Moonspell, A Celebração das 30 Voltas à Lua
2022-11-01, Coliseu dos Recreios, LisboaCom uma produção ambiciosa, munida de projeções e pirotecnia, os Moonspell celebraram os 30 anos de carreira nos Coliseus com um evento histórico-musical que, para além da música, onde foi revisitada toda a discografia da banda, teve também direito a uma viagem pelos vários artefactos que marcaram a história da maior instituição do heavy metal nacional.
Quando o tema é celebrações, é certo e sabido, que no panorama musical existe um padrão para se começar a assinalar diversos aniversários que remetem para determinados momentos na carreira de um artista/ banda. Em várias entrevistas, Fernando Ribeiro abordou esse assunto, ao referir que não queria que os Moonspell se tornassem apenas e só numa banda de legado. Desta forma, os Moonspell têm vindo ao longo do tempo a encontrar um equilíbrio entre a edição de novos álbuns e respetivas tours, e o assinalar de diversos aniversários, particularmente com a reedição de vários registos pela sua própria editora Alma Mater Records.
Contudo, uma marca tão redonda, como é o caso de 30 anos de carreira, claramente não poderia passar em branco. Obviamente que poderiam ter lançado apenas uma mega boxset, como fazem outras bandas, mas saberia a pouco, e bem vistas as coisas, já nos mimaram com o recém lançamento “From Down Below”, um DVD de um concerto inédito e transcendental que a banda deu, em plena pandemia, nas Grutas de Mira Aire a uma profundidade de 80 metros.
Há muito que os Moonspell nos habituaram a concertos temáticos e de celebração, à primeira vista podemos destacar os concertos anuais de Halloween, o Metal Day na FIL em 2010 ou o concerto de 25 anos, em 2017, no Campo Pequeno onde a banda tocou os álbuns “Wolfheart”, “Irreligious” e “Extinct” na integra.
Todos estes concertos têm algum em comum, são autênticos eventos onde se celebra não só os Moonspell, mas também a cultura do heavy metal. Os concertos que Fernando Ribeiro, Ricardo Amorim, Pedro Paixão, Aires Pereira e Hugo Ribeiro deram nos dias 31 de Outubro, no Porto, e 1 de Novembro em Lisboa encaixam perfeitamente neste cânone onde a banda procura criar toda uma experiência imersiva para os fãs. Para tal, os Moonspell incentivaram os fãs a chegarem cedo aos coliseus para poderem apreciar a exposição que foi montada com vários objetos que fazem parte da memorabilia da banda. Foi possível ver elementos cenográficos, figurinos, e instrumentos que estiveram presentes nas diversas tours que os Moonspell fizeram ao longo dos anos.
Se dúvidas ainda houvessem em relação ao legado e à importância dos Moonspell não só dentro do movimento do metal gótico, mas também no panorama do heavy metal internacional, essas dúvidas ficaram dissipadas com o vídeo de apresentação.
À medida que o inicio do concerto se ia aproximando, o nervoso miudinho sentido na sala também se intensificara. Se dúvidas ainda houvessem em relação ao legado e à importância dos Moonspell não só dentro do movimento do metal gótico, mas também no panorama do heavy metal internacional, essas dúvidas ficaram dissipadas com o vídeo de apresentação onde vários nomes incontornáveis do metal desde Mille Petrozza (Kreator) a Dani Filth (Cradle of Filth), passando por Behemoth (a cantar “Alejandro” de Lady Gaga, «don’t call my name, don’t call my name, Fer-nan-dooo») e Septicflesh louvaram os Moonspell e destacaram a importância da banda na afirmação de Portugal no mapa do heavy metal europeu.
Com uma setlist escolhida pelos fãs, através de uma votação online, à semelhança do que os Metallica fizeram na sua tour “By Request” ou do que os Opeth farão na sua próxima passagem por Portugal, a noite avizinha-se longa pois estávamos perante uma viagem cronológica que começaria com “Serpent Angel”, dos tempos em que a banda ainda se apelidava de Morbid God, e que só terminaria em “All or Nothing”, do mais recente “Hermitage”. A primeira sonoridade a ser rebuscada, pois já não conta no cardápio musical banda foi o black metal de “Under the Moonspell”(1994), “Tenebrarum Oratorium (Andamento I/Erudit Compendyum)” e “Tenebrarum Oratorium (Andamento II / Erotic Compendyum)” soaram ainda embrulhadas, mas verdade seja dita, o black metal também nunca foi o género mais polido do ponto de vista sónico. Já a passagem por “Wolfheart” (1995) iniciou-se ao som do folclore das mitológicas “Trebaruna” e “Ataegina”, com direito a acompanhamento do grupo Cornalusa, o público demonstrou o seu entusiasmo ao cantarolar a melodia enquanto saltava transformando assim o coliseu numa enorme festa medieval.
Seguiram-se as obrigatórias “Vampiria”, “Alma Mater” e “Opium” que fizeram a transição entre 1995 e 1996, ano em que esse marco do metal gótico português de seu nome “Irreligious” foi lançado. Enquanto “Abysmo” e “Mute”, esta última com a presença de membros do ensemble Opus Diabolicum, mantiveram a toada gótica presente em “Sin/Pecado (1998), “Soulsick” e “Butterfly FX” levaram-nos pelos caminhos da fase mais experimental dos Moonspell, onde a incorporação de vários elementos eletrónicos e industriais em “The Butterfly Effect” (1999) levou a que muitos fãs “abandonassem o barco”.
Já “Nocturna” de “Darkness and Hope” (2001) revelou ser a ponte perfeita para o metal literário de “Antidote” e “The Southern Deathstyle”, e que aqui teve direito a uma introdução com um excerto de “Antidoto” lido por José Luis Peixoto. Recorde-se que “The Antidote” (2003) resultou num álbum/ livro colaborativo entre os Moonspell e o escritor português.
“Finisterra” de “Memorial” (2006) e “Night Eternal” do álbum homónimo de 2008 trouxeram de volta o som mais extremo onde o death/black e gothic metal se misturam de forma soberba.
Já a encaminharmo-nos para a reta final eis que surgiu o hino em português “Em Nome do Medo” que contou com a participação, sempre vistosa, de Rui Sidónio dos Bizarra Locomotiva, esta e “White Skies” foram as únicas visitas ao não muito aclamado álbum duplo “Alpha Noir/Omega White” (2012). Seguiu-se “Extinct” que empresta o nome ao álbum de 2015, que com o seu refrão extremamente orelhudo colocou o coliseus a entoar os versos “Before the lights go out, Before our time is gone, A taste of your lips, Before we go extinct“. Seguindo a ordem cronológica já só faltava vasculhar dois álbuns, sendo que um deles tem uma particular afinidade com o dia em que se deu concerto, 1 de Novembro, estamos claramente a aludir a “1755” (2017), álbum conceptual inspirado no terramoto de Lisboa de 1755, desta forma e em jeito de celebração ouviu-se “In Tremor Dei” e “Todos os Santos”.
A fechar a noite fomos brindados com o rock progressivo e mais contemplativo de “All or Nothing”, tema do mais recente “Hermitage” (2021). Duas horas já tinham passado, mas ainda faltava o tema que muitos consideram ser o maior clássico dos Moonspell e que continua a arrepiar todos aqueles que já assistem a concertos da banda desde 1996, ano em foi editado “Irreligious”. “Full Moon Madness” fechou a noite com a alcateia presente no coliseu a uivar e a desejar que o feitiço da lua perdure no tempo por mais 30 anos.
Uma noite final, pela primeira vez num concerto de Moonspell, sentimos que nem toda a família estava em comunhão, muita conversa paralela, falta de entusiasmo nas palmas e nas ovações, com Fernando Ribeiro a puxar pela audiência um sem número de vezes e que muitas delas foram apenas correspondidas por uma pequena parte da audiência que se encontrava na frente.
A abrir a noite estiveram os suiços Samael, também eles uma instituição do metal gótico. Ao Coliseu dos Recreios trouxeram um concerto especial com o álbum clássico “Passage” a ser tocado na integra. Para os fãs de Samael que já não os viam em Portugal desde 2019 este foi sem dúvida um momento de celebração.
SETLIST
- Serpent Angel
Tenebrarum Oratorium I (Andamento I/Erudit Compendyum)
Tenebrarum Oratorium (Andamento II / Erotic Compendyum)
Trebaruna
Ataegina
Vampiria
Alma Mater
Opium
Abysmo
Mute
Soulsick
Butterfly FX
Nocturna
Antidote
The Southern Deathstyle
Finisterra
Night Eternal
Em Nome do Medo
White Skies
Extinct
In Tremor Dei
Todos os Santos
All or Nothing - Encore:
Full Moon Madness