu na cena musical do final dos anos 60, este desenvolveu todo um modelo de espetáculo musical único repleto de teatralidade, efeitos e stunts. Numa clara alusão ao conceito estético Gesamtkunstwerk (obra de arte total), desenvolvido pelo compositor Richard Wagner para se referir à conjugação da música, teatro, canto, dança e artes plásticas numa única obra de arte, Cooper acabou por influenciar uma série de bandas que tal como ele colocam a música e a componente teatral/visual no mesmo patamar, falamos claramente de nomes como Kiss, Ghost ou Lordi. Os suecos Avatar seguem as mesmas pisadas dos seus pares, mas distinguem-se por apresentarem nos seus espetáculos toda uma estética aliada à temática circense.
Apesar do palco do LAV se apresentar algo limitativo no que toca a este tipo de produções, temos a dizer que os Avatar conseguiram jogar bastante bem com as condições que tinham à sua disposição e foi ao som de “Dance Devil Dance”, a faixa homónima do álbum, que a banda está a promover, que nos foi proporcionada uma primeira visualização da produção que os Avatar decidiram apresentar nesta tour. O que salta à vista são os quatro compartimentos ao estilo de provadores, que permitem controlar as entradas e saídas do palco, e dão aquele efeito surpresa, tal como acontecia nos circos e nas feiras populares nas exibições das chamadas “aberrações”. Seguiu-se o vaudeville de “The Eagle Has Landed”, que coloca em evidência a persona do Johannes Eckerström enquanto mestre de cerimónias. O vocalista dispõe de uma expressividade singular, algo que é facilmente notado no seu peculiar sorriso que tem tanto de amigável como de sinistro. As tradicionais desculpas por terem demorado tanto tempo a regressar a Portugal surgiram entretanto, com Johannes a questionar quantos dos presentes é que tinham estado no concerto do Campo Pequeno. Foram poucos os que levantaram os braços, algo perfeitamente perceptível, se tivermos em conta que os álbuns mais aclamados da banda só seriam lançados após esse concerto. Em 2013, “Bloody Angel”, do álbum “Hail The Apocalypse”, ainda não tinha sido lançada, mas é hoje em dia um dos maiores clássicos dos Avatar. No LAV a sua melodia orelhuda, bem como o refrão, foram entoados por todos demonstrando assim que é uma das faixas mais queridas dos fãs. Já “Puppet Show” trouxe um dos momentos mais divertidos do espetáculo. A faixa leva-nos para um ambiente circense/de feira popular, através do uso do hurdy gurdy e da bateria a contra-tempo, e proporcionou um divertido circle pit ao estilo “Apita o Comboio”. Johannes aproveitou este momento do espetáculo para se aproximar do público e apareceu de repente junto à mesa de som para possibilitar a todos umas valentes gargalhadas, primeiro ao demonstrar o seu jeito para a modelagem de balões ao fazer um cãozinho e depois ao sacar do trombone para acompanhar o resto da banda que estava no palco.
Johannes aproveitou este momento do espetáculo para se aproximar do público e apareceu de repente junto à mesa de som para possibilitar a todos umas valentes gargalhadas, primeiro ao demonstrar o seu jeito para a modelagem de balões ao fazer um cãozinho e depois ao sacar do trombone para acompanhar o resto da banda que estava no palco.
Ao longo do espetáculo não podemos dizer que tivemos tempos mortos. Entre músicas, ora os fãs gritavam pela banda, ora a banda tinha preparado pequenos momentos que tornavam as transições mais dinâmicas. Um desses momentos surgiu antes da demolidora “Black Waltz”, quando um roadie entrou pelo palco adentro com um embrulho. Ao pousar a caixa e abrir a tampa surgiram primeiro três balões e depois Johannes num claro número de ilusionismo. Por esta altura já estávamos completamente anestesiados com todos estes números e a nossa atenção para com a performance musical estava a ficar para segundo plano. É certo que já tínhamos assistido a um duelo solístico entre os dois guitarristas, Jonas “Kungen” Jarlsby e Tim Öhrström, que ao longo do concerto não largaram as suas Ibanez Custom RG Prestige, a de Kungen com pickups EMG 81 e 85 e a de Tim com Dimarzio Air Norton, mas foi preciso Johannes acalmar os ânimos com a balada “Tower” tocada ao piano para confirmarmos que afinal os Avatar não são apenas um bando de entertainers, são também músicos extremamente proficientes.
O baixista Henrik Sandelin, que não largou o seu Spector Custom, esteve discreto toda a noite, mas bastante sólido, já o baterista John Alfredsson mostrou-se sempre bem disposto e pronto para alinhar nas brincadeiras de Johannes. Desta forma, não é de estranhar que para si o momento alto do concerto tenha sido nas faixas “Colossus” e “Let It Burn”, quando foi montado um pequeno drum kit na frente de palco que lhe permitiu aproximar-se do público. O momento viria a terminar com uma pequena rave incentivada por Alfredsson, mais uma vez para dar lugar a uma transição, desta vez da desmontagem do drum kit para o cenário régio de “A Statue of the King”, faixa que faz parte do álbum conceptual “Avatar Country” (2018).
Já no encore surgiu a louca “Smells Like a Freak Show”, a faixa que resume tudo o que um concerto de Avatar representa e que aponta o dedo a todos aqueles que criticaram e que nunca compreenderam a ideia e o significado por detrás da banda. Para o fim ficou a demolidora “Hail the Apocalypse”, a malha do álbum homónimo de 2014 voltou a colocar o LAV em alvoroço e conduziu o espetáculo até à chuva de confettis e aos aplausos finais que surgiram ao som de “We’ll Meet Again” de Vera Lynn.
SETLIST
- Dance Devil Dance
The Eagle Has Landed
Valley of Disease
Chimp Mosh Pit
Scream Until You Wake
Bloody Angel
For the Swarm
Puppet Show
When the Snow Lies Red
Do You Feel in Control
Black Waltz
Tower
Colossus
Let It Burn
A Statue of the King
The Dirt I’m Buried In
Smells Like a Freakshow
Hail the Apocalypse