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MEO Kalorama 2022: O Fenómeno Kraftwerk, os Espalhafatosos Chemical Brothers e os Discretos Moderat

MEO Kalorama 2022: O Fenómeno Kraftwerk, os Espalhafatosos Chemical Brothers e os Discretos Moderat

2022-09-01, MEO Kalorama, Lisboa
Miguel Grazina Barros
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O primeiro dia do novo festival lisboeta MEO Kalorama ficou marcado pelo ecletismo de três bandas electrónicas bastante distintas.

Injustamente posicionados no palco secundário do festival MEO Kalorama, os Kraftwerk voltaram a arrebatar corações e a despertar as emoções mais sublimes à flor da pele. Formados em 1970 na Alemanha, os homens-máquina foram responsáveis por desenvolver toda uma estética synth-pop e electro-pop, provando ao mundo que as “máquinas” também conseguem ter sentimentos. Apenas Ralf Hütter sobra da formação original da banda, depois da morte de Florian Schneider em 2020 – substituído em palco por Stefan Pfaffe. As suas composições minimalistas, robóticas, austeras mas doces impulsionaram a música electrónica para o mainstream, retirando a lacuna da “musique concrète” associada à electrónica pré-Kraftwerk. São sem dúvida um dos grupos mais inovadores do século XX, estabelecendo os alicerces para a música electrónica contemporânea. É com este peso que os Kraftwerk se apresentaram em palco, não fugindo à mesma fórmula que nunca variou durante todos esses anos de banda – e continua a funcionar tão plenamente como antes.

Avistam-se os icónicos quatro pódios em cima do palco quando se começam a distribuir óculos 3D pelo público – era difícil encontrar alguém que não tivesse direito a um par de óculos. Subitamente, pelas 22h do dia 1, leds verde neon perfilam os mesmos pódios e o palco. Entram em palco os quatro visionários, dando imediatamente início à primeira canção “Numbers / Computer World / Computer World 2”, acompanhados por belíssimos gráficos com código binário – semelhante à imagética de “Matrix” – que ganham vida através dos óculos 3D. “Spacelab” vai ainda mais além com os gráficos, ao mostrar uma projeção com imagens da cidade de Lisboa – naturalmente recebido com aplausos pelo público. “Man Machine” é outro êxito do álbum homónimo de 1978 cuja maioria da plateia sabe de cor, cantada ao vivo por Hütter com um microfone headset que processa a voz com vocoder, uma técnica muito popularizada pela banda. No entanto é “The Model/Das Model” que se assume (sem surpresas) o maior êxito dos Kraftwerk – aplausos que confirmam que o que estamos a observar é, sem dúvida, um concerto. Apesar de fazer parte do próprio show manter em segredo o que se esconde por trás dos pódios de cada um dos quatro membros da banda, um vídeo desmascarou um potencial exemplo do que os “homem-máquina” podem estar a fazer – controladoras MIDI, tablets, pads e sintetizadores. Cada membro parece ter uma função muito específica, comprovado pelo final do concerto ao actuarem “Music Non Stop”, em que ao abandonarem o palco um a um, o instrumental ficou cada vez menos completo e vazio assim que abandonavam o seu instrumento. O som esteve durante todo o concerto irrepreensível – os graves bem posicionados e presentes, sem se sobreporem ao resto das frequências sonoras. Foi mais um concerto para recordar, esperemos que venham mais.

Pelas 23h30 no palco MEO – o colossal palco principal do festival – actuou o duo britânico The Chemical Brothers que se encaixa aproximadamente no lado oposto aos Kraftwerk no espectro da música electrónica. Com o dever de encerrar o palco MEO na primeira noite do novo festival, a dupla foi certamente a escolha infalível – com doze actuações em território português desde a sua formação em 1989, não é novidade que os seus concertos não poupam nos artifícios e na energia. Completamente artilhados de máquinas electrónicas em palco, rodeados de fumo e lasers que disparavam do palco e que transformaram o parque da bela vista numa pseudo-rave dos 90’s, animações sincronizadas com os beats e luzes estroboscópicas, os Chemical Brothers devem grande parte da sua energia em palco a uma mistura eufórica de drops intermináveis, breakbeats, linhas de baixo acid distorcidas e industriais – não é fácil categorizar a sua música, nem será possível encaixá-la num destes rótulos.

Os únicos membros da plateia que permanecem estáticos são os mesmos que tentam assimilar todo o aparato que se encontra à sua volta – onde quer que olhássemos, estava sempre a acontecer que nos roubava a atenção. Uma setlist com exatamente vinte canções reuniu êxitos como “Block Rockin’ Beats”, “Go”, “Mah”, “Hey Boy, Hey Girl” e “Under the Influence” tem direito aos conhecidos robôs gigantes em palco, que movem as cabeças e disparam lasers dos olhos – agora sim, impossível desviar a atenção do palco, acabando em êxtase com “Galvanize”. Um concerto que não apostou sem dúvida no minimalismo (como é o caso dos Kraftwerk) mas que provou mais uma vez a potência da música electrónica ao vivo. Vivam os anos 90!

Nascidos há precisamente 20 anos, os Moderat são uma das bandas electrónicas provenientes de Berlim que conquistaram todo o mundo. Filhos de uma electrónica proveniente dos Kraftwerk, faz todo o sentido que os Moderat actuassem no mesmo palco, três horas mais tarde. Embora não tão exibicionistas como os Chemical Brothers, o trio sempre foi conhecido pela potência dos seus concertos sublimes. A setlist reuniu alguns dos maiores sucessos como “Bad Kingdom” e “New Error”, mas grande parte do concerto incidiu no recente álbum “MORE D4TA” – um anagrama do próprio nome da banda – depois de um hiato que durava deste 2017. “Fast Land” é a faixa de abertura do álbum, que soou incrivelmente imersiva com os seus sintetizadores que oscilam na afinação – no palco, os músicos fizeram recurso a controladores MIDI para disparar samples, mas também alguns sintetizadores e o clássico MPC. Não faltaram beats poderosos, melodias que ficam no ouvido e baixos distorcidos que se entranham e vibram no corpo – no entanto, um pouco exagerado pois acabou por roubar espaço para a voz de Apparat brilhar – numa mistura eclética de IDM, trip-hop e industrial. Em palco, umas faixas led que mudavam de cor proporcionavam o decor minimalista perante um recinto meio-cheio do palco COLINA. Foi sobretudo um concerto com boa música, mas após o concerto altamente meticuloso dos Kraftwerk e do concerto intenso dos Chemical Brothers, o espectáculo dos Moderat pareceu a meio-gás. Talvez ainda estejam a aquecer.

De registar o episódio grave e um pouco triste: 2 Many DJs e Tiga estiveram em cena pouco mais de 20 minutos devido e segundo palavras da organização: «a conflitos de som entre os palcos MEO e Colina, fomos obrigados a interromper a atuação dos 2manydjs b2b Tiga. Pedimos desculpa pelo inconveniente e prometemos tê-los na próxima edição.» Algo a rever urgentemente até 2023.