Noite Fetra 2015
B Fachada, Pega Monstro e Éme foram anfitriões do Natal da Cafetra, na Caixa Económica Operária.
Da Caixa Económica Operária, singelo e humilde espaço no coração da Mouraria lisboeta, a família da Cafetra Records fez palco para um dos mais eclécticos e intimistas eventos do ano, com direito a exposições, discos, livros, desenhos e posters originais dos membros da gravadora e amigos. Depois de uma tarde de ânimos mais calmos (e entrada gratuita), na qual transpareceu o lado mais experimental e abstraccionista da música da Cafetra, uma breve pausa para jantar deu lugar aos concertos de destaque da noite, no piso superior e já com plateia plenamente constituída.
Éme foi o primeiro dos últimos a entrar, e sem grandes apresentações deu início ao seu set, o qual fez por manter o mais despido possível. Munido de apenas uma guitarra eléctrica, que modelou ao som do jangle pop a que já habituou, o cantautor circulou por entre as suas canções solarengas e descontraídas, contagiando o público com a notável boa disposição que transparecia. Intercalava modestos sucessos, como Lisa e Um Lugar, com temas ainda por estrear (Buraquinho e Puxa a Patinha foram destaques), e apesar de alguns enganos e retrocessos nas canções, pelos quais prontamente se desculpava entre risos de embaraço, Éme fez jus à posição de inaugurador da noite.
Foi com o último tema de Éme que Lourenço Crespo se apresentou, complementando no sintetizador a guitarra do primeiro em Confusão. A partir daí o palco foi só dele, e lá montava um espectáculo de um só homem, à medida que tocava nas teclas com fervor perante o silêncio abismal do público. O compositor, metade dos também assinados pela Cafetra IGUANAS, demonstrou não possuir a melhor das vozes ao vivo, mas a determinação com que interpretava as canções, os tons sempre esdrúxulos que produzia no sintetizador e a irreverência à la B Fachada das suas letras valeram por mais um bom momento na Noite Fetra.
Não causaram tão boa impressão as Putas Bêbadas, conjunto que actuou de seguida e que iniciou o seu set mal a última nota do teclado de Lourenço Crespo acabava de soar. O seu frenesim caótico de distorção vinha munido de uma energia admirável, mas de forma tal que no turbilhão que produziam não se distinguiam nem palavras, nem timbres, nem batida. Resultado: cada uma das cabeças que compunham o público abanava a seu ritmo, gostando ou não do que ouviam e, talvez mais relevantemente, entendendo ou não o que se passava em palco.
Infinitamente melhor estiveram as Pega Monstro. Com a genica e o sorriso na cara de quem passou a noite rodeado de fãs, as irmãs Maria e Júlia Reis fizeram, em três músicas, o que a soma de todos os actos anteriores não alcançou. Primeiro, uma assoberbante, progressiva e incrivelmente bem executada versão de Amêndoa Amarga, que ultrapassou largamente a marca dos 15min de duração; seguida de um tema ainda por editar, que as Pega Monstro têm vindo a apresentar ao vivo ao longo do ano. Por último, um cover de B Fachada, a assombrante e sentida rendição de Responso Para Maridos Transviados, cujo belo desenlace dava imediatamente lugar à entrada do próprio.
E se ao início falávamos de concertos despidos, B Fachada fez por ultrapassar todos os limites. Feito deus entre os homens no seio da gravadora que ajudou a expandir, e da qual se fez máximo expoente, Bernardo Fachada dispensou introduções, formalidades e mesmo qualquer tipo de amplificação: sem microfone e de guitarra clássica ao natural, contou apenas com a potência das suas capacidades performativas e o coro da plateia, que cantava em uníssono. As canções escolhidas pecaram pela quantidade, mas pareciam pequenos presentes aos seus fãs mais dedicados, raridades e temas pouco tocados ao vivo: Tempo para Cantar, Monogamia, Memórias de Paco Forcado e A Velha Europa. Tão rapidamente veio quanto se foi, mas nem por isso deixou de deixar os fãs de barriga cheia.