O VPC testemunhou algo raro: um artistal real, numa entrega incondicional de cada partícula de si.

Qualquer que seja o ângulo, é surpreendente e vigorosamente irónico que Charles Bradley tenha sido um dos mais celebrados concertos no VPC2015. Labels, público, imprensa, todos se empenham em exaurir a internet, em busca da próxima big thing. Marcas de instrumentos, de equipamento de estúdio, de áudio profissional, continuam a explorar o universo digital, em apresentar a tecnologia definitiva. É a meio destas ideias que Charles Bradley, à imagem da sua própria carreira e com os Extraordinaires carregados de aparato vintage e analógico, revela a única coisa que importa verdadeiramente num músico: a alma.

Num mundo de ídolos fabricados, numa era de artificialidade digital, foi a honestidade com que Bradley faz “das tripas, coração” e a simplicidade desarmante como se mostra humano que arrebatou tantos diante de si.

Poderia falar-se em atitude, vísceras ou guts, em cojones ou “tê-los no sítio”, mas alma é o que convenientemente traduz a expressão musical de Bradley, o soul. Não é a brilhante prestação da banda, não é a excelência comunicativa de Bradley ou a sua pujança física, não é o tremendo charme sonoro do concerto que fez desta celebração soul algo memorável para quem esteve no VPC. Foi o ter testemunhado algo raro: um artista real, numa entrega incondicional da sua devoção, do seu âmago, musical e pessoal. Quem expõe a alma coloca-se nu, oferece tudo. É real. E a multidão acolheu a alma de Bradley.

Foto: © Hugo Lima | www.facebook.com/hugolimaphotography | www.hugolima.com