Mítico reencontro de Titãs junta gerações em Lisboa

A banda marcou presença em Lisboa no passado dia 3 de novembro, no Altice Arena, com a digressão “Encontro – Todos ao mesmo tempo agora“, uma comemoração dos 40 anos que passaram desde a sua formação inicial que juntou ex-integrantes numa festa memorável.

Os dez concertos inicialmente programados na digressão dos Titãs, “Encontro – Todos ao mesmo tempo agora”, passaram rapidamente a vinte e dois, e Portugal foi o único destino na Europa a ter a sorte de receber a lendária banda de rock brasileiro. Formada em São Paulo nos anos 80, os Titãs são uma das bandas mais aclamadas do Brasil. Estrearam-se, quase no final dessa mesma década em Portugal, junto a Xutos & Pontapés, banda à qual dedicaram, nessa noite, um cover do tema “A minha casinha”, evocando também a memória do músico já falecido, Zé Pedro, um companheiro recordado com emoção pela banda.

Se há coisa que não são é uma banda de uma geração só. Os Titãs conseguiram conquistar pais e filhos, num ensinamento que se passa cuidadosamente desde a infância, e que leva a que se encontrem gerações em alturas como esta. Esse foi o retrato da Altice Arena na última sexta-feira. A festa estava viva e aconselhava-se. Não tendo esgotado completamente, o público mais que compôs a sala, e, apesar do que já conhecemos do espaço e a facilidade dos seus ecos, o som das vozes, dos pianos, das guitarras, baterias e até o saxofone preencheu e não desiludiu.

Em muito melhor ponto que o som estava cada um dos músicos da banda. Todos na casa dos 60 anos de idade, mais um, menos um, entregam técnica, experiência e qualidade invejáveis. Além do talento que já lhes conhecemos, a energia com que enfrentaram o público – e que recebiam de volta – era imensa. Uma grande vontade de atuar para o país irmão, e para dois povos que se misturavam, era o denominador comum da noite.

O relógio indicava pouco depois das 21h30, com algum público ainda por entrar, quando os Titãs começaram a viagem com “Diversão”, uma música das mais claras do seu adn. Em palco vemos os elementos de sempre, Sérgio Britto e Tony Bellotto, e os que regressaram de propósito para este encontro: Arnaldo Antunes, Nando Reis, Paulo Miklos e Charles Gavin. Branco Mello juntou-se mais tarde, no segundo ato, tocando algumas músicas apesar da sua condição já conhecida: encontra-se em recuperação de uma recente cirurgia.

Arnolpho Lima Filho, mais conhecido como Liminha, produtor brasileiro e ex-baixista de “Os Mutantes”, esteve também presente como convidado da banda na guitarra rítmica. Substituído pela presença da sua filha, Alice Fromer, que entrou mais à frente no set, ficou a faltar Marcelo Fromer, músico que morreu vítima de um acidente de viação em 2001.

Com algumas aparições dos álbuns “Titãs” (1984), “Õ Blésq Blom” (1989), ou até “A Melhor Banda de Todos os Tempos da Última Semana” (2001), foram “Cabeça Dinossauro” (1986) e “Jesus não Tem Dentes no País dos Banguelas” (1987), terceiro e quarto álbuns da banda Paulista, os dois clássicos mais visitados da noite.

A primeira parte do concerto abriu em qualidade e quantidade de hits: contou com êxitos como “Tô cansado”, “Igreja”, “Homem primata”, “Estado violência”, “Comida”, “Nome aos bois” e “Cabeça dinossauro”, um momento de apoteose que só deixava no ar por onde poderíamos subir mais a temperatura. Um rock dos anos 80 com letras incendiárias que fala sobre temas que estão hoje ainda atuais, e que para a época eram mais que sensíveis, polémicos.

É no segundo ato, um set acústico, que somos surpreendidos com a aparição de Branco Mello. Sem falar, mas muito interativo e expressivo, a sua presença é notada e agradecida por todos. Esta parte começa com um dos êxitos mais recentes mas também mais ouvidos pelos fãs, “Epitáfio”, passando por canções-balada mais românticas como “Os cegos do castelo” ou “Pra dizer adeus”. Com as influências características do reggae, fortemente difundido no início dos anos 80 no Brasil, se a roda da nostalgia já estava a girar há um bom tempo, foi aqui que ouvimos e vimos as manifestações mais bonitas de carinho, saudade e celebração nas vozes dos fãs. Um voltar a um ou vários tempos que ficaram lá atrás e que é acarinhado por todos. As duas últimas que encerraram este segundo ato “Toda a cor” e “Não vou me adaptar” foram cantadas lado a lado com Alice Fromer em forma de homenagem ao seu pai, ex-guitarrista da banda.

É quando voltamos às guitarras elétricas e a uma segunda parte com um novo fôlego de energia de uma pausa mais calma (nunca chega a ser melancólica) que ouvimos hits como “Família”, “32 dentes”, “Flores”, “Porrada”, “Polícia” e terminamos na tão aguardada “Bichos Escrotos” com direito a vários grupos de moche ao longo dos largos metros daquele público diverso, o momento do concerto mais pós-punk de todos.

Depois de um encore “mal disfarçado”, quase nem houve tempo para um regresso implorado pelo público. Ainda entoavam os primeiros pedidos de “uma mais” quando a banda entra para tocar “Miséria”, “Marvin” e “Sonífera Ilha”, um belíssimo final, à altura de uma real farra e uma fascinante performance, do início ao fim.