NOS Primavera Sound: Os melhores do Palco NOS
O palco principal da edição portuense do festival trouxe alguns dos mais grandiosos concertos do Primavera ao Parque da Cidade.
No rescaldo da quinta edição do NOS Primavera Sound, falámos até agora das performances mais dignas tidas no Palco . e no Palco Super Bock, componentes importantes do festival e que proporcionaram algumas das mais interessantes ofertas a contemplar no Parque da Cidade. No entanto, não era para estes que a maioria se teria deslocado ao festival: era, efectivamente, o Palco NOS aquele que trazia os nomes mais sonantes e que, como expectável, mais consistentemente levou ao delírio o público do Primavera. Assinalamos, agora, os concertos que marcaram o maior palco do festival durante os seus três dias.
6. Linda Martini (Lisboa, Portugal)
Assistir a Linda Martini ao vivo não será já novidade para a grande maioria dos portugueses que compareceu ao NOS Primavera Sound, principalmente para quem veio de Lisboa e está habituado às mesmas paragens por onde costuma andar a banda. Mas se a componente de novidade desapareceu por esta altura (salvo a volumosa vaga de estrangeiros que, parecendo que não, compunha grande parte do público do Primavera), a de qualidade não deixa de se fazer sentir. Alternando entre êxitos de carreira (“Amor Combate”, “Juventude Sónica”) e os temas que compõem o recentemente editado “Sirumba”, André, Cláudia, Pedro e Hélio marcaram presença capazes e ameaçadores como sempre, tocando tão alto e vibrante quanto o palco lhes permitia e atraindo uma plateia surpreendentemente fiel para aquelas horas da tarde.
Melhor momento: Poder-se-ia dizer que foi “Cem Metros Sereia”, o encore impromptu autorizado em cima da hora pela organização, que marcou definitivamente o concerto pela positiva, mas na verdade foi o que se lhe seguiu: Hélio Morais, e logo depois Pedro Geraldes, decididos a mostrar o seu amor pelo público que havia comparecido para os apoiar, fazem crowdsurfing bem-humorado e mais à deriva do que propriamente a nadar contra a maré.
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5. Deerhunter (Atlanta, Georgia, E.U.A)
Três anos depois do seu début no NOS Primavera Sound, os Deerhunter retornam ao Parque da Cidade com um set diverso, enérgico e, mais do que se estaria à espera, ambicioso a mãos cheias. Ao vivo, o seu indie rock deixa transparecer mais as influências periféricas que são características à banda, com tons de noise, psicadelismo, art rock e até algum progressismo surgindo por entre as malhas dos temas tão familiares da banda. O principal apelo advém, não obstante, do frontman Bradford Cox, que sem grandes exibicionismos incorpora em palco uma figura forte, carismática e verdadeiramente digna de cabeça de banda. Num concerto animado, abundante em belas performances (respeito pela grande exibição ao saxofone) e que terá certamente agradado aos fãs mais dedicados, Deerhunter despediram-se do Palco NOS como vencedores.
Melhor momento: A melhor executada faixa da performance é, sem dúvida, “Revival”, do aclamado “Halcyon Digest”, eloquentemente desdobrada em texturas psicadélicas e melodicamente expressivas ao marco da segunda canção da setlist.
4. Air (Versalhes, França)
Um dos grupos mais antecipados para este festival, e o primeiro a ser confirmado pelo mesmo, os franceses Air revelaram ser dos poucos actos do Palco NOS que se apreciavam melhor sentado: a sua música era suave, tranquilizante, munida de uma leveza alegre que contrastou bem com muitas das performances mais abrasivas que se tinham observado até àquela noite de sábado (actuavam, aliás, concomitantemente com Drive Like Jehu, uma das derradeiras instâncias dessa vertente do Primavera). Entrar no mesmo comprimento de onda dos Air era viajar por planícies harmoniosas de som, instauradas por músicos que, mais que munidos de um particularmente hábil sentido de orquestração, primavam meticulosamente por um som de qualidade cristalina e impacto emocional indelével. Ao doce sabor do seu space pop, o Primavera Sound foi feliz.
Melhor momento: Muito embora todo o seu set exibisse um nível invejável, foi como quem diz “obrigado” que a dupla francesa se despediu com um par de faixas do seu disco de estreia: à inconfundível “Sexy Boy” seguiu-se “La Femme D’Argent”, para visível deleite da plateia.
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3. Animal Collective (Baltimore, Maryland, E.U.A)
Outra das principais atracções do NOS Primavera Sound, o percurso dos Animal Collective é, por esta altura, tudo menos desconhecido à generalidade do público do festival, e as expectativas estavam altas para a performance de Avey Tare, Panda Bear e Geologist. E embora algumas destas expectativas tenham saído frustradas (foram mais que pontuais as opiniões desfavoráveis em relação ao concerto), o trio esteve longe de se considerar um fracasso. É certo que não foi, por qualquer prisma que se encarasse, um espectáculo para todos: entre texturas indecifráveis, barulhos atonais que roçavam o insuportável e os sprints vocais desafiantes de Panda Bear e Avey Tare, de tudo um pouco teve lugar nas divagações experimentais dos Animal Collective. Mas estas eram, quase sempre, bem sucedidas, já que o trio de agora veteranos moldava como plasticina as peças que usava para construir as suas canções com uma perícia notável – as canções fluiam entre si de tal forma que apenas uma ou duas pausas de silêncio interromperam um concerto que certamente ficará na memória dos que mais se afeiçoam às loucuras destes senhores de ambições e audácia inigualáveis.
Melhor momento: Com muito pesar por algumas canções de “Painting With”, que empalidecerem um pouco no formato live (“FloriDada” e “Golden Gal”, os dois maiores singles, soaram aqui a murchos), há que dar o braço a torcer por “Daily Routine”, a única a surgir do seminal “Merriweather Post Pavillion”. Apesar da escolha para este álbum poder ter sido outra (quem reclamaria de “My Girls”, “In the Flowers” ou um “Brother Sport”?), a execução desta faixa foi infalível, culminando num divinal clímax encabeçado pela potente voz de Noah Lennox.
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2. Brian Wilson (Hawthorne, Califórnia, E.U.A)
Quando se trata de um nome desta magnitude, rodeios tornam-se dispensáveis: foi um verdadeiro privilégio assistir ao concerto de Brian Wilson, membro-fundador e principal motor criativo de um grupo tão prolífero e influente quanto os Beach Boys. Munido de uma impressionante banda de apoio que contava com alguns músicos tão veteranos quanto o próprio, Wilson trouxe ao Parque da Cidade riqueza melódica e diversidade instrumental como até aí não se tinha visto. E mesmo que, aos 73 a caminhar para os 74, fosse mais que aparente que o compositor deixara a sua melhor forma há largos anos (apoiou-se num segundo cantor para lhe compensar os agudos a que não conseguia chegar), pouco importava esse facto quando presenciávamos a derradeira beleza de “Pet Sounds” ganhar vida diante de nossos olhos, plenos 50 anos feitos desde a sua criação. Simpático, encantador e bem-humorado como sempre deu a entender ser, Brian Wilson intercalava as canções dos Beach Boys com pequenas anotações, que muitas vezes não passavam do “This is a very nice song!” – não que isso não bastasse à avolumada multidão que o admirava, boquiaberta. Um espectáculo verdadeiramente sem preço, que muito provavelmente ficará para a história como o último de Brian Wilson no país, e no qual não ficou para trás o artista que, no seu melhor, foi reverenciado por estar à frente do seu tempo.
Melhor momento: Um só momento não chegaria para expressar a beleza deste espectáculo, pelo que salientamos três: a doce leveza de “Don’t Worry Baby” mostrou exactamente o quão deslocado no tempo (no bom sentido, obviamente) o NOS Primavera Sound podia estar, sendo nada menos que comovente a concatenação inter-geracional que a faixa promovia; o interlúdio instrumental “Let’s Go Away For Awhile” ilustrou as mais psicadélicas e vanguardistas inclinações dos Beach Boys, sendo imaculadamente executado ao vivo; e, como não poderia deixar de ser, a intemporal “Wouldn’t It Be Nice” foi a mais bem sucedida em levantar os ânimos de um público que se via rendido a Brian Wilson logo à primeira canção.
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1. Sigur Rós (Reiquiavique, Islândia)
Se havia concerto em torno do qual se havia criado antecipação, era o da mais célebre banda islandesa em actividade, os incomparáveis Sigur Rós. A expectativa era tanta, e os padrões colocados tão alto, que mesmo com a praticamente surreal reputação do grupo quanto a performances ao vivo parecia impossível que o resultado fosse algo que não a decepção. E pelo início do concerto, parecia que era exactamente para lá que caminhávamos, com a mirrada presença de apenas três integrantes e uma abertura aquém do esperado, em que assumiam uma pele de trip hop pouco característica do grupo. No entanto, tão rapidamente emergiram da aparente jaula de onde tinham começado a tocar quanto a sua música foi crescendo, florindo, mostrando as verdadeiras cores de quem não é ícone do post-rock em vão, e cedo tornou-se claro que não haveria performance como aquela até ao fim do festival.
Fechar os olhos durante a performance de Sigur Rós era embarcar numa experiência que se aproximava perigosa e constantemente do transcendental, tão harmoniosas e emotivas eram as notas que se ouviam em consonância perfeita com a imaculada voz de Jónsi Birgisson. Reabri-los, por sua vez, era não só maravilhar-se com o espantoso espectáculo de luzes que montavam, mas também baralhar-se profundamente com a noção de que tão completa obra era concretizada por apenas três seres humanos. Sigur Rós não teve um melhor momento, foram todos eles, e se houve algo de negativo a retirar deste concerto foi a certeza de, ainda no primeiro dia, o NOS Primavera Sound ter dado o melhor que poderia proporcionar.
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