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Not Impossible Labs: Coletes sensoriais permitem surdos desfrutar de um concerto ao vivo

Not Impossible Labs: Coletes sensoriais permitem surdos desfrutar de um concerto ao vivo

Rodrigo Baptista

O intuito desta criação tecnológica é tornar o acesso à audição musical, e particularmente aos concertos, mais inclusivo.

Um nova tecnologia assente num colete sensorial está a ajudar pessoas surdas e com deficiência auditiva a experienciarem música ao vivo.

A tecnologia Vibrotextile, desenvolvida pela Not Impossible Labs, permite ao utilizador sentir a música ao vivo ou pré-gravada através de 24 pontos de toque vibratórios presentes no colete. Os coletes são «uma experiência totalmente acessível para pessoas de todos os níveis de audição», disse Daniel Belquer, CVO (Chief Vibrational Officer) da Music: Not Impossible, à Classic FM.

Cada colete inclui 24 pontos de toque separados, o que significa que ao todo podem ser transmitidos 24 instrumentos para cada colete. Isso permite que até grandes partituras orquestrais sejam traduzidas em vibrações para o colete.

Segundo Belquer este projeto tem vindo a ser desenvolvido há mais de uma década e já foi utilizado com sucesso em concertos no Reino Unido, EUA, Brasil, Japão e Austrália

Em Portugal esta tecnologia foi testada pela primeira vez num dos concertos que os DZR’T deram na Altice Arena, em Maio de 2023. A iniciativa fez parte do programa de acessibilidade da sala desenvolvido em parceria com a Access Lab.

Segundo vários estudos que foram realizados ao longo dos anos podemos hoje em dia afirmar que a música não se apresenta apenas e só como uma experiência auditiva, isto porque também pode ser percecionada através do toque. As vibrações sentidas no nosso corpo como uma consequência do volume e da frequência sonora também nos permitem captar o som e é neste contexto que se torna assim possível que pessoas surdas ou com problemas auditivos possam também desfrutar de uma audição musical.

A tecnologia dos coletes pode ser algo recente, mas é curioso que no princípio do séc. XIX Beethoven já tinha criado a sua própria tecnologia para compor música através das vibrações. Com recurso a um lápis, onde uma das pontas era colocada na sua boca e a outra estava em contacto com a caixa de ressonância do piano, Beethoven conseguia captar as vibrações de forma a perceber o que estava a tocar no instrumento.

Hoje em dia já é possível traduzir imediatamente instrumentos musicais em vibrações, que são então distribuídas para os corpos do público através dos chamados “coletes hápticos”. O “VibroDJ” encarrega-se depois de distribuir os diferentes instrumentos pelos 24 pontos de vibração, consoante as frequências sonoras dos instrumentos e as partes do corpo que melhor respondem as essas mesmas frequências. O colete pode produzir até 3.900 frequências diferentes em cinco oitavas de microtons (entre Sol1 e Sol6).

Os coletes sensoriais são extremamente práticos e não precisam de muitos recurso para serem funcionais. Belquer explicou à Classic FM que a única configuração necessária para esta tecnologia é uma pequena caixa conectada a uma porta USB de um computador. Como os coletes são sem fios e alimentados por bateria, podem funcionar até 64 km de distância do seu conector, o que significa que podem ser usados ​​em festivais e outros eventos de grande escala.

Em junho de 2022, a Mostly Mozart Festival Orchestra tornou-se na primeira orquestra a usar a tecnologia nos EUA.

«Apresentamos uma série de concertos de orquestra e pensámos que seria uma grande oportunidade para expandir o acesso ao público surdo e com deficiência auditiva não apenas para a música gravada, mas para que possam experimentar as subtilezas e nuances de uma experiência orquestral ao vivo.», disse Miranda Hoffner, chefe de acessibilidade do Lincoln Center, à Classic FM.

Duas apresentações gratuitas da orquestra no festival “Summer for the City'” do Lincoln Center permitiram a várias pessoas surdas e com deficiência auditiva desfrutar de um concerto com recuso aos coletes sensoriais.

«Uma das principais prioridades do Lincoln Center é tornar as artes acessíveis ao maior público possível.», disse Hoffner. «Fizemos uma parceria com a Music: Not Impossible para alugar os coletes e fornecer engenheiros de vibração para personalizar a experiência háptica para cada evento, e recebemos um feedback tão bom após os eventos no verão passado que sabíamos que tínhamos que trazê-los de volta.»

Em 2022, também Daniel Belquer compôs aquela que é a primeira peça para ser captada com vibrações, destinada a todos os melómanos surdos e com deficiência auditiva. A composição, que tem como titulo “MISUPUNTUS (A Magnetic Introduction to a Parallel Universe Previously Unknown To Us)”, foi pensada para um coro acappela e para as vibrações geradas pelos coletes sensoriais.

Orgulhoso do seu projeto, Belquer refere: «Achamos justo dizer que a experiência que oferecemos é única e que nunca foi antes feita. Esta é realmente uma experiência de qualidade e além do que outras tecnologias disponíveis são capazes de fazer.»