Do Século XIX às Ibanez Universe, A Ascensão das Guitarras de 7 Cordas
Qualquer guitarrista saberá, melhor ou pior, que os primeiros modelos de guitarras de 7 cordas, implementados em massa no mercado, foram as Ibanez UV7. Mas a guitarra desenhada para Steve Vai explorar em 1990, na sua obra-prima “Passion And Warfare”, e que os Korn tornaram numa besta de peso e groove, tem uma longa história atrás de si – uma história de mais de dois séculos.
Até cerca de 1800, os cordofones mantinham as cordas “duplicadas”, afinadas em uníssono. Porque o uso das cordas de tripa, com menos projecção, assim obrigava, para maior ressonância. Então, com a maior projecção do metal, os luthiers passaram a experimentar novos designs, com cordas “singulares”.
Em resumo, por esta altura a guitarra ficou estabelecida enquanto instrumento de seis cordas, mas as novas possibilidades trouxeram o desejo de experimentar designs diferentes. E embora a guitarra de sete cordas não tenha tido um papel de especial relevância na composição, alguns músicos usavam o instrumento.
Aliás, no final do século XIX as sete cordas eram bastante populares na Rússia, onde foi mesmo desenvolvida toda uma técnica e um instrumento específico. Com algumas excepções, especialmente a Guitarra Sétima (instrumento mexicano de sete cordas duplas) ou a Guitarra Brasileira, o “violão”, de sete cordas usada no samba, as seis cordas dominaram o globo e, quando surgiu a transição para as semi-hollow e a electricidade, o mais lógico era manter o formato.
Os primeiros modelos eléctricos de sete cordas eram hollow-body ou semi-hollow, em archtop. Como estes modelos possuem uma caixa de ressonância central ou um bloco central de madeira a dividir as câmaras de ressonância, o seu som assentava que nem uma luva na tradição jazz, aquele som “escuro” de madeira com muita respiração.
O problema era a sua propensão, também devido à sua construção, para o feedback em volumes mais exagerados. Talvez por isso, as sete cordas tenham tido que esperar pela emancipação tecnológica para entrar no mundo do rock.
GEORGE VAN EPS & LENNY BREAU
No final dos anos 60, o pioneiro guitarrista George Van Eps desenvolveu um modelo de assinatura com a Gretsch. Aliás, a Gretsch Van Eps terá sido a primeira guitarra eléctrica a ter uma produção regular. Aquele que é conhecido como o “Pai da Guitarra de Sete Cordas”, tornou-se famoso pela forma como, com uma Epiphone personalizada no final dos anos 30, desenvolveu o corpo harmónico da guitarra, criando simultaneamente linhas de baixo sofisticadas no seu fraseado – o músico afinava a 7ª corda em A (Lá).
Van Eps foi um prolífico músico de sessão e gravou também vários trabalhos como condutor, além de ter publicado vários livros, incluindo três volumes dedicados ao corpo harmónico da guitarra, sobre a sua intrigante técnica. O seu trabalho foi tão influente que levou vários outros guitarristas reputados a pegar nas sete cordas, Bucky Pizzarelli aprendeu a tocar as sete cordas com Van Eps e, posteriormente, transferiu essa paixão ao seu filho, John Pizzarelli.
Já Lenny Breau inverteu o sentido da corda suplementar, em vez de usar uma corda mais grave, inovou ao aplicar uma a seguir ao E (Mi) agudo – para se perceber o pioneirismo basta dizer que, na altura (anos 70) não eram fabricadas cordas com um calibre de tanta tensão, e Breau usava uma linha de pesca! Além disso, acrescentar o A agudo, permitia usar a nota nas escalas e nos acordes, em vez de usar a nota como uma linha de baixo. Mais difícil, teoricamente, mas capaz de abrir muito mais possibilidades…
O trágico final de vida de Lenny Breau, em 1984, foi antecedido pelo seu maior feito na história do desenvolvimento da guitarra eléctrica. Na NAMM de 1983, Breau e o luthier Kirk Sand apresentaram um protótipo de uma solid body, em mogno, com a corda A aguda. Para impedir que a corda partisse com frequência, devido à extrema tensão, o par decidiu encurtar a escala para as 22.75”.
«A guitarra possuía um formato clássico, ao qual dei um cutaway bastante profundo. O Lenny queria que fosse pesada, foi feita em mogno sólido e pesava uma tonelada. Ele queria muito sustain – isso era uma grande parte do seu som. Fazia os seus harmónicos característicos e deixava-os soar como sinos. Os pickups era uns Seymour Duncan custom. Não havia pickups para 7 cordas nessa altura. O espaço entre cordas era igual ao de uma guitarra clássica e os pickups foram feitos para que os pólos estivessem directamente debaixo de cada corda», afirma Kirk Sand e confessa que Lenny Breau «queria os potenciómetros que rodam como os da Jazzmaster. Na verdade, usei mesmo os controlos da Jazzmaster. O Lenny manipulava-os para a frente e para trás para conseguir um efeito tremolo».
Não convenceu na altura e, depois de a Fender arriscar uns protótipos nunca comercializados em 1987, só em 1990 os modelos solid body vieram para ficar (embora não de vez). A ideia de Breau enraizou-se no pensamento de Steve Vai e o guitarrista trabalhou com a Ibanez na UV7.
Com a escala ainda mais reduzida, para umas 25.5”, Steve Vai começou a testar protótipos nas digressões que fez com os Whitesnake, quando a guitarra estabilizou, o virtuoso gravou a sua obra-prima, “Passion And Warfare”, com os modelos. A Ibanez UV7 tornou-se a primeira solid body a ser produzida em série.
STEVE VAI & NU METAL
As Universe, fabricadas entre 1990 e 1994, surgiam na sua maioria com corpo basswood, pickups DiMarzio Blaze II e double locking tremolo – os modelos de primeiro ano possuíam o Edge 7 e nos anos seguintes passaram a ter o Lo Pro Edge 7. Talvez pela dificuldade técnica de usar um “acréscimo” de progressão harmónica, nas escalas e acordes, talvez pela formatação mental de décadas com as seis cordas, as UV7 nunca foram um sucesso de vendas e por isso a produção parou em 1994, tendo regressado em 1996 e sido posteriormente substituídas pelas UV7S.
A afirmação definitiva dos modelos de sete cordas só aconteceu quando a ascensão dos Korn atingiu o zénite, com James “Munky” Shaffer e Brian “Head” Welch a assumirem na Universe, tal como Van Eps décadas antes, a 7ª corda como a corda mais grave. Em 2001, a Ibanez arrasava a NAMM com as K7.
As K7 surgiram com dois acabamentos, Firespeak Blue (o modelo de “Munky”) e Blade Gray (o modelo de “Head”), e com a afinação dos Korn [A, D, G, C, F, A, D]. O corpo esculpido em mogno possuía a característica metalizada do som da banda, com muita definição nos graves. Apesar de os guitarristas terem usado, originalmente, as UV7, estas guitarras de assinatura eram, basicamente, modelos RG.
Os pickups eram DiMarzio PAF 7. O braço eram uma mistura de 5 folhas de maple e bubinga, os modelos do último ano de produção (2006) usavam wenge no lugar de bubinga. A escala era rosewood e, no meio dos 24 trastos, ostentava o símbolo “K-7”.
O peso de usar um B grave ou mesmo um Drop A, tornou-se uma tendência cada vez maior, havia chegado a era da new wave of metal. Aqueles que procuravam menorizar este novo som, com o famoso pejorativo “nu metal”, viram colossos do death metal como Trey Azagthoth [Morbid Angel] pegar também nas Universe. As guitarras falharam nas vendas, mas o legado estava criado.
A Ibanez reformulou os modelos de sete cordas na série Universe e também RG, marcas como a Jackson, ESP, Schecter, etc., juntaram-se à demanda.O final dos anos noventa trouxe a multiplicação dos modelos de sete cordas. Os paradigmas alteraram-se e, actualmente, já há bestas de 8 cordas…
Faltam duas para se chegar ao Chapman Stick!