Quantcast
25 anos de Riot grrrl: As palavras de Suspiria Franklyn sobre as Bikini Kill

25 anos de Riot grrrl: As palavras de Suspiria Franklyn sobre as Bikini Kill

Tiago da Bernarda

A banda responsável por dar o nome ao movimento artístico feminista Riot grrrl faria este ano 25 anos de existência. Convidámos Suspiria Franklyn, fundadora da primeira banda portuguesa do género, a escrever sobre a influência das Bikini Kill na sua vida.

Apontar ao certo um ponto exacto na génese do movimento Riot grrrl requer frisar que longe de ser reconhecido como tal, haviam já artistas proeminentes dentro e fora da música que destacavam esses valores. Lydia Lunch, Siouxsie, ou até Patti Smith, são figuras marcantes para o que viria a ser cunhado como um movimento influente artístico feminista DIY.

Mas se formos ao início dos anos 1990, em Washington, a cena underground já tinha alguma notoriedade graças a bandas de punk rock como Minor Threat, Fugazi ou Bad Brains, e não demorou muito até o activismo feminista, que por sua vez também era (é?) considerado propício do underground, cruzar-se com o género. Mas tal como a cultura DIY, o movimento transcende a música e propaga-se também pelos fanzines, poesia, fotografia, artes plásticas e performances.

O primeiro registo físico com o nome Riot grrrl encontra-se num fanzine criado por membros da banda Bikini Kill, formada há 25 anos. Agora, Suspiria Franklyn, vocalista fundadora de bandas como Everground, em 1994, e Les Baton Rouge, mais recentemente os Kinetic Glass, escreve sobre o peso que as Bikini Kill tiveram tanto na sua carreira artística como na sua vida pessoal:

 

As Bikini Kill integram um universo que em muito ultrapassa a música.

12325064_1004145002974926_981185550_n

As Bikini Kill integram um universo que em muito ultrapassa a música. Falar sobre as Bikini Kill é falar sobre um pedaço de história no feminino, sobre igualdade de géneros, sobre “empowerment”, sobre rejeição de estereótipos e também sobre raiva. Raiva porque ainda habitamos numa sociedade onde, passados 25 anos, este tipo de luta ainda faz sentido.

A primeira vez que as ouvi foi com o álbum Yeah Yeah Yeah Yeah, devia ter uns 16 anos. A voz cortante da Kathleen Hanna, os riffs da guitarra, a ferocidade do baixo e da bateria, é como levar um soco no estômago. Já antes ouvia algumas bandas da Kill Rock Stars mas Bikini Kill era totalmente diferente. Rapidamente percebi que havia ali algo arrebatador. Parecia que o som nos empurrava para a frente e nos levava a avançar.

De repente tudo parece simples e acessível. Rebel Girl passou a ser um dos meus estandartes e coincidiu com a formação da minha primeira banda, as Everground, em 1994. Fomos a primeira banda portuguesa totalmente feminina e assumidamente punk riot grrrl. O facto de ter conhecido Bikini Kill nessa altura foi algo revelador. O processo de identificação foi imediato porque eu estava mais preocupada em fazer música, passar uma mensagem de força, respeito e independência do que propriamente vender uma imagem e para mim essa é a verdadeira definição de riot grrrl.

Nessa altura não havia acesso à internet e havia poucos locais onde se podia descobrir e investigar detalhes sobre as bandas que nos interessavam. Nos Estados Unidos, vivia-se o auge do riot grrrl mas por aqui o termo era praticamente desconhecido do grande público. Já existiam excelentes bandas femininas como as L7, Babes in Toyland, Slits ou Raincoats mas enquanto banda, as Bikini Kill foram responsáveis pelo despertar de uma batalha e pelo atear de um rastilho que se espalhou por todo o mundo.

O som das Bikini Kill revolucionou o meu mundo e o de muitas outras mulheres.

Era enriquecedor constatar que bandas como as Bikini Kill defendiam a política do DIY, que funcionava como mais um incentivo a quem não tinha meios e contactos na indústria musical. Isso só nos dava ainda mais força e poder para criar e controlar o nosso próprio mundo, pessoal e musicalmente. Finalmente os músicos poderiam criar as suas próprias editoras, gerir a carreira e a agenda de concertos sem precisar de mais ninguém.            

No decorrer da história, e já lá vão 25 anos desde o início da formação da banda, nem sempre foi fácil para bandas como as Bikini Kill erguer um estandarte feminino, o que para o bem ou para o mal, causou confusão a muita gente. O termo feminista, tantas vezes mal interpretado, não se resume a ódio pelos homens, a fanatismo ou a extremismo. Pretende-se defender a igualdade de géneros e a independência e respeito pelos direitos da mulheres, tantas vezes resumidas a meros objectos de imagem e exploração corporal. Nesse sentido, a indústria musical massiva evoluiu no pior sentido do termo pois revela que as mulheres têm poder de imagem mas uma mensagem fraca ou inexistente.  

Enquanto mulher, mãe e profissional, sempre defendi os meus ideais, sem tabus nem vergonha. O som das Bikini Kill revolucionou o meu mundo e o de muitas outras mulheres. Para a história ficam 11 releases divididos entre álbuns, singles, EP’s e compilações, o legado foi de tal forma imponente que ainda hoje permanece. Cabe agora à próxima geração de grrrls mudar novamente o curso da história. “We’re all waiting, we’re all waiting here”