Vodafone Mexefest | DIA 1
2013-11-29, Avenida da LiberdadeEra claro que Wavves e Woodkid iam ser uma cena! Bombay Show Pig destilaram energia.
Há coisas que simplesmente nunca mudam e, da mesma forma que o “desenrasque português” é uma característica extraordinária que não se encontra em mais parte nenhuma do mundo, já a pontualidade, não é, de todo, o nosso forte. Como tal, não é de estranhar que a partir das 20H, hora marcada para os primeiros concertos da 6ª edição do Vodafone Mexefest em Lisboa, a fila para a troca de pulseiras nas bilheteiras do São Jorge ainda passasse, e muito, para lá da entrada da Cervejaria Ribadouro.
Enquanto uns esperavam, e outros desesperavam, o posto da Vodafone FM estrategicamente colocado junto à entrada, fazia-nos o favor de transmitir em directo o concerto dos Juba. Os portugueses que recentemente lançaram o álbum de estreia Mynah, cortavam mais que o frio com um rock rasgadinho e atrevido, o que, a julgar por uns, e por outros, que destemidamente lá se arriscaram a dar os primeiros toques de cabeça na fileira, deixara a impressão de que a Sala Montepio possivelmente não estaria lotada mas, certamente, estaria bem entregue e animada, pelo menos, em comparação ao provável aborrecimento que se passaria ali mesmo ao lado.
Longe da lotação máxima, estava também o Ateneu Comercial quando os Bombay Show Pig subiram ao palco para uma actuação entusiasmante. Meia casa, até praticamente a meio do alinhamento, deu todo o significado à expressão – “poucos, mas bons” – e não esmoreceu a dupla belga que descarregou energia e simpatia por todos os cantos de uma sala acusticamente miserável. Os sucessivos ecos, e a pouca nitidez cada vez que Mathias Janmatt e Linda Van Leeuwen faziam o gosto à voz, foram uma constante que nem o aumento gradual de público conseguiu disfarçar. No entanto, o que poderia ter sido um mal maior, a interligação consistente e precisa entre garage e pop rock de canções como “Timewaster”, resolveu sem problemas com a combinação deriffs dos que ficam no ouvido e pratos dos que deixam zumbido, pois, se ainda restavam dúvidas de que para fazer barulho não são precisos muitos, os Bombay Show Pig deram o exemplo.
Exemplar esteve também a adesão do público ao Coliseu dos Recreios (um óptimo update desta edição) para um dos nomes mais sonantes deste primeiro dia de festival, diga-se Savages. As londrinas que ainda há bem pouco tempo passearam pelo Norte do país, mais propriamente pelo Primavera Sound no Porto, vestiram-se novamente de negro e desfilaram o aclamado álbum de estreia, Silence Yourself. Porém, da mesma forma que uns, e outros, passam sucessivamente despercebidos, para não dizer esquecidos, por quem de direito (público e imprensa) pode, no mínimo, dar a conhecer. As Savages devem fazer parte daquela “obra e graça” que acolhe as “next big things”, já que, salvo pouco mais do que vontade e competência, estas quatro senhoras parecem ser muita provocação e pouca bulha. No entanto, modas e modinhas à parte, esta presença demarcou-se pela respeitável dedicação e empenho em palco, especialmente no carisma e magnitude vocal de Jehnny Beth que, para além, de possuir o instrumento de maior destaque de todo um revivalismo post-punk, conseguiu, da intempestiva “No Face”, à efervescente “Hit Me”, liderar veemente uma plateia em boa comunhão.
De volta ao Ateneu, quem já aguardava de forma impaciente e expectante pela entrada dos Wavves, era um pavilhão desportivo praticamente cheio, onde não faltavam cigarros, fumo e cerveja . Os californianos que emAffraid Of Heights juntaram-se a um conjunto de lançamentos que fazem de 2013, um ano de valorização e revalidação do rock “made in” finais de 80, inícios de 90. Fizeram as delicias de todos aqueles que procuravam a tiragem sonora mais directa, simples e eficaz do primeiro dia de Festival. Ao mesmo tempo que a guitarra ritmo de Alex Gates, no arranque, teimara em não querer funcionar, Nathan Williams ouve a primeira ovação da noite quando vira uns “goles” numa garrafa de tinto pelo gargalo. Volta a acústica deficiente que anteriormente prejudicara os Bombay Show Pig, porém, desta feita, a dinâmica, irreverência e urgência de canções como “King Of The Beach”, “Affraid Of Heights” e a irrepreensível “Demon To Lean On”, unem melodias, coros, saltos e algumas molhadas, no que será o mais aproximado do verdadeiro “teen spirit” vinte e poucos anos depois. Soberbo!
E, por falar nisso, soberbo estaria um Coliseu dos Recreios a rebentar pelas costuras para receber Woodkid. O músico francês que passou pela primeira vez por Portugal, para apresentar o seu deslumbrante álbum de estreia, Golden Age. Muito antes de chegar ao microfone para soltar os primeiros versos de “Baltimore’s Fireflies”, já tinha como garantido o concerto da noite. Com uma construção cénica tão requintada e teatral quanto a sua música, Woodkid, ou se preferirem, Yoanne Lemoine, teve na harmoniosa voz, a essência que fez funcionar de forma sublime todas as passagens entre o romance e o drama de um espectáculo que misturou construções visuais e orquestrações musicais de belo efeito. À intensidade de toda uma actuação que contou com a carga e encanto de “Conquest Of Spaces”, “Iron”, “Boat Song”, ou, a brilhante “I Love You”, a imensidão de público correspondeu com palmas, refrões, abraços e sorrisos que, não só, acompanharam categoricamente um Woodkid rendido à receptividade e entusiasmo de um sem número de pessoas em polvorosa, assim como, deixaram saudades e promessas de um regresso para breve.