Quantcast
The Aristocrats, Mindfuck Polirrítmico

The Aristocrats, Mindfuck Polirrítmico

2020-02-07, Lisboa Ao Vivo
Nero
Inês Barrau
9
  • 10
  • 9
  • 10
  • 7
  • 9

Com os temas do mais recente disco em destaque particular, os The Aristocrats apresentaram um dinamismo, “loucura” e uma desconstrução de padrões rítmicos que criaram uma polirritmia capaz de provocar demência a quem os escutou e tentou processar. Noite divertidíssima na LAV.

A setlist não revelou muitas surpresas (para lá daquelas que se encontram dentro dos próprios temas) e foi seguida à risca, considerando os mais recentes concertos da digressão do álbum “You Know What…?”, que é também o trabalho que mostra mais vigor criativo e maior capacidade para surpreender.

Os três primeiros álbuns já mostravam o humor das composições do trio, mas acabavam por obedecer mais ao formato tradicional do shredding. Não nos estamos a queixar. Como dizem os Midnight, «You can’t stop guitar shreds and you can’t stop steel»! Mas é certo que as composições do disco mais recente apresentam maior dinamismo, maior “loucura” e uma desconstrução de padrões rítmicos que criam uma polirritmia capaz de provocar demência a quem os escuta e tenta processar.

Os The Aristocrats são um supergrupo formado em 2011. O termo “supergrupo” é usado amiúde, mas se pensarmos na questão numa perspectiva exclusivamente técnica assenta que nem uma luva no trio composto pelo guitarrista Guthrie Govan, pelo baixista Bryan Beller e pelo baterista Marco Minnemann. Definitivamente três dos melhores e mais aclamados instrumentistas da actualidade. E talvez Govan e Minnemann sejam um pouco mais super ainda, considerando o concerto na LAV.

O primeiro concerto da banda aconteceu em Anaheim, Califórnia, na NAMM Show. A banda só ensaiou um dia antes do concerto, mas sucesso inesperado e a química surgida entreos três músicos fê-los decidir gravar um primeiro álbum de originais. Após o álbum homónimo a banda gravou “Culture Clash” em 2013. Em 2014 regressaram à NAMM, tocando no The Grove, na festa da Jackson e Charvel Guitars, evento onde a AS esteve presente. Guthrie Govan juntara-se à Charvel Guitars e apresentou também o seu primeiro modelo de assinatura: a HSH Flame Maple.

Este modelo tipo San Dimas possui um corpo em basswood caramelizado, com o tampo flame maple que apresenta um verniz acetinada em uretano. O corpo tem o contorno do heel um pouco modificado em relação às San Dimas tradicionais, facilitando o acesso às zonas mais agudas da escala. O braço é um bolt-on, também flame maple, com reforço de grafite e vários tratamentos que visam o acréscimo de resistência, de manutenção da afinação e, claro, de velocidade. A escala de 25.5” apresenta um raro raio composto (12”-16”) nos modelos San Dimas, 24 trastes extra jumbo em aço inoxidável e os entalhes em maple com as margens em ébano. Os side-dots Luminlay aumentam a precisão, emitindo luz nos palcos escuros (e o palco esteve ridiculamente escurecido durante todo o concerto).

Já em 2016, foi estreada a versão com tampo em bird’s eye maple. Apresentando exactamente as mesmas características de corpo, braço e escala, talcomo como os mesmos PUs Charvel Custom MF e a ponte recuada Charvel Tremol-No. Este modelo esteve em particular evidência no tema “Spanish Eddie”. Com uma resposta soberba aos dedilhados em picking, numa fusão de hammer-ons e pull-offs capaz de evocar Al Di Meola e Frank Zappa. A mão esquerda de Govan é fenomenal, já a mão direita é sobre-humana. Foi um dos melhores momentos da noite.

Se são connoisseurs da década de 80, vão recordar-se desse veraneante single de Laura Branigan, também intitulado de “Spannish Eddie”. A história foi revelada no concerto, umas das muitas divertidas conversas mantidas entre os três músicos e a plateia que compôs a sala da sala Lisboa Ao Vivo e teve como brinde um som de enorme qualidade, com fidelidade no recorte instrumental e uma mistura bastante equilibrada nos vários pontos do espaço. Pelo menos, foi essa a nossa sensação.

“Blues Fucker”, “D-Grade Fuck Movie Jam” que, de facto, com os seus wah wahs e as linhas funk do baixo, nos remete para a era dourada da indústria porno (e agora parece que somos totais entendidos nessa matéria…), foram outros momentos do novo álbume  capazes de revelar mais espectacularidade instrumental. E o que dizer de “When We All Come Together” e o sei intenso duelo entre Guthrie e Guthrie! A Charvel, desdobrando-se entre sons quase barítonos e o voicing (através de processamento) de um banjo, esteve à altura do seu dono. Soberba!

“The Ballad of Bonnie & Clyde” foi mais “normal” ou, melhor dizendo, mais sequencial. Tal como “Get It Like That”, tema dedicado a Peart, com os espaços para os solos instrumentais mais definidos. E falando em solos, Marco Minnemann ofuscou os seus companheiros e venceu o prémio “não-vale-grande-coisa-mas-diz-se-na-mesma” de Melhor Momento da Noite. Uma propulsividade fenomenal e um sentido musical incrível, capaz de criar padrões melódicos, além da triunfal demonstração de velocidade e potência na qual inclui ainda, de forma épica, as baterias de “Tom Sawyer”, homenageando de forma singela o malogrado baterista dos Rush. Foi lindo, lindo!

Não creio que o alemão o entenda assim, mas este seu momento não deixa de ser uma bofetada de luva branca (aliás, um chapdão na tromba) de tantos snobs musicais. Afinal, a escola do músico foi o death metal. Querem perceber de onde surgiu aquela explosividade e velocidade, muito antes de Steven Wilson, ouçam-no a debitar blast beats nos Necrophagist. Se querem perceber de onde veio o seu pocket, ouçam a esquizofrenia crossover dos Freaky Fukin Weirdoz.

O solo de bateria acabou por determinar a tendência de um certo decair de intensidade no concerto. A balada “Last Orders” é cativante, mas parece servir para Minnemann poder respirar um pouco após a exigência a que foi submetido. Com “The Kentucky Meat Shower” regressam os compassos marados e a diversão. Mas, não havia volta a dar, após bastantes piadas e toneladas de notas, o concerto estav a em modo cruzeiro para o seu final, com as mais lineares “Desert Tornado”, “Flatlands” (com espaço para um solo mais destacado de Beller) e “Smuggler’s Corridor”.

SETLIST

  • Blues Fuckers
    D-Grade Fuck Movie Jam
    Spanish Eddie
    When We All Come Together
    The Ballad of Bonnie and Clyde
    Get It Like That
    Last Orders
    The Kentucky Meat Shower
    Desert Tornado
    Flatlands
    Smuggler’s Corridor