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Apertei a mão ao Bowie e vocês não!

Apertei a mão ao Bowie e vocês não!

Tânia Ferreira

Em 2006, ainda no dealbar da máxima «pics or it didn’t happen» aconteceu uma história inverificável, mas verdadeira: Eu apertei a mão ao Bowie e vocês não!

Durante anos, não raras vezes, “piquei” a equipa da redacção da Arte Sonora: «EU CONHECI O BOWIE E VOCÊS NÃO!». E se hoje há quem se orgulhe de o Presidente da República lhe ligar, eu também posso dizer alto e bom som que estive de mão dada com o David Bowie! Aliás, duvido que o Presidente dos Afectos alguma vez tenha apertado a mão ao Camaleão. Quem ganha?

É óbvio que o simples facto de tocar uma figura desta envergadura não me eleva, seja porque o talento não passa por osmose ou porque a minha espiritualidade não alcançou esse nível, mas a experiência foi tão marcante que precisava de ser assinalada. Várias vezes. Vários anos. Afinal, é o Bowie, fata-se!

Na verdade, este requinte de malvadez a que me permitia de quando em vez era acompanhado por um sentimento de saber-me pouco merecedora, estando eu rodeada de pessoas muito mais conhecedoras da vida e obra do que eu – que gosto, respeito e conheço, mas não da forma visceral de muitos dos meus colegas.

O encontro foi curto (segundos!) mas profundamente impactante. Primeiro, há que contextualizar: um grupo restrito de jornalistas portugueses é convidado pela Nokia para conhecer a sua nova plataforma ligada à música: International Community of Music Connoisseurs – The Music Recommenders. Na locomotiva portuguesa vai uma “miúda”, saloia de gema, nascida e criada na zona agrícola de Sintra e que nesse precioso momento se encontra em Times Square, New York City [Setembro de 2006]. Num dos dias do evento, antes de um concerto privado de Gnarls Barkley, a directora de comunicação da Nokia Portugal (na altura, Conceição Pires) confidencia que poderá haver a oportunidade de conhecer David Bowie, que era o “padrinho” da plataforma e que mensalmente recomendava as suas descobertas musicais, viajando pelo mundo à procura de novos talentos. «Não sei se dá para falar com ele. Pode não haver espaço para perguntas. As fotografias estão proibidas. Nestas condições, querem? Somente posso levar duas pessoas». Portugal tinha assim direito a dois jornalistas no “ultra-exclusivo-meeting” e a groupie que há em mim logo se manifestou e a ansiedade tomou conta dos momentos seguintes – estava em representação de um meio de comunicação que também focava a música pelo que, caso a oportunidade surgisse, seria uma das escolhidas. A oportunidade surgiu! E eu não a deixei escapar!

O meu encontro imediato com Bowie foi à “Zé tuga” – desenrascanço total. Assim que entrou na sala onde o aguardávamos, tive uma janela de um microssegundo para intervir – aquele intervalo em que o tempo fica suspenso e sucedem-se, em câmara lenta, os momentos que distam entre a visualização da pessoa, o entendimento de informação pelo nosso cérebro e a perda de vergonha, timidez ou qualquer outra âncora que segura os nossos ímpetos mais primários. Foi o tempo necessário e eu sabia que era uma once-in-a-lifetime opportunity. E, do alto do meu metro e meio, saquei do meu best accent e assim que David Bowie deu o segundo passo em sala já eu rasgava o silêncio cortante e dizia, de voz trémula, mas audível: «Hi Bowie. I`m Tânia, from Portugal» (uma informação desnecessária, bem sei!). Estiquei a mão e… Demos um grande PASSOU-BEM. À portuguesa! E no instante seguinte fui, literalmente, abalroada pelos restantes jornalistas. Mas eu fui a primeira. MEGASCORE! A primeira a falar e a primeira (e das poucas) a cumprimentar o artista. Não houve lugar para perguntas. Não houve lugar para fotos, para mais tarde recordar, apenas a memória a atestar a veracidade – isso e algumas palavras menos bonitas que venho coleccionando sempre que falo do acontecimento.

Com a adrenalina ao rubro, saí do anfiteatro (Kodak Center na altura) e em plena Times Square liguei imediatamente para Portugal. Para meter inveja – coisa feia – a quem merecia muito mais do que eu viver aquele momento. Liguei a duas pessoas. Que são hoje o director técnico e o editor da Arte Sonora. O destino é tramado!… Curiosamente, ano e meio depois nascia o primeiro número da AS.

«I Will be King. And You, You Will Be Queen”. Foi o que ouvi, em sussurro, mão na mão. Tânia e Bowie de mãos dadas…

PS: De notar que o meu telefonema não foi recebido da melhor forma e o meu entusiasmo apenas recebeu um chorrilho de insultos. #scumbags