TOKiMONSTA: “Sinto que sou a condutora de uma orquestra”
A norte-americana que se tem destacado internacionalmente por ser uma mulher na cabine do DJ veio a Portugal atuar no Lisboa Dance Festival.
Numa conversa com a Arte Sonora, Jennifer Lee aka TOKiMONSTA explica o seu tipo de feminismo: igualdade para todos, mérito acima de tudo. Da Califórnia para o mundo, a artista formou-se em música clássica, mas é numa «mistura de instrumentos orgânicos» sem regras que gosta de produzir. «Não quero que a minha música soe muito fina», confessa à AS, criticando a música eletrónica moderna por ser demasiado simplista. «Quando se está a produzir música apenas dentro de um computador – inside the box – falta sempre alguma coisa», garante. Lee dá prioridade a um bom microfone, assim como ao interface de áudio e a equipamento analógico que utiliza para depois converter em digital. Este ano há novo álbum.
O que muda quando estás a fazer o DJ set ao vivo?
Os meus espetáculos ao vivo são uma experiência bem diferente do que ouvir os meus álbuns. Se alguém quiser ouvir a minha música é muito fácil: vão ao Spotify, em streaming ou fazendo o download…
Sentes a necessidade de marcar pela diferença nas atuações ao vivo?
Absolutamente. Tendo a dividir as minhas músicas, quando toco ao vivo… Diria que quando faço um DJ set é quase como se estivesse a fazer remixes e a orquestrar. Sinto que sou a condutora de uma orquestra, mais do que apenas estar a tocar as músicas ao vivo. É uma construção: construir um mood e fazer aquilo que bem me apetecer.
Li que tens um background de música clássica. É algo que está presente na tua música, mesmo sendo DJ, ou é algo que apenas te inspira?
Está completamente presente. Cada vez que faço mais coisas como produtora de música, mais incorporo o piano e mais complexas se tornam as várias partes de uma faixa. Não é apenas muito de “reverb” conjugado com “sidechaining”, é mais como posso orquestrar para compor sons complementares. Muito disso aprende-se com a música clássica. No entanto, a música clássica é demasiado limitada e essa parte não incorporo na minha música. Não gosto de seguir as regras, até porque – para ser honesta – não era assim tão boa no piano clássico.
Igualdade para todos, mérito acima de tudo.
Especificamente na indústria da música eletrónica, sentes que és um exemplo feminino para outras mulheres que queiram ser DJ?
Fizeram de mim um exemplo, é verdade, mas a minha intenção não é ser um exemplo feminino. A minha intenção sempre foi simplesmente fazer boa música. Há pessoas que querem ser do tipo ‘a primeira mulher a fazer alguma coisa’, mas eu não quero saber se sou a primeira mulher. Só quero fazer boa música e, no final do dia, se isso ajudar outras pessoas a terem coragem – sejam mulheres, homens ou algum outro género – isso é ótimo. Mas eu preferia estar no fim da lista dos teus produtores favoritos do que ser a primeira na lista das tuas produtoras favoritas. Só quero estar de igual para igual.
Achas que existem as mesmas oportunidades para mulheres fazerem música eletrónica? Comparando, por exemplo, com os principais artistas na música pop, que são mulheres.
É estranho… Tanto tens mais oportunidades como menos. Algumas vezes dá-se mais atenção por seres menos comum [neste caso, uma mulher DJ]. Isso pode levar a que pessoas sem talento sejam escolhidas… Não quero dizer isto desta forma, é mais do tipo: se há um homem que não é talentoso, porque é que alguém lhe deveria dar atenção? Se a música dele não presta, é só isso que interessa. Se é uma DJ mas a música dela não presta, porque haveríamos de lhe dar atenção? Se a minha música é má, não mereço qualquer atenção. Tenho esperança de que vá existir um tempo, no futuro, em que ninguém diga que as DJs femininas são pouco comuns. Talvez um dia será normal.
Tens um projeto chamado Young Art para ajudar novos DJs. Porque é que o criaste?
O Young Art é uma editora que eu comecei para servir de plataforma para impulsionar outros artistas que, de outra forma, podem nunca ser ouvidos. Atualmente existem tantos artistas mesmo muito talentosos e nem sei como os encontrei. Então, uso a influência que poderei ter para os impulsionar e dar a conhecer o trabalho deles ao público.
Fazes isso apenas em Los Angeles ou em todo o mundo, dado que a internet possibilita isso?
É uma editora, pode estar em todo o lado. Por exemplo, um dos meus artistas é de Montreal, Canadá. Não é de L.A. Portanto, não somos definitivamente uma editora apenas de L.A. Quero encontrar artistas de todo o mundo, principalmente pessoas em que eu acredite para investir o meu tempo em fazer deles os melhores artistas que podem ser. Só quero que a editora seja uma plataforma impulsionadora. Não foi feita para eu lucrar. Adoro música da mesma forma que adoro produzir música.
E um novo álbum. É suposto sair em 2017. A minha editora estará relacionada com este novo lançamento.
Conheces algum artistas português?
Buraka Som Sistema! Já os vi a tocar em vários festivais e o Branko vai cá tocar, certo? Ainda não o conheci, mas somos amigos no Instagram. Estou completamente a par do trabalho deles. São fantásticos. A influência do kuduro… sou uma grande fã da cultura portuguesa e brasileira, principalmente da música que resulta dessa cultura. Simplesmente ouvi e gostei, não pensei muito sobre isso.
Como é que descreverias a indústria da música eletrónica: pode crescer mais ou vai estabilizar?
Penso que está a suavizar [o crescimento] atualmente de forma bastante saudável. Não é demasiado trendy… Agora as pessoas gostam da música eletrónica como gostam de qualquer outro género musical. É difícil descrever este fenómeno, mas gosto que esteja a estabilizar ainda que continue a crescer. Existem mais pessoas que compreendem este estilo de música, mas é menos desconhecido. Se antigamente eu perguntasse à minha mãe o que é a música eletrónica, ela não saberia. Agora sabe, mas também já não é algo novo. Isso é uma forma saudável de crescer.
É mais difícil para os artistas de música eletrónica – ao contrário do hip hop, por exemplo – incorporarem mensagens políticas nas suas canções? Digo isto porque vens de um país [EUA] que está bastante ativo politicamente neste momento.
Qualquer artista cria um ambiente e um panorama de entendimento das várias dificuldades que existem no mundo. Se fizeres música instrumental, por exemplo, não há nenhuma forma de expores isso da mesma forma que o rap político fazia nos anos 80 e no início dos anos 90. Mas, mesmo assim, continuas a permitir que as pessoas escapem por momentos da sua realidade. Um músico de qualquer estilo, incluindo de música eletrónica, pode fazer os seus statements em palco. Posso dizer que não de acordo com a direção do meu país e as razões. Posso até ir às redes sociais e explicar as minhas opiniões como cidadã. [A parte de não ter letras] é o que faz da música eletrónica diferente. Às vezes as pessoas nem querem ouvir palavras.
O que podemos esperar de ti no futuro?
Mais música… [risos] Mais música, mais tour’s, mais espectáculos. E um novo álbum. É suposto sair em 2017. A minha editora estará relacionada com este novo lançamento.
Fotos: Valentina Rodrigues