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Trivium e Portugal, Uma Eterna Paixão

Trivium e Portugal, Uma Eterna Paixão

2023-02-04, Sala Tejo, Altice Arena
Rodrigo Baptista
Inês Barrau
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A banda de Matt Heafy voltou a Lisboa para triunfar num concerto onde reinaram os moshpits, sing alongs e as juras de amor para com o público português. Heaven Shall Burn, Obituary e Malevolence acompanharam a banda de Orlando e completaram um cartaz que se apresentou diversificado e multigeracional.

No dia 4 de Julho de 2019 estávamos na Altice Arena, mais precisamente na sala grande, para presenciar o primeiro dia do festival VOA Heavy Rock Festival. Nesse dia os Trivium foram a quarta banda (de seis) a subir ao palco, e demonstraram que grande parte do público estava ali para os ver. A razão era simples, e prendia-se com uma possível colaboração no concerto entre a banda e o cantor português Toy, algo que até há alguns meses antes desse concerto seria extremamente improvável. Contudo, a internet tem destas coisas, e foi então numa sessão de streaming para a plataforma Twitch que Matt Heafy foi desafiado por um fã português a fazer uma cover do tema “O Coração Não Tem Idade” de Toy. A versão acabaria por chegar aos ouvidos do cantor português que não só agradeceu, como também retribuiu o feito ao apresentar uma cover do tema dos Trivium “Until The World Goes Cold”. O impensável estava feito e agora já só faltava a cereja no topo do bolo, ou seja a participação de Toy no concerto dos Trivium. Para gáudio de muitos a colaboração aconteceu mesmo no palco da Altice Arena, e representa até hoje um dos momentos mais marcantes não só da história do heavy metal em Portugal como também da história dos Trivium. Este sábado Matt Heafy e Co. repetiram a gracinha e demonstraram que Portugal representa muito mais do que apenas mais uma data no calendário da sua tour. Mas já lá vamos…

O Crossover Perfeito

Os Malevolence foram a primeira banda a subir ao palco. O grupo de Sheffield já não se apresentava em Portugal desde 2018, quando atuaram no Pavilhão Municipal de Exposições, na Moita. Na bagagem trouxeram o seu mais recente álbum intitulado “Malicious Intent” (2022), que explora mais uma vez o seu hibridismo sonoro carregado de hardcore punk, metalcore, beatdown hardcore e sludge metal. Com uma atuação curta, a rondar os 30 min, os britânicos conseguiram cativar os poucos que estavam presentes na sala, principalmente todos aqueles que fazem parte da subcultura hardcore e que se encontravam aqui algo deslocados do seu habitat natural. Temas como “Self Supremacy”, “Keep Your Distance” ou “On Broken Class” ecoaram de forma demolidora e certamente atraíram novos fãs para uma banda que ainda se encontra em ascensão.

O Som da Florida   

A suceder aos Malevolence estiveram os Obituary, uma banda que, ao contrário da primeira, já não tem nada a provar. Nome incontornável do death metal da Florida juntamente com nomes como Morbid Angel e Deicide, os Obituary continuam a atrair uma falange de fãs extremamente leal ao género que praticam e isso foi bem visível na quantidade de metaleiros da velha guarda que se deslocaram até à Sala Tejo. Contudo, não podemos deixar de reparar que cada vez mais estas bandas históricas têm vindo a aparecer nos cartazes em posições terciárias, o que acaba por limitar e muito o seu tempo de atuação, vejamos por exemplo o que aconteceu com os Carcass há uns meses no Coliseu dos Recreios. Neste caso a curta duração em nada afetou a qualidade da atuação da banda de Tampa que durante cerca de 45 minutos revisitou um pouco de toda a sua discografia, com destaque para os mais recentes “Dying Of Everything” (2023), de onde se ouviu a faixa título e “The Wrong Time”, e “Obituary” (2017) de onde foram retirados os temas “A Lesson In Vengeance” e “Sentence Day”. Estranhamente não se ouviu qualquer faixa dos clássicos “Slowly We Rot” (1988) e “Cause Of Death” (1990). Mas o grande destaque vai mesmo para o vocalista John Tardy, uma lenda viva do death metal, que, do alto dos 54 anos continua a dominar o palco com os seus growls cavernosos. Para muitos ele é a personificação do death metal mais puro e primitivo e Lisboa pôde testemunhá-lo mais uma vez.

O Caos Antes da Tempestade

Quando esta tour foi anunciada muitos pensavam que iria decorrer em regime co-headline, ou seja, tanto os Trivium como os Heaven Shall Burn (HSB) seriam os protagonistas, sendo que cada banda fecharia os concertos de forma alternada. No entanto, e apesar das décadas de experiência dos HSB, todos reconhecemos que hoje em dia os Trivium se apresentam num patamar acima e coube então à banda de Orlando o fecho de todas as datas da tour. Ao fim e ao cabo os HSB foram uma espécie de convidados especiais dos Trivium, e por isso tiveram direito a uma atuação generosa de 1h:15min.

Muito mais entrosados neste cartaz, isto se recordarmos que na última vez que os HSB estiveram em Portugal apresentaram-se num cartaz que não era necessariamente o seu ao encontrarem-se ensanduichados entre os Korn e os Hellyeah, desta vez a banda de Marcus Bischoff conseguiu impor-se e demonstrar porque razão são um dos grupos mais respeitados da música extrema germânica.  Temas como “Voice of the Voiceless”, “Hunters Will Be Hunted”, “Behind a Wall of Silence” ou ” Endzeit” foram entoados por muitos fãs, e com o caos lançado Marcus “apenas” limitava-se a advertir para que o público se protege-se um aos outros, de forma a evitar lesões graves, algo que acabaria por acontecer a um crowdsurfer que ao cair mal acabou por partir o braço. Com um set extremamente sólido destacamos particularmente a troca de riffs e de solos entre os guitarristas Alexander Dietz e Maik Weichert, este último que deliciou os presentes com a sua vistosa Ibanez Destroyer “Pit Viper”, que com um acabamento verde víbora faz precisamente jus ao seu nome.

A Tocar (Quase) em Casa

Desde que os Trivium se estrearam em Portugal, em 2012, com um concerto no mítico Paradise Garage, temos vindo a assistir a um desenvolvimento exponencial não só da sua massa associativa (aka fans), mas também de uma certa interligação entre Portugal e a banda, algo que foi potenciada ao máximo no seu concerto de 2019, onde Matt Heafy se dirigiu ao público quase exclusivamente em português durante todo o espetáculo e a banda protagonizou o momento único já acima citado. Agora em 2023 trouxeram a Portugal a sua maior produção até à data, numa tour que pretende invocar as temáticas abordadas no último trabalho ” In The Court Of The Dagon” (2021) , mas também em “What The Dead Men Say” (2020), que por questões pandémicas também ainda não tinha sido apresentado em Portugal. O que é certo é que o catálogo dos Trivium já é extenso e torna-se cada vez mais difícil apresentar uma setlist que agrade a gregos e a troinanos. Nesse aspeto a banda esteve bastante bem com os citados a disporem apenas de três lugares numa setlist que tem vindo a apresentar-se como rotativa.

Foi com “Rain”, do clássico “Ascendancy” (2005) que o concerto teve inicio após cair um pano que desvendou toda a cenografia que para além dos motivos inspirados na história japonesa continha também dragões a flanquear o palco. Após o primeiro « Boa Noite Lisboa» o público já se encontrava completamente entregue ao magnetismo de Heafy, mas foi já em “Strife”, que Matt Heafy ao tirar o casaco e ao exibir uma camisola da seleção portuguesa levou os fãs ao completo delírio. Entre as fulgurosas “A Gunshot To The Head Of Trepidation” e “Feast of Fire” continuavam as dedicatórias de amor, « eu amo Portugal!», exclamava o frontman, em bom português, completamente extasiado. Já durante “Betrayer” veio ao de cima a parte mais humanista de Heafy. A música teve que ser interrompida devido a um crowdsurfer que caiu desamparado no fosso, e o que aconteceu de seguida foi de uma nobreza profunda.  A banda esperou, as coisas recompuseram-se, o público aplaudiu e a música recomeçou exatamente na secção onde tinha sido interrompida.

Mas o momento mais esperado do concerto era certamente o possível regresso do cantor Toy para repetir a dose de 2019. Contudo, e devido a conflitos de localização geográfica, Toy não pôde comparecer, algo que não impediu os Trivium de recordar esse momento único. Para tornar o momento ainda mais icónico, Matt Heafy voltou a trocar de indumentária para desta vez revelar uma camisola que continha a cara estampada do cantor português. Entre risos e aplausos, partiram para a sua versão pimba metal de “O Coração Não Tem Idade” seguindo-se “Until The World Goes Cold”, tal como acontecera em 2019. Por esta altura, já estávamos a entrar na reta final do concerto. ” The Heart From Your Hate”, “In Waves” com a participação do guitarrista Alex Dietz dos Heaven Shall Burn e ” Pull Harder On The Strings Of Your Martyr” foram as escolhidas para encerrar uma noite que mais pareceu um regresso a casa de uma banda que aparenta saber muito bem qual o significado da palavra saudade.

SETLIST

  • Rain
    Among The Shadows & The Stones
    Strife
    A Gunshot To The Head Of Trepidation
    Feast Of Fire
    Betrayer
    Throes Of Perdition
    In The Court Of The Dragon
    Coração Não Tem Idade ( Vou Beijar) (Toy Cover)
    Until The World Goes Cold
    To The Rats
    The Heart From Your Hate
    In Waves
    Pull Harder On The Strings Of Your Martyr