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ENTREVISTA Wolf Alice: Theo Ellis, Lisboa, Brexit, Gear e Muito Rock

ENTREVISTA Wolf Alice: Theo Ellis, Lisboa, Brexit, Gear e Muito Rock

Miguel Grazina Barros

A pouco tempo do concerto remarcado no Coliseu dos Recreios, trocámos palavras sobre Lisboa, inspiração, instrumentos e digressões canceladas com o baixista Theo Ellis, membro dos Wolf Alice.

Os Wolf Alice são uma das bandas inglesas mais importantes e prolíficas no circuito do Rock dos últimos tempos. Com três EP’s e três álbuns a completar a sua discografia, o recente álbum lançado em 2021 “Blue Weekend” confirmou o seu estatuto e relevância perante a crítica. Em 2022 deram uma nova roupa ao álbum, ao transformar as suas faixas em “canções de embalar” com “Blue Lullaby”.  Enquanto completam a sua tour de 2022 relativa a “Blue Weekend”, entrevistámos Theo Ellis, baixista e membro fulcral dos Wolf Alice que respondeu remotamente às nossas questões a partir da cidade de Boise, no Idaho. Os bilhetes para o concerto no Coliseu dos Recreios a 31 de Outubro estão à venda aqui por 28€.

A última vez que estiveram em Portugal foi em Julho, a abrir o concerto do Harry Styles. Quão diferente foi esse concerto do concerto que irão tocar no Coliseu dia 31 de Outubro?
Bem, não estarão tantas pessoas presentes como estiveram para o Harry Styles [risos]. Em termos da nossa performance, estamos bastante empenhados em favorecer a mesma experiência a toda a gente, usualmente muita energia e queremos que todos se divirtam e tenham uma experiência inspiradora partilhada. Será também muito mais longo, nós tocámos durante 1h e 15 minutos e agora vamos conseguir tocar canções de cada álbum. Vai ser divertido, além de ser Halloween! Temos uma canção chamada “Lisbon” que temos obrigatoriamente de tocar.

AS: Temos uma pergunta exatamente sobre essa canção. Apesar de se chamar “Lisbon”, é uma canção sobre o livro “The Virgin Suicides”, não é sobre Lisboa, Portugal.
A Ellie e o Joff trabalharam bastante tempo nessa canção, mas não tem necessariamente a ver com a cidade de Lisboa, apesar de termos uma óptima relação com Lisboa. Visitei a cidade com o nosso baterista, Joel, quando tinha 17 ou 18 anos e passámos um tempo incrível, diverti-me tanto. Tenho tantas memórias, a minha namorada visitou-me em Portugal e apaixonou-se pela cidade, quero voltar na altura do Natal – aliás, durante essa tour, Lisboa foi um dos sítios onde passámos mais tempo e todos achamos que é um sítio fantástico. Tem uma óptima “cena criativa”.

AS: Vão ter algum tempo para desfrutar da cidade desta vez?
Ainda não sei, não vi o calendário mas conseguimos sempre arranjar tempo para nos divertirmos. 

AS: Costumam escrever canções enquanto estão em digressão, e se sim, como é que as diferentes cidades afectam o processo criativo?
De momento tenho estado a escrever algumas canções durante a tour, porque estamos em digressão há bastante tempo. Não acho que é a altura mais fácil para acabar músicas, mas acho que estar num ambiente diferente, com pessoas diferentes, ter novas experiências todos os dias pode ser bastante inspirador. A maneira como te sentes naquele dia… Quando acordas no mesmo sítio todos os dias, as tuas emoções podem variar um pouco diariamente, mas quando acordo e estou a ter um mau dia, mas estou por exemplo em Oregon, que é lindo, dá-me uma nova experiência. Pessoalmente tenho adorado sentir-me inspirado para compor em cidades diferentes. Embora não seja fácil escrever músicas durante uma tour, porque tens de cumprir um horário, tens soundchecks, tens de ser saudável e essas m***** todas. Mas é muito inspirador e somos muito sortudos por poder fazer isto.

AS: Que tipo de baixo usas para gravar em estúdio, e que tipo de baixo usas para tocar ao vivo?
Uso dois baixos de momento – um deles tem um corpo de um Fender Precision Bass de 1977, com um braço em rosewood de um Fender JazzBass de 1973. Originalmente era um Fender Precision Bass de 77, original, com um acabamento terrível quando o comprei por aproximadamente 1000 libras, mas adorava-o porque tinha um aspecto maluco, mas não tocava muito com ele – até um tipo chamado Adi Vines – que tinha uma banda chamada Swervedriver da altura dos My Bloody Valentine, o shoegaze dos anos 90 – chegar a um ensaio e insistir que eu tocasse com esse baixo. Ele pegou num braço do seu JazzBass dos anos 70 e meteu-o no meu baixo e eu adorei. Nunca gostei de baixos muito “barulhentos”, mas toco numa banda semi-rock portanto preciso de um instrumento que tenha algum impacto mas que também consiga fazer a parte dos graves mais pesada. Quando estávamos a fazer o “Blue Weekend”, usei cordas flatwound em tudo o que toquei. Normalmente usas flatwounds para aquele som vintage dos anos 60, mas também funciona muito bem com um pedal de drive. Para a “Smile”, do novo álbum, uso flatwounds, porque o verso é groovy e o refrão tem distorção, mas não é um tipo de distorção barulhenta. O Carl Griffin, que é o meu técnico fantástico e do Joel, meteu-me essas cordas e duraram seis meses a tocar ao vivo. Esse é o meu baixo principal – um Fender Precision com um braço JazzBass, com flatwounds – adoro-o mesmo.

O outro baixo que uso é um Guild Starfire de 1963 que comprei numa loja chamada KillerVintage em St. Louis, provavelmente há cinco anos. É lindíssimo. Quando fizemos o “Visions Of A Life”, trabalhámos com, provavelmente, o melhor baixista do mundo, que produziu o álbum – Justin Meldal-Johnsen – que já trabalhou com os Nine Inch Nails, Beck, M83, Paramore, e é um músico incrível. Está a tocar com a St. Vincent de momento. É sem dúvida uma das minhas pessoas preferidas entre músicos e produtores. Ele tem um baixo de assinatura Fender Mustang azul que usei para gravar o álbum. Portanto encontrei este Starfire que se encontra mais ou menos entre um Hofner Club e um Fender Mustang, sonicamente.

Acho que no caso de um baixo, tens de ter duas coisas principais – um bom som limpo (clean) e um bom som com drive.

AS: No vosso álbum mais recente “Blue Weekend”, reparei que usas bastante overdrive. Que pedais usas na tua pedalboard para esse tipo de som?
Passei por tantas fazes em que tinha demasiadas coisas na minha chain. Acho que no caso de um baixo, tens de ter duas coisas principais – um bom som limpo (clean) e um bom som com drive. Um baixo com distorção é sempre difícil, porque normalmente remove as frequências graves. O Justin, que trabalhou connosco no “Visions of a Life” e no “Blue Weekend” ofereceu-me no meu aniversário um BB Bass Preamp, que permite usar drive até onde quiseres, em conjunto com um compressor da Empress e a equalização no “Blue Weekend” foi toda feita através da mesa de mistura do estúdio. Uso o BB Bass Preamp em palco e em todo o lado, punha-o nas torradas se conseguisse [risos]. E depois uso um Fender Super Bassman, que acho incrível.

AS: Pensei que usavas um pedal de Fuzz, ou algo parecido.
É apenas uma quantidade diferente de distorção, um som de díodos diferente. O Fuzz retira demasiado as frequências graves. 

AS: Quando estás a gravar uma canção em estúdio, pensas logo como irás replicar esse som ao vivo? Isso impede-te de gravar uma canção de uma maneira específica, por não conseguires recriar isso ao vivo?
Pensamos nisso definitivamente, mas às tantas dizes “Que se f***, vamos ver o que acontece” [risos] E depois quando te apercebes, precisas de mais cinco pessoas extra para recriar o som do álbum ao vivo. Mas enfim, é tão divertido gravar em estúdio que não faz sentido fugir ao som que queres. Vamos até ao fundo.

AS: Viajam com muito equipamento?
Sim! Não meu especificamente, mas temos muito equipamento. Não conseguiria listá-lo todo. [risos]

AS: Os Animal Collective, por exemplo, foram obrigados a cancelar a digressão devido aos preços de transporte, desvalorização da moeda, inflação no geral e um sistema económico que não é sustentável. Achas que isso vai começar a acontecer cada vez mais?
Já aconteceu. Parece que globalmente a inflação é um enorme problema – depois do vírus da Covid-19 ainda estamos a tentar perceber como navegar. A nossa relação com a Europa é terrível em termos de transporte. Desde o Brexit que temos muito pouco apoio para artistas para fazer digressões pela Europa. Portanto não há uma infraestrutura para apoiar os pequenos artistas, e sinceramente apenas uma pequena percentagem conseguirá fazer digressões sem perder dinheiro. Se vais tocar concertos para um público, vais perder qualquer coisa, mesmo que não seja físico. Se essa perda é tanta que te irá levar à bancarrota, não podes fazer digressões não é? O que estamos a testemunhar no mundo da música é o reflexo de uma crise económica mundial, o problema do custo de vida especialmente em certos países, além de uma crise de energia. Há mais pessoas em Inglaterra a necessitar de apoios como bancos alimentares do que alguma vez houve, o que é de loucos num país de primeiro mundo. Sim, as bandas não conseguirão dar concertos, mas ao mesmo tempo há pessoas que não conseguirão comer. É um tempo difícil. Sem algum tipo de intervenção ou legislação, ou ajuda de entidades poderosas, artistas novos, bandas pequenas ou pessoas que aspiram a digressões irão perder uma experiência muito importante em termos de viajar e tocar para um público diferente. É um problema burocrático devido a decisões estúpidas feitas pelo governo. É trágico.

AS: Sendo uma banda de rock, consideras difícil manter a relevância no panorama actual da música? Estará o Rock, de facto, a morrer?
Acho que o Rock estar a morrer é um cliché jornalístico. Não sei bem o que define  o Rock n’ Roll. As tabelas parecem estar a ser dominadas por música Rap, que na sua essência e espírito é Rock n’ Roll. Não há uma abundância de bandas Rock, mas é tudo um ciclo. Não têm surgido muitas bandas recentemente, mas há muita gente a fazer música individualmente, por termos estado separados durante dois anos. Há muito conteúdo no TikTok, Youtube mas as bandas nunca irão desaparecer. Existem muitos bons álbuns lançados ou prestes a serem lançados, como por exemplo os Fontaines D.C., que são uma das bandas mais excitantes hoje em dia. Estou muito ansioso pelo novo disco dos Arctic Monkeys, dos The 1975 e até o Harry Styles, cuja performance é bastante Rock n’ Roll de certa maneira. Uma banda que está em digressão internacionalmente, Amyl and the Sniffers, são para mim uma banda de Rock como deve ser – sem querer parecer reductivo, porque existem muitas mais. Existem bastantes coisas, se procurarem.