Tribal, dançável, viciante, o primeiro longa-duração dos Club Makumba serve-se da trágica crise dos migrantes do Norte de África para assinalar uma narrativa (instrumental) que versa preocupações políticas e intervém na luta pelos direitos e a justiça humana e social. Sublime.
“Club Makumba” é um álbum feiticeiro que nos envolve e agarra a cada audição. É pura magia negra na forma de música instrumental que ergue as suas bandeiras de resistência nas quentes costas mediterrânicas para se expandir, sem fronteiras, nem barreiras, até latitudes como o Norte de África, o Médio Oriente ou os Balcãs, numa cartografia musical exuberante, celebração tribal e sedutora, exótica quanto baste e que diz imediatamente ao que vem no tema inaugural – “Danças”.
Nas palavras do quarteto, os 11 temas que compõem o disco são «guitarras das costas do sul, ritmos quentes (…) varridos por espíritos que vagueiam no ar e nas dunas do jazz, melodias e afinações antigas, que chegam até nós em tempestades de poeira eléctrica». São «hinos dedicados a todos os que tentam uma vida melhor nestas margens ocidentais, negligenciados por uma Europa cada vez mais fechada em si própria».
Num contínuo apelo à dança como manifesto de princípio, a viagem passa por lugares tórridos como “Crazy Lizard”, de onde nos chegam ventos magrebinos soprados pelo saxofone de Gonçalo Prazeres, num ciclo confortavelmente repetitivo, exaltado pela guitarra hipnótica e suja de Tó Trips. Apenas um dos muitos exemplos da visão atmosférica de um álbum em que as melodias se apresentam quase sempre perfeitamente encaixadas no groove osmótico da secção rítmica baseada na percussão de João Doce e no baixo de Gonçalo Leonardo.
A viagem segue com “Baía das Negras” e o seu contrabaixo vigoroso, as distintivas percussões norte-africanas e os já bem conhecidos riffs desérticos de Tó Trips, e faz depois uma breve escala em “Migratória”, novo condensado exótico que rapidamente se precipita para mais um momento de imobilidade impossível.
Sem nunca perder de vista o sabor mediterrânico, “Jimmy Habibi”, “Makumba das Foncas” e “Maze” são instantes de rock clashiano – ou não fossem dois destes macumbeiros homens do rock -, “Black Berbere” é mais um grito sufocado dos povos nómadas perdidos algures entre Marrocos e a Argélia, “Hurghada Honeymoon” traz-nos laivos de jazz e “Med Swing” contém a tempestade arenosa com o seu ambiente repetitivo, hipnótico, mid-tempo, pacificador.
A última paragem – na serena e contemplativa “Going Nowhere” – transporta-nos para novo ponto da cartografia deste clube do qual não apetece sair. “Club Makumba” é, em suma, um feliz encontro sem preconceitos entre a carne e o espírito, o magrebe e os balcãs, o rock e o afro beat e em que o grito de ordem transversal ao disco é: dançar.