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Devin Townsend, Il Maestro

Devin Townsend, Il Maestro

2023-03-18, Capitólio, Lisboa
Rodrigo Baptista
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Numa articulação perfeita entre as suas facetas de entertainer, músico sobredotado e galhofeiro, Devin Townsend compareceu no Capitólio para proporcionar um espetáculo sublime, sem grandes artifícios, destinado a todos os que procuram assistir a uma performance musical com rigor e proficiência técnica acima da média.

Não foi preciso esperar muito tempo para assistirmos ao regresso de Devin Townsend a Portugal. Recorde-se que o músico canadiano esteve no nosso país em Abril de 2022 como convidado dos norte americanos Dream Theater para participar na “TOP OF THE WORLD TOUR”.  Para os seus fãs mais acérrimos, este não foi o contexto ideal para rever o guitarrista, isto porque devido ao seu estatuto de opening act, Devin acabou por ter direito a uma atuação bastante reduzida. Desta forma, os fãs exigiram o seu rápido regresso, mas num concerto em nome próprio. Não só acedeu aos pedidos, como ainda trouxe na bagagem o novo álbum “Lightwork”, editado em Novembro de 2022, que se apresentou como o mote da tour que o trouxe ao Capitólio.

Devin Townsend é um músico muito pouco dado às convenções musicais tradicionais e isso é algo que também se traduz na forma como este estrutura o seu espetáculo, ao não se reger, muitas das vezes, pelos formatos já padronizados. Este aspecto ficou bem patente logo no início do espetáculo, quando Devin entrou em palco. Antes do músico fazer soar qualquer nota da sua guitarra, optou, em primeiro lugar, por apresentar todos os músicos em palco. Pode parecer algo irrelevante, contudo demonstra bem o respeito e reconhecimento que Townsend tem para com o guitarrista e teclista Mike Keneally, o baixista James Leach e o baterista Darby Todd, os três músicos que, sob o seu nome, executam as suas obras de forma magistral.

Feitas as apresentações, a banda lá partiu para o primeiro tema da noite, o semi-homónimo “Lightworker”, do álbum de 2022. Empunhando a sua Framus Stormbender “Stormtrooper” de 7 cordas, Townsend leva-nos numa epopeia sinfónico-progressiva narrada de forma expressiva pela sua voz de tenor semi-operático. Com um som praticamente imaculado, apenas faltava um pouco mais de volume nos vocais, ou uma redução no resto dos instrumentos, rapidamente percebemos que a acústica do Capitólio é uma das melhores no que toca à resposta sonora das salas da capital.

The Octopus Theremin

O repertório de Devin Townsend é extremamente extenso, estando este divido por vários projetos: Strapping Young Lad, The Devin Townsend Band, Devin Townsend Project e Casualties. Sendo esta uma tour a solo, houve, naturalmente, pouco espaço para desviar o rumo. Ainda assim, Townsend não defraudou as expectativas dos fãs que também vinham à procura de ouvir os outros projetos e “Kingdom”, do álbum “Epicloud”(2011), foi a primeira a visita ao Devin Townsend Project. Seguiu-se “Dimensions”, talvez o tema mais interessante da noite e que maior risota provocou entre o público. Este foi o momento do concerto em que Townsend trouxe para o palco a sua mascote, um polvo de peluche, que aparece em vários videoclipes e particularmente na capa de “Lightwork”. Utilizando-o como parte integrante do espetáculo, o polvo cobri-a o que rapidamente percebemos ser um theremin. Para os que desconhecem, o theremin é um dos primeiros instrumentos musicais elétricos. Desenvolvido por Leon Theremin nos anos 20 do séc. XX, apresenta duas antenas de metal que percepcionam o movimento das mãos do músico através de osciladores de frequência e de amplitude (volume). Ao ser controlado sem qualquer contacto físico entre o músico e o instrumento, o theremin provoca muitas vezes uma certa sensação de magia. Ainda pouco explorado no panorama da música popular, o theremin é sem dúvida um dos instrumentos musicais mais interessantes já alguma vez concebidos.

Há medida que o concerto prosseguia íamos ficando deslumbrados com as várias guitarras que Devin trouxe para esta tour e que já tinham sido apresentadas no rig tour que o guitarrista fez para o canal de youtube da Framus e Warwick. A deslumbrante Framus Stormbender Rainbow surgiu na bem esgalhada “The Fluke” do álbum “Terria” (2001) e na arrastada “Deadhead” de “Accelerated Evolution” (2003), a única passagem pela The Devin Townsend Band. Já em “Deep Face” Townsend arrebatou-nos com um solo inspirado na sua Kiesel sem headstock. Para a proggy “Heartbreaker” e a emocional “Spirits Will Colide” Devin colocou em evidência a projeção sonora da sua Framus Custom AK1974 Semi Hollow.

A Despedida Dissimulada

Antes de partir para “Bad Devil”, Townsend voltou a demonstrar o seu sentido de humor ao abordar de forma sarcástica aquilo que todos já sabemos, ou seja, que o famoso encore não passa de algo preparado e que de espontâneo não tem nada. Nesse sentido, Devin dirigiu-se ao público e disse: «Nós agora vamos tocar a última música, vamos sair do palco durante dois minutos, vocês vão gritar por nós e nós vamos regressar com um ar de espanto, como se isto não tivesse sido preparado.» Foi o momento ideal para antecipar a letras brincalhonas de “Bad Devil”, aí sim, improvisadas, que Townsend dispara consoante o seu estado de espírito. Para o fim ficaram reservadas, a balada “Call of the Void” e a demolidora “Love”, o único tema dos Strapping Young Lad ambas tocadas na sua Aristides t/O telecaster.

No fim Devin Townsend demorou-se nas despedidas, pois percebeu que à sua frente estava um público que realmente aprecia a arte de escutar uma boa composição, orquestração e quem bem toca um instrumento musical, e Devin ao fim e ao cabo é esse 3 em 1 e um dos poucos, fora do panorama da música erudita, a quem ainda podemos chamar maestro.

SETLIST

  • Lightworker
  • Kingdom (Devin Townsend Project)
  • Dimensions
  • Why?
  • The Fluke
  • Deadhead (The Devin Townsend Band)
  • Deep Peace
  • Heartbreaker
  • Spirits Will Collide
  • Truth (Devin Townsend Project)
  • Bad Devil
  • Call Of The Void
  • Love? (Strapping Young Lad)