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A Place To Bury Strangers vs Death By Audio

A Place To Bury Strangers vs Death By Audio

Nero

Oliver Ackermann fala-nos de Transfixation, fiordes, amps, pedais de fuzz e overdrive e guitarras Jaguar escavacadas.

Na primeira edição do Reverence Valada, os A Place To Bury Strangers arrasaram. Instigados pelo pulsar maquinal das baterias de Robi Gonzalez, Oliver Ackermann e Dion Lunadon conseguiram criar uma tremenda tempestade eléctrica, pesada [ora grave, ora estridente], épica e melódica.

No final, o trio deu um dos melhores concertos do festival. Aliás, deu mesmo um dos concertos do ano. Nessa altura, a banda estava a poucos meses de iniciar as gravações do seu novo álbum, “Transfixation”. Donos de um som cada vez mais amadurecido, ainda que continuamente poderoso, houve algumas novidades nos trabalhos do quarto LP da banda. O guitarrista Oliver Ackermann falou connosco das gravações do disco e do seu trabalho no colectivo Death By Audio.

Podemos começar pelo Robi Gonzalez e como se portou na gravação…
Ele não teve mãos a medir com as baterias deste disco. Queria que usássemos todas as partes de bateria que foram surgindo através dele mesmo, após estas digressões em que esteve connosco, neste último par de anos. É um excelente baterista e é capaz de resolver coisas bem diferentes, quando improvisamos. Melhor que estar eu mesmo, que nem sequer sou baterista, a escrever as partes de bateria, foi tê-lo a desenvolver isso. Compostas por ele, para si próprio e para as canções. Há vários ritmos porreiros e complexos, muitas coisas interessantes a acontecer. Fez um trabalho fantástico.

Foi um pouco surpreendente descobrir que tinham ido até à Noruega gravar. O que motivou essa escolha?
Fomos convidados pelo pessoal dum colectivo artístico, de uma pequena cidade (Etne) na Noruega. Para ir gravar aos ABC Studios. Marcaram-nos os voos, organizaram-nos uma pequena digressão pelo país. Era uma oportunidade fantástica, não podíamos desperdiçar. Tivemos muita sorte. Trabalhar em Nova Iorque pode tornar-se “apertado”, passar a vida em salas cheias de suor e mofo, com carpetes todas rebentadas, cheias de baratas… E, de repente, damos por nós no meio de montanhas cheias de neve. Surreal! Trabalhámos com um amigo nosso, o Emil Nikolaisen, dos Serena-Maneesh. Sempre quisemos trabalhar juntos e ele tornou tudo muito divertido, acabou por tocar guitarra em algumas partes que idealizou, também gravámos coisas para ele… Passámos um óptimo bocado.

Quando começas a escrever canções, as coisas começam a ir ao sítio e nunca sabes exactamente o que vai acontecer.

E o equipamento do estúdio, surpreendeu-te?
Havia muitas coisas porreiras, mas o que destacaria é a sala. Era algo como uma igreja abandonada e o som… Tão bom! Tinham alguns microfones bem marados e muito bons que nunca havia visto, coisas únicas mesmo. O estúdio não tem assim tanto material, nem coisas de referência, mas foi excelente.

Quando soube que iam lá gravar dei por mim a imaginar-vos com um tipo de atmosfera à norwegian black metal, mas o álbum acabou por ficar muito direccionado para a melodia…
[Risos] Também penso isso do álbum. Não o planeámos, necessariamente. Aliás, sempre que nos metemos num projecto, a nossa intenção é conseguir o disco de rock n’ roll mais marado e f***** de todos os tempos [risos]. É aí que nos sentimos em casa, mas começas a escrever canções, as coisas começam a ir ao sítio e nunca sabes exactamente o que vai acontecer. A partir daí deixas as canções e até o disco escreverem-se a si próprios e apenas vais ajustando tudo para soar o melhor que possa. As coisas têm uma vida própria e decidem por onde seguir. O essencial é que nos captura aos três a fazer música, após tanto tempo em digressão e tanto trabalho a tocar juntos, e a puxarmos por nós mesmos até ao espaço que acabou por ocupar o disco.

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O álbum parece ir mudando de um sentido mais melódico para um, progressivamente, mais pesadão, imaginando “Deeper” como seu o eixo central. Houve algum estudo da disposição da tracklist?
Foi o que nos pareceu natural. Passámos muito tempo a criar o disco e a forma como as canções soariam juntas e esta pareceu-nos a melhor forma, a mais natural. Quando começámos a ultimar o álbum, tínhamos umas 40 canções com potencial para gravar. Andámos a tocar todas estas coisas diferentes, a experimentar quais encaixariam umas com as outras. A certa altura, deixa de ser um puzzle e torna-se algo que, simplesmente, sabes ter que ser assim. Tem sido assim em todos os álbuns.

Quando estão a experimentar tudo isso, acontece-te estares frustrado pelo comportamento de algum pedal, acabares por modificá-lo um pouco e isso acabar por definir a direcção a seguir?
Sem dúvida! Isso acontece algumas vezes. Também acontece estar a soar bem e marado à partida e não sabes porquê, nem como repetir isso. Na última canção do disco, “I Will Die”, o que ficou na versão final é a gravação da primeira vez que tocámos a canção, estávamos a improvisar à toa, sem nenhum plano. Depois disso, tentámos regravá-la várias vezes e nunca conseguimos que soasse tão bem como dessa vez em que nem sequer estávamos a tentar gravá-la! Tínhamos apenas alguns microfones espalhados na sala e acabaram por capturar aquele excelente momento.

Apostava que já andas a ver se constróis um pedal de fuzz que consiga replicar aquela sujidade…
[Risos] Apostavas bem! Mas, como sabes, andamos sempre a trabalhar nesse tipo de coisas.

Passa tudo por montanhas de experimentação,  tentar ter ideias de como se podem colocar essas coisas num circuito.

Na verdade, onde começa A Place To Bury Strangers e termina a Death By Audio ou vice-versa?
É uma linha bastante indistinta. Afinal essa é a minha vida, o meu trabalho constante. Estou sempre a criar pedais de efeitos, a fazê-los para criarem música e depois, a fazer música, a ter ideias para pedais de efeitos… É um envolvimento completo e é bastante excitante, até construir equipamento para estúdio ou ajudar a gravar bandas. Adoro fazer estas coisas e adoro a forma como estão constantemente a mudar.

Os vossos pedais de overdrive são surpreendentes. Ouvindo-os pensa-se que têm que ser pedais valvulados, pelo tamanho sonoro que possuem, mas não são! Qual é o segredo?
A sério, não há nenhum segredo. Há bastantes abordagens diferentes e, na verdade, todas são baseadas naquilo que, pessoalmente, achamos que soa bem. Ouves toneladas de bandas e música que gostas e queres extremar, depois passa tudo por montanhas de experimentação, de ouvir pessoas diferentes e tentar ter ideias de como se podem colocar essas coisas num circuito. Sendo músico e engenheiro, trata-se, acima de tudo, de aprender a interagir com esses factores e como queres interagir com eles e vais criando o esquema do pedal. Com o passar do tempo vais dando mais um passo ou mudando de direcção.

Se mo permites, preferias ficar podre de rico a fazer música ou a fazer pedais?
Não preciso de muito dinheiro para nada, mesmo a sério. Se tivesse um balde de dinheiro acho que o dava a pessoal que precisasse mesmo, algo assim, não importa. Sou feliz a fazer música, conhecer pessoas, a viajar. Não me posso queixar, tenho uma vida de sonho.

Tenho umas oito Jags e estão numa rotação constante em ser coladas e em reparações ou a serem escavacadas!

E a escavacar modelos Jaguar… Como sobrevivem? Que mods têm?
[Risos] As Jags estão todas modificadas, com pickups lipstick super baratos. Se procurares pelos lipstick mais baratos no eBay, vais descobrir os que uso em todas as minhas guitarras. Custam uns 10 dólares. Possuem circuitos independentes, com um jack a ir para o pickup da ponte e outro para o pickup do braço. Assim, se arruinar um jack ou um pickup durante um concerto, basta mudar para o outro. Todos os potenciómetros e switch estão desactivados, os tremolos e pontes estão todos colados, o nut também…

Ia perguntar pelas pontes…
São pontes Mustang, estão todas com a acção mais baixa possível. Se tocar mesmo com muita força, dessa forma as cordas não saltam das saddles. Tenho umas oito Jags e estão numa rotação constante em ser coladas e em reparações ou a serem escavacadas [risos]!

[Risos] Deve ser uma abordagem difícil para conseguir um endorsement junto da Fender?
Na verdade já tivemos um endorsement da Fender! Mas o negócio não nos favorecia muito e decidimos deixar. Adoro equipamento antigo e eles queriam que usássemos novo equipamento, meio fatela e barato. Não queríamos nada do que estavam a fazer, excepto algum do seu material mais antigo, então não deu para nós…

Desde a primeira edição do Reverence que os vossos amps não me saem da cabeça. São circuitos solid-state ou plexi “batidos”, aos quais dão um visual altamente, ou há ali mais qualquer coisa?
É tudo tecnologia nova. São Class D. Tem que ser, uma vez que voamos muito e usamos milhares de watts. Precisamos dessa potência e criá-la com amps a válvulas… Os amps seriam muito pesados, não é prático. Assim conseguimos soar alto como desejamos.