NOS Alive 2023: Red Hot Chili Peppers e a Gloriosa Terceira Vinda do Deus Frusciante
2023-07-06, Nos Alive, LisboaApós uma ausência de seis anos dos palcos portugueses, os Red Hot Chili Peppers encheram o Passeio Marítimo de Algés de “Unlimited Love”. Entre jams instrumentais, sing alongs e uma super lua deslumbrante, o destaque foi mesmo o regresso triunfal desse portento da guitarra que é John Frusciante.
[não foi permitido à Arte Sonora a habitual captação de imagens]
Estávamos em 1991 quando, após a edição do aclamado “Blood Sugar Sex Magik”, John Frusciante anunciou à banda o seu desejo de sair. As razões prendiam-se com o sucesso e com a ascensão dos Red Hot Chili Peppers (RHCP) a estrelas de rock, algo em que John não se revia e com o qual não conseguia conviver. John acabaria por ficar na banda até ao verão de 1992, a sua decisão foi tomada meia hora antes de subir ao palco num concerto no Japão, e menos de um mês antes da banda ser o cabeça de cartaz do festival Lollapalooza. Frusciante decidiu depois focar-se na sua carreira a solo, já os RHCP acabariam por prosseguir a sua carreira na década de 90 com o guitarrista Dave Navarro, até que, em 1998 e já após de Navarro ter sido despedido e de os RHCP estarem à beira do colapso, devido às suas dependências, surgem declarações de Flea a referir que a banda só teria capacidade para continuar se Frusciante regressasse. O convite estava feito e rapidamente os RHCP reuniram-se em estúdio com John para compor e gravar um dos seus melhores álbuns “Californication”. O regresso do guitarrista fez a banda ganhar um novo ímpeto criativo, há semelhança do que já tinha sucedido em 1988 quando entrara pela primeira vez para o projecto. Frusciante continuaria a lançar mais álbuns com os RHCP por mais uma década, até que chegados a 2008, a banda decidiu entrar num hiato, devido à exaustão causada pela extensa tour de promoção a “Stadium Arcade” (2006). Já em 2009, e após este intervalo, voltou a circular a notícia de que Frusciante tinha saído do grupo uma segunda vez. À semelhança do que tinha acontecido em 1992, os RHCP prosseguiram a sua carreira com um novo guitarrista, desta vez com Josh Klinghoffer.
Fast foward para 2019, e sem nada que o fizesse prever, os RHCP anunciaram nas redes sociais que Frusciante estava outra vez de volta para uma terceira incursão. Mais uma vez influenciado por Flea, John procurou demonstrar a si próprio que ainda sabia compor grandes malhas rock e prova disso foi o lançamento de, não um, mas dois álbuns em 2022. Falamos de “Unlimited Love”, editado em Abril e “The Return Of The Dream Canteen”, editado em Outubro.
Ao NOS Alive apenas trouxeram o primeiro, visto que o segundo não teve qualquer representação na setlist. Contudo, foi com um momento arrojado, mas de certa forma aquele que transmite a forma mais pura de praticar rock ‘n’ roll, que a banda entrou em palco. A já famosa “Intro Jam” colocou os três instrumentistas Flea, Chad Smith e John Frusciante a demonstrar todas a sua valências técnicas, como se ainda existisse algo a provar, e transportou-nos até aos saudosos anos 70 quando três indivíduos de seu nome Jimmy Page, John Bonham e John Paul Jones partiam para extensas jams instrumentais que arrebatavam multidões. No NOS Alive, a coisa não foi diferente e a jam acabou por ir desaguar no hino “Can’t Stop”. O público estava automaticamente ganho, Flea com o seu slap bass imaculado, John Frusciante com os seus riffs “afunkalhados” que enfatizam a melodia, Chad Smith com o seu groove natural e Anthony Kiedis com a sua forma tão própria de rappar.
Sem grandes conversetas, mantivemo-nos em “By The Way” (2002) e prosseguimos com “Universally Speaking”, para depois atacar em força “Dani California” de “Stadium Arcade”. O seu refrão foi dos mais entoados da noite, com o solo de Frusciante a passar pelo mesmo tratamento. Nota-se que para os RHCP é como se John nunca tivesse saído da banda, em palco não há qualquer anúncio especial do seu regresso e a interação entre os mesmos não é constrangedora, aliás muito pelo contrário é sim uma interação de extrema cumplicidade e de partilha, afinal de contas foram muitas as malhas que compuseram e gravaram em conjunto ao longo de mais de 30 anos.
“Aquatic Mouth Dance” foi a primeira espreitadela a “Unlimited Love” e resfriou um pouco o ambiente, nota-se que tirando o single principal “Black Summer”, que foi tocado mais à frente, este ainda é um álbum que tem de maturar nos ouvidos dos fãs. Já a enérgica “Suck My Kiss” foi a primeira passagem pelo clássico “Blood Sugar Sex Magik”, o álbum mais antigo a ser revisitado, o que é uma pena porque “Mother’s Milk”, o primeiro álbum com Frusciante e Smith apresenta também elevados pergaminhos e certamente que alguns fãs ficariam satisfeitos por escutar algo mais longínquo. Contudo, esses fãs que procuravam algumas músicas mais rebuscadas certamente que não ficaram desiludidos por ouvir “Soul To Squeeze”, a faixa que foi originalmente gravada em 1991 nas sessões de “Blood Sugar Sex Magik” acabou por ser lançada como um b side e mais tarde como parte da banda sonora do filme “Coneheads”.
A bem esgalhada e curtinha “Right On Time”, com um aceno a “London Calling” dos The Clash, serviu mais como um momento de transição para a fresquinha “These Are the Ways”. E, se há pouco, referimos que o regresso de Frusciante não foi mencionado concretamente, podemos com toda a certeza que essa menção passou subentendida na performance inspiradora da cover “Dreamboy/Dreamgirl”, onde John tomou conta do palco e arrepiou todos aqueles que sabem o quão especial é poder testemunhar ao vivo a união daqueles quatro músicos. Munido da sua Fender Telecaster Custom Sunburst de 1963, John foi alternando ao longo da noite entre este modelo e a sua Stratocaster de 1961, passando também pelas suas mãos uma Stratocaster em Olympic White e uma Fiesta Red e a sua Gretsch White Falcon de 1955. Todas elas encontravam-se conectadas a três stacks Marshall JCM800 2203 100W com colunas 1960B 4×12′. Já Flea usou e abusou do seu Fender Active Jazz Bass com um acabamento metalizado acetinado, o baixo apresenta um pré-amplificador Aguilar OBP-1 18V incorporado. Quanto à sua amplificação Flea teve sempre na sua retaguarda três colunas Ampeg SVT-810E 8×10. As cabeças não estavam à vista, mas tudo indica que sejam Ampeg SVT-VR.
“Tell Me Baby ” trouxe o funk de volta com a sua batida a contratempo no refrão, enquanto “The Heavy Wing” demonstrou ser uma das melhores composições de “Unlimited Love”, afinal de conta tem Frusciante por tudo o que é sitio, no refrão e no solo que carrega de forma harmoniosa distorção, overdrive e fuzz, elementos imprescindíveis do tone de John.
Chegados à reta final do concerto começaram a “chover” os clássicos, um atrás do outro. Primeiro “Californication” precedida por uma intro arrebatadora de Flea e John, com os dois a explorar as diferentes valências sónicas do seu instrumento. Depois com uma cover de “What Is Soul?” dos Funkadelic, uma das maiores influências de Flea, especialmente o seu baixista Billy Bass Nelson. Quanto a “Black Summer”, achamos que já podemos considerar um clássico moderno, a faixa cuja temática diz tanto aos portugueses, pois aborda a problemática dos incêndios no verão, foi cantada a plenos pulmões por todos os presentes, e a sua posição mais adiantada na setlist revela bem esse estatuto. A noite já ia longa, e nem um pequeno percalço nos in ears de Flea foi suficiente para atrapalhar “By The Way”, que, apesar de ter sido recomeçada, fechou o set principal de forma esplendorosa.
Seguiram-se alguns minutos de espera com os cameramen a focarem o público, mas rapidamente os quatro “Funky Monks” regressaram a palco para fechar o concerto em apoteose com “Under The Bridge” e “Give It AWay”.
Mais do que uma celebração do regresso dos Red Hot Chili Peppers a Portugal, esta foi uma noite para celebrar o regresso de John Frusciante à banda e todo o legado que o guitarrista construiu ao lado de Flea, Kiedis e Smith. Será que é desta que Frusciante permanece até à dissolução da banda, não sabemos, mas todos sabemos que o lar é onde está o nosso coração, e o de John Frusciante certamente que está nos Red Hot Chili Peppers.
SETLIST
- Intro Jam
Can’t Stop
Universally Speaking
Dani California
Aquatic Mouth Dance
Suck My Kiss
Sout To Squeeze
Right On Time
These Are The Days
Dreamboy/Dreamgirl (Cynthia & Johnny O Cover)
Tell Me Baby
The Heavy Wing
Californication
What Is Soul? (Funkadelic Cover)
Black Summer
By The Way
Under The Bridge
Give It Away