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While She Sleeps no LAV, Entrega, Paixão e Glória

While She Sleeps no LAV, Entrega, Paixão e Glória

2023-05-07, Lisboa Ao Vivo
Rodrigo Baptista
Inês Silva
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Numa performance bem suada, os While She Sleeps convocaram a fação portuguesa da sua Sleeps Society para uma noite gloriosa onde banda e público foram um só. Entre singalongs colossais, moshpits constantes e um stagedive abismal do balcão do LAV, foi um concerto enérgico e repleto de emoções fortes como a banda de Sheffield sabe proporcionar. A abrir as hostilidades estiveram os portugueses Nowhere To Be Found que, com o seu metal alternativo musculado, asseguraram uma das melhores reações que já vimos a um projecto nacional, no que a uma banda de abertura diz respeito.

Oriundos dessa cidade rica em metalurgia musical que é Sheffield, e que também nos deu nomes como Bring Me The Horizon e Malevolence, os While She Sleeps (WSS) têm agitado a cena metalcore há mais de 15 anos com uma abordagem DIY. Sem pretensões ao estilo rockstar, a banda tem consolidado a sua reputação pura e simplesmente através de composições plenas de entrega e paixão que depois se traduzem numa imensa catarse quando apresentadas no contexto da performance ao vivo. Aliado a este conceito, existe também toda uma ideia de camaradagem que é palpável entre os vários elementos da banda, o que demonstra que afinal de contas os WSS não passam de um grupo de amigos que cresceram juntos e que enquanto adolescentes decidiram formar uma banda para se divertirem, algo que explica a longevidade da formação do grupo que se mantém inalterada desde 2009.

Por estranho que pareça, ir a um concerto de WSS é sempre uma experiência com um certo caráter de perigosidade e imprevisibilidade, algo que nos faz recordar alguns dos eventos mais míticos dos anos dourados do rock, onde, por exemplo, um concerto de Guns ‘N’ Roses era toda uma experiência incerta e agressiva. No caso dos concertos dos WSS essa perigosidade e imprevisibilidade é muito mais controlada, apesar dos moshpits violentos e dos stagedives destemidos, o ambiente que se vive é de uma comunhão tremenda entre banda e público, algo que só é possível devido à proximidade e interação que os WSS proporcionam aos seus fãs. No LAV essa partilha não foi exceção e os fãs acederam à convocatória para o maior comício da Sleeps Society que o nosso país já alguma vez experienciou.

A Consagração dos Rapazes da Ericeira

Os menos conhecedores que se dirigiram ao LAV sem conhecerem o historial dos Nowhere To Be Found (NTBF) certamente que entraram na sala a pensar que estariam prestes a ver uma banda recém-formada, ainda verdinha e com um espetáculo pouco trabalhado. Contudo, o que se sucedeu ao longo dos cerca de 50 min de atuação foi completamente o oposto, com a banda a demonstrar não só uma imensa competência, mas também o traquejo necessário para andar nestas andanças, passo a redundância.

Mas já lá vamos ao concerto…

Foi em 2018, a partir das cinzas dos Insch, que os NTFB, com Tiago Duarte nas vozes e guitarra ritmo, Manel Gomes no baixo, Miguel “Migalhas” Rodrigues na bateria e João Quintais na guitarra solo, se juntaram na Ericeira. Cientes das dificuldades que existem em vingar em Portugal dentro de um género fora do considerado mainstream, os NTFB têm conduzido o seu percurso com base em muita carolice e tenacidade, algo que para o bem e para o mal já lhes permitiu alcançar alguns feitos, nomeadamente as colaborações com o renomado produtor Henrik Udd (Bring Me The Horizon e Architects) e o masterizador Ted Jensen ( Metallica, Madonna, Paul McCartney e Coldplay) e as parcerias enquanto endorsees de marcas como a PRS Guitars, Ernie Ball, Zildjian, Remo, Orange e sE Electronics.

Adaptados aos novos formatos de lançamento de músicas, os NTBF têm adotado a estratégia de irem lançando singles avulso acompanhados de um videoclipe, estratégia essa que tem-se mostrado eficaz, pois permite uma maior consolidação e reconhecimento das faixas a um curto prazo. Ao vivo, os NTBF também demonstram uma maturidade acima da média com concertos que são enaltecidos pela sua moldura sonora, destacando-se entre os vários a sua atuação com os Bizarra Locomotiva no Bang Venue em Torres Vedras e a sua participação no festival O Sol da Caparica 2022.

Mas no LAV a situação foi diferente, aqui os NTBF já estavam mais próximos do que poderemos considerar o seu público alvo, por isso não é de estranhar que muitos curiosos se tenham deslocado mais cedo até à sala lisboeta para testemunhar a pujança musical destes rapazes da Ericeira.

Após uma introdução extremamente trabalhada onde, durante alguns minutos, fomos transportados para um aeroporto e recebemos instruções relativas a como nos devíamos comportar naquele “voo atribulado” os NTBF entraram em palco e partiram para a demolidora “Catchfire”, tema que ainda remete para a fase Insch. Com o público ainda algo acanhado e a medir o pulso à banda seguiu-se “Komorebi”. A primeira reação de aprovação de sintonia com a banda surgiu já com a radiofónica “Closer”, a cover musculada que os NTBF fizeram do tema dos The Chainsmokers com Halsey, e que foi reconhecida e cantada por muitos dos presentes. Por esta altura, já Tiago Duarte demonstrava toda a sua satisfação e apreço perante a considerável moldura humana que se apresentava à sua frente, algo que se traduzia em metade da capacidade do LAV, mais coisa menos coisa. Seguiu-se “Medicate Me”, o último original que a banda lançou e o primeiro dos NTBF a apresentar-se na setlist.

“Hell Must Be Empty” com Tiago a berrar a plenos pulmões e “Traverse” single que conta com a participação de Matty Mullins, vocalista dos Memphis May Fire fecharam a atuação que consagrou os NTBF perante um público que há muito tardava em reconhecer o seu potencial.

Já “It’s Yours”, “Home” “Whenever You Call My Name” levaram-nos até à fronteira, por vezes indissociável sonoramente, entre os Insch e os NTBF. Foi também nesta altura que Tiago Duarte invocou aquele que foi o climax do concerto, uma wall of death colossal como nunca tínhamos visto num concerto de uma banda de abertura. Com o público ainda algo mole, Tiago confessou que tinha feito uma aposta e que os presentes não o podiam deixar ficar mal, e assim foi, com as duas metades bem encostadas às paredes do LAV e com um corredor que ia desde as grades à mesa de som o vocalista deu o sinal e o caos reinou na plateia da sala. É escusado dizer que o sentimento de gratidão era palpável na cara de todos os elementos dos NTBF. Já na reta final ainda houve tempo para ouvir a colossal “The Prey”, single que levou a banda até à MTV Portugal, um feito deveras impressionante para uma banda de metal. “Hell Must Be Empty” com Tiago a berrar a plenos pulmões e “Traverse”, single que conta com a participação de Matty Mullins, vocalista dos Memphis May Fire fecharam a actuação que consagrou os NTBF perante um público que há muito tardava em reconhecer o seu potencial.

 

 

Vocês São Nós

Para recordarmos a estreia dos WSS em Portugal é preciso recuar a 2018. Na altura a banda de Sheffield apresentou-se em dose tripla com concertos em Lisboa, Porto e Loulé, mas ainda em salas com uma capacidade que não representava de todo o estatuto que a banda já possuía nessa altura. Seguiu-se mais uma atuação em 2019 no VOA Heavy Rock Festival, desta vez num formato completamente descaracterizado, pois não só a banda apenas tocou cerca de 30 min, como também se viu forçada a subir ao palco sem o seu eterno vocalista Loz Taylor, que, por motivos de força maior teve que ser substituído por Scott Kennedy dos Bleed From Within. Agora sim, em 2023, fez-se justiça a uma das maiores instituições do metalcore britânico, com o LAV em encaixar-se perfeitamente nos critérios acima mencionados e no tipo de espetáculo que a banda apresenta.

Foi ainda a promover “SLEEPS SOCIETY”, álbum editado em Abril de 2021, que a banda subiu ao palco para precisamente dar início às hostilidades com a faixa titulo, esse malhão que descreve o que é pertencer à falange de fãs dos WSS. Com o público a corresponder à chamada ao entoar toda a letra e a provocar moshpits, rapidamente se percebeu que estávamos perante uma atuação simbiótica onde a entrega da banda iria ser alimentada pela dos fãs e vice-versa. Sem tempo a perder seguiu-se “ANTI-SOCIAL” do álbum “So What?”, que, com a sua a letra de cariz político, colocou todos a berrar os versos “I’m not anti-social, I’m anti-bullshit” a plenos pulmões. Por esta também altura já tínhamos tido tempo para dar uma vista de olhos pelo gear que se encontrava em cima do palco. Em termos de guitarras vislumbrámos Sean Long com a sua  Signature Pro-Mod San Dimas Style 1 HH HT M preta. Mais tarde também utilizaria as suas guitarras de assinatura personalizadas “It’s Just A Game” com um acabamento vermelho e “Which Way?” com um acabamento em amarelo neon. Mat Welsh utilizou a sua Gretsch G5222 Electromatic Double Jet e uma ESP Original Series. O baixista Aaran McKenzie recorreu ao longo de todo o concerto a um LTD AP-4. Em termos de amplificação ambos os guitarristas utilizaram Kempers ligados a colunas Marshall 1960ADM Dave Mustaine Signature pintadas de branco, já McKenzie utilizou um Laney DB500H ligado a uma coluna DBV810-4 da mesma marca.

Loz Taylor é um autêntico animal de palco e se há alguma coisa que não o podemos acusar de não ter é entrega e paixão.

Com uma setlist naturalmente centrada no último álbum seguiu-se “YOU ARE ALL YOU NEED”, antes de “THE GUILTY PARTY” transformar o LAV num autêntico trampolim com todos os presentes a saltar em conjunto. Loz Taylor é um autêntico animal de palco e se há alguma coisa que não o podemos acusar de não ter é entrega e paixão. O vocalista dos WSS expressa estas duas manifestações emocionais em cada palavra que entoa e na forma como interage com o público, por vezes de forma tão próxima como aconteceu nos vários momentos em que saltou do palco para o público para fazer crowd surf enquanto saudava os fãs e emprestava o microfone para que o público também berrasse todas as palavras.

“You Are We” foi o primeiro vislumbre do álbum com o mesmo nome. O tema que expressa exatamente essa relação simbiótica entre os WSS e os seus fãs proporcionou um sing along colossal que viria a rivalizar com “Four Walls”, uma das malhas que serviu como introdução a muitos fãs da banda, incluindo ao vosso escriba. Entre luzes dos telemóveis acesas, pessoal às cavalitas uns dos outros e um coro arrepiante, o momento alto foi mesmo quando Loz subiu até ao balcão do LAV para aquilo que todo esperávamos, o icónico stage dive (neste caso balcony dive) que já se tornou imagem de marca do vocalista. Certificando-se que tinha uma massa de gente considerável para o apanhar, Loz saltou de uma altura equiparável a um primeiro andar, tendo sido depois levado em braços até ao palco. Este foi sem dúvida o momento do concerto e aquele que invocou a tal ideia de perigosidade controlada referida acima.

Certificando-se que tinha uma massa de gente considerável para o apanhar, Loz saltou de uma altura equiparável a um primeiro andar, tendo sido depois levado em braços até ao palco.

Após um momento destes poderíamos pensar que chegando ao clímax do espetáculo a energia do concerto cairia a pique, contudo tal não aconteceu e “KNOW YOUR WORTH (SOMEBODY)” e “FAKERS PLAGUE” foram as responsáveis por essa manutenção.

Para a reta final do concerto ficaram guardados dois dos maiores hinos dos WSS. Primeiro ouviu-se “Hurricane”  faixa que deu origem à jornada da banda enquanto artistas independentes e “Silence Speaks” tema que conta com a colaboração de Oli Sykes dos Bring Me The Horizon.”I think the silence speaks volumes”, o verso mais representativo desta última, foi berrado por todos de forma catártica. Estava consumado o final antecipado. Após uma breve ausência do palco, a banda regressou para jogar as suas duas últimas cartadas na forma de “ENLIGHTENMENT?” e “SYSTEMATIC”.

Se há palavra que define esta noite e toda a experiência vivenciada no LAV, essa palavra é glória. A forma como os WSS agarraram o público do início ao fim, sem apresentarem grandes artifícios e uma produção exuberante, demonstrando “apenas” todo o seu valor e talento próprio, é de louvar. Ao fim e ao cabo foram e sempre serão fieis à sua filosofia DIY e só por isso merecem todo o nosso respeito. Mas os WSS ainda vão mais longe, ao sacrificarem-se e ao colocarem a sua integridade física em risco para proporcionarem o melhor espetáculo possível, unindo assim essa glória à entrega e paixão que os caracteriza.

SETLIST

  • SLEEPS SOCIETY
    ANTI-SOCIAL
    YOU ARE ALL YOU NEED
    THE GUILTY PARTY
    I’VE SEEN IT ALL
    EYE TO EYE
    You Are We
    Four Walls
    KNOW YOUR WORTH (SOMEBODY)
    FAKERS PLAGUE
    Hurricane
    Silence Speaks
    ENLIGHTENMENT(?)
    SYSTEMATIC