Pixies, Os Maratonistas do Rock

Numa longa viagem musical, os Pixies demonstraram que não vivem só dos clássicos e levaram os fãs à loucura num concerto que mais pareceu uma autêntica jam de duas horas.

A analogia entre um concerto dos Pixies e uma maratona já foi aqui utilizada para descrever outras passagens da banda de Black Francis por Portugal. Mas não deixa de ser a mais indicada para relatar o desfile avassalador de 35 músicas que a banda de Boston apresentou no dia 14 de Março no Campo Pequeno, algo que no panorama do rock é, provavelmente, apenas equiparável às setlists que os Guns N’ Roses apresentaram ao longo da sua tour “Not in This Lifetime…”.

A promover “Doggerel”, editado em Setembro de 2022, os Pixies optaram por uma estratégia pouco comum no que toca às tours de promoção de um novo trabalho. Ao invés de apenas apresentarem três ou quatro músicas deste último registo, a banda optou por apresentá-lo quase na sua totalidade com onze das dozes faixas a serem tocadas no concerto, perfazendo assim quase 1/3 da setlist.

Foi ao som de “Cactus” do álbum “Surfer Rosa” (1988) que os Pixies abriram as hostilidades. Com uma produção simplista, mas eficaz, onde entre o jogo de luzes se destacam os quatro projetores de luz de cinema vintage, onde banda pretende assim demonstrar que todas as atenções se foquem apenas na sua música. “Nimrod’s Son” foi a primeira visita ao longínquo, mas muito saudado, EP “Come On Pilgrim” (1987) e antecedeu o clássico mais esperado da noite, a radiofónica “Here Comes Your Man” que levantou todos na bancada para darem um pezinho de dança ao som da surf guitar de Joey Santiago. Por esta altura já tínhamos percebido que o concerto iria correr em modo piloto automático, que é como quem diz, sem quebras e sem qualquer interação verbal entre músicas por parte de Francis, algo a que os Pixies já nos habituaram, mas que não deixa de criar um certo clima de frieza e de distância entre a banda e o público.

Por esta altura já tínhamos percebido que o concerto iria correr em modo piloto automático, que é como quem diz, sem quebras e sem qualquer interação verbal entre músicas por parte de Francis

Temas como “Vamos”, “Ana” e “Motorway To Roswell”, com Francis a partir uma corda a meio desta última, mantiveram-nos nesse vai e vem entre o final dos anos 80 e o princípio dos 90, período em que os Pixies definiram a sua identidade musical dentro do denominado rock alternativo. Já o primeiro vislumbre de “Doggerel” apenas chegou no fim do 1/3 do concerto com a enérgica “There’s A Moon On” a iniciar uma série de cinco faixas do álbum de 2022,  todas elas tocadas de rajada. Mais à frente, “Doggerel” demonstrou que Francis também é humano com o vocalista a interromper o inicio da música após uma falsa partida, tendo este sido talvez o único momento em que quebrou esse automatismo que vínhamos a assistir desde o inico do espetáculo.

Em “Head On”, os Pixies apresentaram o seu já habitual tributo a uma das suas influências, a banda escocesa de post punk The Jesus And Mary Chain. Já “All The Saints” foi a única piscadela a “Head Carrier” (2014), ficando apenas a faltar uma visita aos álbuns “Indie Cindy” (2014), o trabalho que assinalou a reunião do grupo, e “Beneath The Eyrie” (2019).

Sem direito a encore, quando ouvimos o hino “Where Is My Mind?” já sabíamos que o fim se aproximava, e houve apenas tempo para ouvir a inspirada cover de “Winterlong”, tema de Neil Young que os Pixies gravaram para a a compilação “Complete ‘B’ Sides” (2001) e que paradoxalmente tem vindo a fazer parte, de forma recorrente, das setlists da banda.

Claramente satisfeitos com a reação do público, mas sem expressarem qualquer sentimento através de palavras, os Pixies abandonaram o palco com o braços abertos como que a dar uma grande abraço de agradecimento ao público português que encheu o Campo Pequeno.