Father John Misty e Tyler, The Creator Dominam NOS Primavera Sound 2018
2018-06-07, NOS Primavera Sound 18'O primeiro dia do festival proporcionou uma estadia de excelência no palco Seat, à conta de post-rock, indie folk e hip-hop.
O NOS Primavera Sound sofreu algumas alterações no paradigma de organização de palcos para o ano de 2018: o palco Seat foi uma das novidades, ocupando a posição mais próxima das portas de entrada/saída. Com duas bancadas laterais, revelou-se um local ecléctico e de passagem obrigatória com performances de Fogo Fogo, The Twilight Sad, Father John Misty e Tyler, The Creator. O que é que estes nomes têm em comum? Em género musical nada, mas em qualidade muito. Vive ou revive o dia 7 de Junho, com as reviews abaixo.
THE TWILIGHT SAD
A estética visual dos The Twilight Sad relaciona-se directamente com a música que tocam. Os instrumentais calmos (com influência assumida de The Cure) são tocados com movimentos mínimos – pés parados e cabeça baixa, no entanto, o vocalista, James Graham, expele a sua angústia com movimentos irregulares e imprevisíveis, accionados pelas letras pessoais que carrega consigo. «Thank you for making us feel at home», disse James na primeira metade do concerto, referenciando o céu nublado e o vento frio que caracterizam o seu país de origem, a Escócia. Talvez, o ambiente sombrio do norte britânico seja inspiração para a composição melódica. Talvez sejam as experiências pessoais. A única certeza é a de que a sonoridade dos Twilight Sad transporta-nos para uma noite de chuva em casa, acompanhados por reflexões e nostalgias distantes.
A entrada foi realizada com a definição do tom abafado e dramático da nova faixa “The Arbor”. Enquanto o sotaque escocês conduzia as letras íntimas, as guitarras complementavam a sonoridade shoegaze e o sintetizador entrava de pés juntos em alguns dos refrões, para uma maior intensidade. A performance, por vezes, saltitava entre o rock ambiental e o rock industrial, mas a neblina de post-punk nunca desapareceu, uma condição que limita os Twilight Sad ao vivo. A sonoridade não foge do carácter inicial e os tempos são muito semelhantes. Um ponto positivo para quem quer agarrar todas as forças deste estilo desolador, mas um ponto negativo para os que pedem versatilidade num concerto de festival.
O álbum “Nobody Wants To Be Here & Nobody Wants to Leave” foi o grande foco do concerto no palco Seat, com a faixa “There’s a Girl in The Corner” a ganhar o prémio de melhor performance e maior ovação. O refrão sonante fica colado na cabeça e reflecte de forma sucinta a base dos Twilight: atitude genuína e íntima que pretende agarrar-nos pelos ouvidos e pelos sentimentos.
FATHER JOHN MISTY
Aproximadamente uma hora depois, somos abençoados pela presença de Father John Misty no mesmo espaço. Faça chuva ou faça sol (neste caso, a chuva só ameaçou), John mantém os óculos de sol característicos, a atitude irónica em relação à vida e a voz impecável. Logo na primeira faixa, percebemos que não existem truques, o trabalho vocal presente nos álbuns é fruto do seu próprio talento.
O trabalho instrumental da banda que o acompanha não deve ser menosprezado pela atitude de estrela principal do “Mr. Tillman”. Os arranjos são mais épicos, caiem com uma força maior e causam um maior impacto durante os piques principais das faixas. “Nancy From Now On” abriu o festejo com um alinhamento em crescente qualidade. O novo álbum, “God’s Favorite Customer” foi intervalado com os dois discos que o antecederam, sendo o fator “novidade” a principal atração. A excelente “Hangout at the Gallows” marcou um ponto de viragem – John começou com poucas palavras, dança e movimentos demasiado básicos para o seu estilo habitual – mas por esta altura, a verdadeira personalidade já estava cá fora e interpretou a introdução do novo álbum com tanta notoriedade que ultrapassou a qualidade da versão de estúdio.
Manuseou várias guitarras acústicas, até acolher uma eléctrica perto do final, para a execução da “Hollywood Forever Cemetery Sings”, cantou a “Pure Comedy” por cima da balada singular do piano e utilizou o charme irónico para picar a audiência: «Devem estar sempre a ouvir isto mas… são uma audiência fantástica. A melhor». Os mais técnicos podiam prender a atenção nos instrumentais complexos, os fãs de capacidade vocal podiam fechar os olhos e sentir o calor harmónico da sua voz e os amantes de entertainment podiam imitar o bailarico. No epílogo, com um espectáculo tão bem projectado só ficou a faltar mais tempo.
TYLER, THE CREATOR
Tyler, The Creator já se devia ter estreado em Portugal em 2017, mas acabou por cancelar a actuação no Super Bock Super Rock por questões pessoais. A plateia que se aglomerou certamente não esqueceu a promessa quebrada e Tyler fez o favor de compensar a falha com um set maioritariamente constituído pelo novo (e óptimo) trabalho “Flower Boy”, organizado à volta de hip-hop, r&b e jazz.
As batidas explosivas de “Okra”, “Tamale” ou “I Ain’t Got Time” foram exemplarmente transmitidas pelo sistema de som, que destacou as a amplitudes mais graves, transformando a área do palco Seat num campo de saltos e mãos no ar. As luzes ganhavam velocidade e poder durante os drops mais caóticos e os visuais projectados na tela (que enchia a traseira do palco) anunciavam visualmente os refrões presentes nas faixas menos ferozes. Método inteligente para incluir novo público no karaoke em grupo ou para relembrar os fãs mais esquecidos das letras presentes em “911 / Mr. Lonely” ou “Glitter”, por exemplo.
Sempre que a produção abafava o som, as vozes do público completavam as letras do rapper, que eram entregues de forma suave ou errática, em função das faixas. A forma errática passava muitas vezes pelo limiar do grito, criando performances mais cruas ao vivo que incentivavam uma maior desordem, no sentido positivo da palavra. Esta entrega mais agressiva não é surpreendente se tivermos em consideração que Tyler tem ligações com o rock/punk. Além de ser fã do género, assinou os Trash Talk na sua editora Odd Future Records e, inclusivamente, larga um verso na faixa “Blossom & Burn” do álbum “119”.
O DJ e o “hypeman” estavam escondidos no lado esquerdo do palco. Uma característica que se começa a normalizar nos concertos de hip-hop e com o objectivo de concentrar todas as atenções para o foco principal, o rapper. Tyler tem uma essência única, energética, que mantém o público preso nos seus movimentos e expressões durante todo o set. Não é coincidência nenhuma que o suor escorresse pela sua testa antes da romântica e final “See You Again”. O sentimento é recíproco, também esperamos mais um concerto teu.
JAMIE XX
Tal como nome indica, Jamie faz parte da colheita dos The XX. Aventurou-se com um álbum a solo – “In Colour” – onde explora com liberdade pessoal o seu lado criativo mais electrónico e dançável. Esperávamos uma colectânea que exprimisse este projecto ao vivo da melhor maneira, em conjunto com outras faixas carimbadas pelo produtor, DJ e remixer. Mas não foi o que aconteceu. Jamie veio carregado com uma colecção de batidas electrónicas/house/dance obscura, onde cada faixa era mais um mistério repetitivo para o ouvido.
Uma actuação que seria fantástica no palco Bits, mas que estava a acontecer no palco NOS. Contexto é tudo. Para palco principal, faz sentido utilizar o trabalho mais forte, mais conhecido e mais catchy para cativar a enorme enchente de pessoas. Inegável afirmar que a linha da frente dançava, mas o objectivo principal era colocar o recinto inteiro a dançar.
As transições e os samples, no entanto, têm todo o seu mérito. As transições eram tão fluentes como precisas e nunca quebraram o ritmo ao longo de todo o DJ set, enquanto que os inúmeros samples utilizados (principalmente de vozes), penetravam entre o rápido ritmo e entravam em momentos inesperados. A capacidade estava definitivamente lá, mas no contexto de uma actuação no palco principal, Jamie revelou-se monótono e um pouco desinteressante em longa duração.
Lorde foi a cabeça de cartaz escolhida para este dia, um concerto irrepreensível, mas demasiado espartilhado da nova princesa da Pop. Lê aqui a review completa.