Quantcast
Def Leppard, O Melhor Som de Guitarra de Sempre

Def Leppard, O Melhor Som de Guitarra de Sempre

2023-06-23, Passeio Marítimo de Algés
Nero
Inês Barrau
9
  • 8
  • 9
  • 8
  • 10

Uma das bandas que derivaram do NWOBHM (New Wave of British Heavy Metal) e maior estatuto global alcançou, abraçando o glam e o hair metal, os Def Leppard não visitavam Portugal desde 1996. 27 anos depois, vivem um período de enorme fulgor, que deixaram bem expresso em palco.

2020 pretendia ser o ano de muitas reuniões, depois de terem sido confirmadas as reuniões de Mr. Bungle, Faith No More (que já não foi adiante devido à pandemia), Rage Against The Machine, Black Crowes (cuja passagem por Lisboa pudemos acompanhar) e dos Mötley Crüe. Estes últimos tinham mesmo assinado um contrato de reforma, após terem anunciado a última digressão da carreira em 2014. Mas, de repente, aconteceu “The Dirt”. A adaptação cinematográfica que a Netflix produziu a partir da biografia da irascível banda foi um enorme sucesso, revitalizando o interesse nos Crüe e assim surgiu o vídeo que revela a destruição do dito contrato de reforma – narrado por um dos protagonistas do filme, Machine Gun Kelly, que interpreta o baterista Tommy Lee na película.

Ainda antes da confirmação oficial, já haviam surgido rumores de estar a ser preparada uma digressão a juntar os Mötley Crüe aos Poison e aos Def Leppard. Logo confirmada oficialmente. Ora, inicialmente os fãs portugueses não acalentavam grandes esperanças de ver os Mötley Crüe em Portugal, afinal e apesar do estatuto colossal da banda a nível mundial, Vince Neil, Nikki Six, Mick Mars e Tommy Lee nunca haviam pisado juntos um palco no nosso território. Isso mudou quando a Everything Is New confirmou a presença dos reis do sleaze rock no Passeio Marítimo de Algés, no dia 23 de Junho de 2023. Os Def Leppard também foram confirmados, já os Poison acabaram por nem iniciar a tour.

«Depois de finalmente voltar à estrada e ter uma monumental tour de Verão nos Estados Unidos e Canadá este ano, estamos muito entusiasmados por trazer esta enorme digressão de estádios às principais cidades do mundo e arrancar na Europa em Sheffield, onde tudo começou para nós há 45 anos», disse Joe Elliott, frontman dos Def Leppard. «Tivemos uma experiência incrível com a The Stadium Tour na América do Norte neste Verão e mal podemos esperar para levar os nossos concertos a todo o mundo com a The WORLD Tour em 2023. Crüeheads na América Latina e Europa: Preparem-se! Estamos a chegar e mal podemos esperar para finalmente ver-vos a todos novamente no próximo ano!», afirmam, na altura, os Mötley Crüe num comunicado em conjunto.

Permitam que deixe já esta nota: foi o melhor som de guitarra que alguma vez ouvi no Passeio Marítimo de Algés.

Antes dos Mötley Crüe, portanto, subiram a palco os Def Leppard. Permitam que deixe já esta nota: foi o melhor som de guitarra que alguma vez ouvi no Passeio Marítimo de Algés. Mais de uma década a escrever para a AS, primeiro nos quadros da revista e depois como freelancer. Naquele recinto, mal-amanhado, vi Rage Against The Machine, Queens Of The Stone Age, Jack White, Pearl Jam, The Cure, Smashing Pumpkins, Neil Young, Guns N’ Roses, AC/DC, Metallica, Daves Matthews Band, Machine Head, Mastodon, Faith No More, Deftones, Alice In Chains, Nine Inch Nails, entre muitos, muitos outros. Nunca tinha ali escutado um som de guitarra tão harmonicamente rico, caloroso, articulado, vibrante e melodioso, como aquele que brotou de Phil Collen e Vivian Campbell.

Já agora, estive a ver o concerto do lado do rio, a uns 10 metros do sidefill do palco. Creio que os engenheiros ainda são (desde há muitos anos) Ronan McHugh e Ted Bible, ao leme de consolas DiGiCo. Foi soberbo. Claro, também importa sobremaneira referir que Collen e Campbell já vão para mais de 30 anos a tocar juntos e a sua interacção dinâmica e encaixe sónico é extremamente fluída. Mais especialista nas notas bem demarcadas e no sustain Campbell, mais shredder e ágil nos fraseados e dedilhados Collen. Mas depois, a forma como conseguem alternar essas funções sem que as canções e a execução da banda se ressinta. Só isso teria valido o bilhete. Felizmente, o concerto não foi só isso,

Se os Mötley Crüe recorreram à força bruta e à parafernália de luzes, os Def Leppard lutaram com rosas e sedas. Ainda sob um sol arrasador, as lendas britânicas apenas puderam depender de si, da sua coesão enquanto grupo e da forma como isso lhes permite ocultar as suas fraquezas e transformá-las em forças: há muito que, por motivos óbvios, Rick Allen não é um baterista explosivo, mas tornou-se um símbolo da resiliência do espírito humano; Joe Elliot também sofre com a erosão que a idade provoca nas cordas vocais, mas a banda em muitas malhas baixa sem rodeios a sua afinação e torna as coisas mais pesadas! Um exemplo disso mesmo deu-se logo em “Take What You Want”, malha que abriu o concerto, tal como abre o mais recente disco dos Def Leppard (“Diamond Star Halos”, 2022), por sinal um belo disco.

Aliás, entre esse recente trabalho, o disco sinfónico editado em Maio passado e a parceria de Joe Elliot com os Ghost, no single de “Spillways”, os Def Leppard estão num sítio bom actualmente e essa energia positiva da banda foi exsudada do palco. Depois, poder disparar de rajada malhas como “Let’s Get Rocked” e “Animal”, logo seguidas desse mid-tempo que é “Foolin” não é para qualquer banda. O pessoal que escreve sobre concertos gosta muito de dizer «não é para qualquer banda». Mas o que significa isso? No caso dos Def Leppard significa uma banda que teve que encontrar forças para ressurgir de dois ou três momentos tão negros como o acidente de Rick Allen (e a felicidade do gajo atrás do kit?) ou a disparatada morte de Steve Clark, um tremendo guitarrista e um grande compositor dos super álbuns “Pyromania” e “Hysteria”.

E por falar em “Hysteria”, a mãe de todos os discos de Def Leppard regressou com “Armageddon It” e, depois de mais uma malha do mais recente disco, com uma das maiores power ballads de sempre, adivinharam, “Love Bites”. “Promises” e o momento semi-acústico que compreendeu “This Guitar” e “When Love And Hate Collide” afundaram um pouco o concerto. O segmento seguinte levou-nos de volta ao passado, aos gloriosos anos 80 da banda, com “Rocket”, “Bringin’ On the Heartbreak”; “Switch 625” (encerrada com solo de bateria); “Hysteria” e o momento mais aclamado daquele fim de tarde: “Pour Some Sugar On Me”. Ainda houve tempo para “Rock Of Ages” e “Photograph”. A ajudar a nostalgia, a última foi acompanhada por um álbum de fotografias dos arquivos da banda que, nos lembrou que já fomos todos mais novos, mas que, felizmente, vivemos uma era do hard rock e da música que já não volta.

Não seria muito justo não mencionar os nacionais The Quartet Of Woah!, ainda que (em dia de apanhar os putos da escola, mais trânsito e tudo esse hiperrealismo enfadonho) tenhamos visto a actuação de esguelha. Não se intimidaram minimamente com a dimensão do palco, deixando claro os benefícios da sua tremenda rodagem – e podem pesquisar pelo site, reviews a concertos e a discos da banda – ao mesmo tempo que, para os que os conhecem há uns anos, também está mais que na altura de um álbum novo!

SETLIST

  • Take What You Want
    Let’s Get Rocked
    Animal
    Foolin’
    Armageddon It
    Kick
    Love Bites
    Promises
    This Guitar
    When Love and Hate Collide
    Rocket
    Bringin’ On the Heartbreak
    Switch 625
    Hysteria
    Pour Some Sugar on Me
    Rock of Ages
    Photograph