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Opeth, Três Décadas de Elegância e Sofisticação Musical

Opeth, Três Décadas de Elegância e Sofisticação Musical

2022-11-26, Sala Tejo, Lisboa
Nero
Inês Silva
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Os comandados de Mikael Åkerfeldt encerraram a digressão europeia Opeth by Request “Evolution XXX” em Lisboa. Numa Sala Tejo à beira de esgotar, os suecos provaram uma vez mais porque são uma das mais excepcionais bandas das últimas três décadas, não só no metal ou no prog, mas na música rock em geral, recorrendo a predicados cada vez mais descartados por editoras e ouvintes do mainstream, como a conceptualidade das composições e a proficiência instrumental.

Originalmente apontada para 2021, foi adiada para 2022 devido aos motivos sobejamente conhecidos. A digressão Opeth by Request “Evolution XXX” vai celebrar trinta anos de carreira de uma das bandas mais aplaudidas e influentes dos últimos anos no espectro da música pesada, com os músicos liderados por Mikael Åkerfeldt a darem à sua legião de fãs a oportunidade de escolherem quais os temas que gostariam de ouvir nestes concertos. A votação decorreu em 2020, no seguimento do comunicado oficial:

«Ora bem, decidimos comemorar um aniversário tardio da banda», explicava Mikael Åkerfeldt. «Como vamos celebrar algo do género? Bem, vamos trabalhar. Estamos a planear alguns concertos selecionados ao redor do mundo em 2021, em que, basicamente, vocês vão poder escolher coletivamente as músicas para o alinhamento. Já que comemoramos trinta anos, gostaríamos de tocar uma música de cada um dos álbuns que fizemos. De todos os treze. Se puderem ajudar-nos, escolham uma canção por álbum da lista e nós tocaremos as que tiverem mais votos. Isto já foi feito antes, mas não por nós. Estou relutante e nervoso, mas também animado para ver que temas escolherão. Não posso acreditar que já existimos há trinta anos, mas a verdade é que aqui estamos. Ajudem-nos, por favor. E sejam gentis. O alinhamento final terá treze temas. Um de cada álbum. Vocês escolhem…»

Os Opeth passaram as últimas três décadas a crescer a todos os níveis, transformando-se num dos nomes mais influentes da sua geração e acumulando um corpo de trabalho que revela uma devoção enorme pelo conceito de progressão estética e um fervoroso desejo de busca pela perfeição. Sinónimo de evolução, são já um dos nomes mais consensuais no espectro em que se movem. Do death metal sueco infundido de romantismo dos primeiros discos, à mistura perfeita de agressividade e melodia de “Still Life” e “Black Waterpark”, passando pela criatividade dos registos mais recentes – o último, “In Cauda Venenum”, foi editado em duas versões, uma cantada em inglês e outra cantada em sueco –, ao longo dos últimos trinta anos, o inimitável Åkerfeldt, estratega e principal compositor do grupo, tem mostrado saber exactamente como remodelar o seu veículo artístico sem sacrificar o espírito criativo e aventureiro que o caracteriza desde a formação em 1990.

No final de 2021, os suecos anunciaram a saída do baterista Martin Axenrot através de uma publicação nas redes sociais. A razão apresentada foi «conflitos de interesses». Axenrot foi substituído, temporariamente, por Sami Karppinen [Therion] e depois foi eleito Waltteri Väyrynen. «Todos desejamos o melhor a Axe em todos os seus projectos futuros. Ele foi uma parte incrivelmente importante da banda por muitos anos, e estamos todos com o coração partido porque não funcionou no final. Mas a vida é assim, creio…», escreveu Mikael Åkerfeldt. Martin Axenrot juntou-se oficialmente aos Opeth em 2006, depois de Martin Lopez se afastar da banda por razões de saúde e mais tarde para se dedicar aos Soen. Participou em todos os álbum, desde “Watershed” a “Cauda Venenum”.

LEGADO

Já na noite lisboeta, podemos especular sobre a veracidade da votação da setlist, o quanto imperou a vontade dos fãs e o quanto a banda a adulterou mas, de qualquer forma, ninguém com a sanidade intacta se poderá queixar de ter tido a possibilidade de ouvir um tema de cada um dos discos da riquíssima discografia da banda. Há, certamente, fases que agradam de forma diferente a diferentes indivíduos. Neste caso a nossa predilecção situa-se entre o álbum de estreia, “Orchid” (1995), presente através de “Under The Weeping Moon”, e o sumptuoso “Blackwater Park” (2001), que foi visitado com os mid-tempos da semi-acústica “Harvest”.

E por falar em sumptuoso, é quase desnecessário referir o altíssimo nível de execução técnica na prestação de cada um dos músicos. A banda tocou cada um dos temas com um dinamismo natural, sem esforço e com enorme coesão. Ainda assim, até pelo período que apontamos como favorito, pareceu-nos sempre que Väyrynen soou algo estéril na comparação com o explosivo legado de Lopez. Enfim, opiniões e subjectividade. Afinal, em momento algum o novo baterista comprometeu o concerto. Dizer ainda que não deixou de ser surpreendente, devido ao passar dos anos, sentir a força juvenil dos vocalizos death metal de Mikael Åkerfeldt, exigidos logo em “Demon Of The Fall”.

Também não deixou deixou de causar espanto perceber, mal começou o concerto, em “Ghost Of Perdition” o enorme coro da plateia nas melodias vocais. Embora isso seja apenas mais uma prova de que os Opeth são uma das maiores bandas de sempre a emergir dos espectros mais pesados da música. Mesmo que tenham, progressivamente, criando uma distância estética com as suas origens sonoras, para explorar maior fusão na sua música e até um sentido retro do rock progressivo, principalmente a partir de “Heritage” (2011), que ofereceu “The Devil’s Orchard” ao alinhamento (embora já perto do final).

A conjugação do passado sónico mais extremo, com a sofisticação cada vez mais refinada das canções, permitiram uma deslumbrante viagem de cerca de duas horas e meia pela discografia dos Opeth, capaz de agradar a gregos e a troianos.

Todavia, é a esse carácter da sua música que chegamos com “Eternal Rains Will Come”. Uma composição quase como um bucólico pastoral, de fusão jazz, que vai progredindo para o psicadelismo das décadas de 60, com o músculo do hard rock clássico dos anos 70. Bom, na verdade estamos como a descrever de forma generalizada o álbum de 2014, “Pale Communion”, mas a ideia é destacar como, ao vivo, o tema criou uma atmosfera mesmerisante. A justaposição com “Under The Weeping Moon”, malhão que soou arrasador, teve um efeito magnífico. Já na visita ao passado mais distante da banda, “Black Rose Immortal” desiludiu um pouco…

Antes de tocar a canção, Åkerfeldt alertou a Sala Tejo de que os seus vinte minutos a tornavam extremamente complicada de replicar ao vivo. Foi cativante assistir à intensidade de cada um dos músicos na sua execução mas, no final, cada um dos quatro actos  do tema sentiram-se algo fragmentados entre si. Ainda assim, contemplar a canção na sua totalidade continua a colocar-nos diante de um dos melhores momentos da discografia dos Opeth. “Burden” soou pálida por comparação, ainda para mais enfiada entre outro magnum opus dos suecos, “The Moor”, extraído ao magnífico “Still Life” (1999).

Gravado em 2018, nos Park Studios, em Estocolmo, “In Cauda Venenum” foi o 13º álbum dos Opeth. Originalmente, foi editado em duas versões (em sueco e em inglês). “Allting Tar Slut” (ou “AllThings Will Pass” fechou o bloco principal do concerto. No encore sentiu-se o peso vísceral de “Sorceress” e o refinado humor na homenagem aos Napalm Death e ao histórico álbum “Scum”. A terminar “Deliverance” foi um compêndio de todos os aspectos que os Opeth mostraram ao longo da noite lisboeta e desenvolveram durante três décadas. Dificilmente algum dos presentes terá saído desiludido do concerto.

PRS

Mikael Åkerfeldt, desde sempre na banda, estabilizou a sonoridade de guitarra dos Opeth com a chegada, em 2007, de Fredrik Åkesson. Os guitarristas são ambos endorser PRS,com modelos de assinatura na marca, que criou inclusive um modelo SE com a assinatura de Mikael. Os guitarristas, em entrevista à Arte Sonora (originalmente publicada na AS#20, em 2011) falam das suas guitarras.

«Já desde 1999 que usava PRS, na altura o Anders “Blakkheim” Nyström [Katatonia, Bloodbath] pediu-me para ir com ele ajudá-lo a escolher uma guitarra e na loja estava uma PRS Standard 24 que ambos experimentámos e eu fiquei de “boca aberta”. Eu fiquei danado [risos] porque eu queria a guitarra e ele comprou-a, gravou um álbum com ela, mas disse-me «a guitarra é demasiado boa para mim, queres comprá-la?», comprei-a e gravei o álbum “Blackwater Park” com ela, e usei-a desde então. Depois para enfrentar as digressões comprei outra, uma Custom 24, em segunda mão, mas com o avolumar das digressões senti que necessitava de outra guitarra e pedi ao nosso management para nos ajudar num acordo com a PRS, o que aconteceu. Fomos mesmo à fábrica e acabaram por me propor um modelo de assinatura. Gosto muito da Modern Eagle, mas não queria que fosse um modelo que ninguém conseguisse comprar, então, basicamente é o mesmo tipo de guitarra, mas uma SE. Os pickups são o HFS Treble e o Vintage Bass, o braço é um pouco mais largo que o de uma Modern Eagle, é como gosto pois permite-me tocar de forma mais limpa», referia o frontman na nossa conversa, na altura, em Frankfurt.

Já Åkesson confessava: «O meu contacto foi através do Mikael, depois de ter entrado na banda. Contribui com algumas ideias nos acabamentos e o controlo de pickups é invertido, com a posição da bridge por cima, pois é a que uso mais. Os pickups são os SE 245, Treble e Bass, cada um com controlo de Tone e Volume, penso que aí fui influenciado por ter tocado tanto tempo com Gibson. Gosto muito da guitarra. É em mogno, com tampo em maple e escala de ébano».

VOIVOD

Uma horas antes da subida ao palco dos headliners, foi desapontante ver que a maioria do público que iria encher a Sala Tejo para ver os suecos, simplesmente se borrifou para os Voivod. Uma banda absolutamente singular e dona de mestria técnica equiparável à dos Opeth. O guitarrista Daniel Mongrain (ou Chewy) foi exuberante, oferecendo um vendaval de shred a quem se dignou a chegar mais cedo ao concerto.

Com 15 álbuns de estúdio na carreira, escolher um alinhamento de apenas oito músicas deve ter sido uma tarefa dolorosa. “Experiment”, “The Unknown Knows” e as recentes “Synchro Anarchy” e “Holgraphic Thinking” foram apresentadas com um som algo pífio. A articulação instrumental estava definida na mistura, mas não emanava qualquer chug. O corpo sónico começou a ser redimensionado em “The Prow” e, com a sala a encher progressivamente, os canadianos foram ganhando mais confiança e groove na execução dos temas. Quando regressaram ao álbum lançado este ano, com “Planet Eaters”, a plateia começou a focar a sua atenção nas estruturas sincopadas e progressivas do thrash metal dos Voivod e, depois de “Fix My Heart”, a tradicional cover de “Astronomy Domine”, über clássico dos Pink Floyd, deixou todos os presentes rendidos ao seu carisma. Então, muitos queixavam-se da fila que enfrentaram para entrar…

SETLIST

  • Ghost of Perdition
    Demon of the Fall
    Eternal Rains Will Come
    Under the Weeping Moon
    Windowpane
    Harvest
    Black Rose Immortal
    Burden
    The Moor
    The Devil’s Orchard
    Allting tar slut
    Sorceress
    Deliverance