King Dude, Sons do Cinturão Bíblico
King Dude cria, com a sua música, aquela atmosfera gótica sulista, de horror e violência rurais. O músico fala-nos das suas influências líricas e sonoras.
O António Silva (SWR Inc.) descreve-nos T.J. Cowgill: «Filho de pai guitarrista e proveniente de um passado ligado à música mais extrema (é frontman da banda de Death Metal “Book of Black Earth”), foi sob a premissa de que one man bands de metal são difíceis de concretizar quando comparadas às de folk que T.J. Cowgill roubou o “King” a King Diamond e lhe juntou uma famosa personagem do filme The Big Lebowski para se reinventar como King Dude. Contrariando um género onde prosperam letras na primeira pessoa sobre amores e dissabores, o Rei Gajo guia-nos por negras baladas de terror e assassínio com um toque de Americana, numa mistura de folk, blues e country onde por vezes surge inesperadamente uma veia quase omissa de rock’n’roll entre as linhas de guitarra que compõem os temas. A sua música revela a intensidade de um Nick Cave na era Birthday Party, com passagens embutidas de tal forma de trevas e horrores que fazem Johnny Cash parecer um beto».
O músico, em conversa com a AS, descreve-nos as suas influências líricas e sonoras…
És um tipo maniqueísta ou apenas gostas de usar o mais velho motivo dos contadores de histórias: Bem vs. Mal?
Não me considero um maniqueísta, mas gosto, de facto, do dualismo medieval e, sem dúvida, que extraio influências dessa forma de pensar. Mas as letras acabam por não ser tanto “Bem vs. Mal”. São um pouco mais complexas. Estão abertas a interpretação, que é a melhor característica da poesia e da música.
Não deixa de ser pouco comum ver um músico de Seattle possuir uma abordagem ao melhor estilo “bible belt” e gótico sulista…
Gosto de todo o tipo de música, não apenas daquela do Pacífico Nordeste. Cresci a ouvir punk e metal. Na verdade, a primeira canção que aprendi a tocar numa guitarra foi “House Of The Rising Sun”. Depois aprendi algumas canções do Buddy Holly. Sempre adorei blues e country, acabou por ser algo natural começar a tocar isso. O meu pai é um guitarrista com um excelente picking, no estilo do Leo Kotke. Passei a vida a ouvi-lo tocar e tenho a certeza que me influenciou imenso.
Quão difícil é criar horror numa época em que a sociedade vai perdendo a sua sensibilidade, com o aumento e rapidez de propagação de imagens reais de violência nas redes sociais e nos media, em geral?
Duvido que alguma vez fiquemos sem a capacidade de nos chocarmos com a violência. A violência real é sempre muito intensa e a autenticidade das emoções em torno da violência ou do amor, diga-se, são detectáveis a alguém suficientemente atento para o reconhecer.
Tendo no currículo coisas tão distintas como o trabalho com Book Of The Black Earth ou Chelsea Wolfe, o que podes extrair sonoramente daí para as coisas de King Dude?
Não creio que alguma vez faça um disco de metal enquanto King Dude. Não o quereria ouvir e estou bastante certo que as pessoas também não. O mais porreiro nesta banda (ou projecto) é que as canções são aquilo que mais me importa. Portanto, o que quer que seja que a canção precisa de ser é aquilo que farei por ela. Trabalho para as canções.
Depender de outros músicos pode ser uma experiência bem difícil e frustrante.
É frustrante actuares sozinho, em vez de poder usar todo o potencial da banda? Que compromissos necessitas para poder manter o núcleo essencial das canções?
Todas as minhas canções começam comigo sozinho, daí que nunca haja um sentimento de frustração, de todo. Aliás, o que pode acontecer, por vezes, é as canções serem prejudicadas pela banda – ter demasiadas opções para fazer sons específicos pode ser algo mau. Além disso, depender de outros músicos pode ser uma experiência bem difícil e frustrante. Não diria que tenho preferência de um cenário sobre o outro, mas que gosto de certas particularidades em cada um. No final de contas, se a canção é boa não necessitará de mais que um instrumento e uma voz.
E que instrumento te acompanha e sem o qual não vives?
Estarei sempre acompanhado por uma Martin acústica. Mais nada. Esta guitarra é também obrigatória em estúdio. Também gosto muito de usar o meu próprio Shure SM8 em estúdio mas, na realidade, qualquer coisa que leve o trabalho a bom cabo funciona para mim.