Quantcast
“The Smile” Enchem O Coliseu dos Recreios De Sorrisos

“The Smile” Enchem O Coliseu dos Recreios De Sorrisos

2022-07-08, Coliseu dos Recreios
Miguel Grazina Barros
NICØ
9
  • 8
  • 8
  • 9
  • 9
  • 10

A nova banda de Thom Yorke e Jonny Greenwood fez a sua estreia em Portugal perante um Coliseu cheio que provou que os The Smile, são mais do que uns novos Radiohead.

Podem passar despercebidos, mas os The Smile não são apenas uma “banda nova” como afirmou Thom Yorke no final do concerto. São uma banda composta por músicos e compositores de excelência, sem nada a provar. Yorke, voz e frontman dos Radiohead, assume aqui também uma posição de liderança – à semelhança do seu projeto a solo ou ainda em Atoms for Peace, banda que partilha com o baixista Flea. Jonny Greenwood, colega nos Radiohead, também faz parte da “banda nova” como guitarrista, baixista e teclista. O terceiro membro da banda é Tom Skinner, baterista da banda britânica de jazz Sons Of Kemet e colaborador de Jarvis Cocker, Floating Points, Herbert, Angelique Kidjo, etc.

O disco de estreia dos The Smile “A Light for Attracting Attention” – lançado a 13 de Maio – foi apresentado em Lisboa, no mesmo dia em que os Metallica actuavam no festival NOS Alive. Porém, a fila que se formou em plena rua das Portas de Santo Antão surpreendeu pela sua dimensão e dedicação – uma fã esperou nove horas para ficar em primeiro lugar, enquanto muitos outros esperaram cerca de seis horas na fila, num dia de calor insuportável. São estes os fãs que Yorke e Greenwood sempre cultivaram, arrastando a mesma base de seguidores mesmo após 37 anos de existência de banda. Os ânimos estavam altos e as expectativas também, não é todos os dias que se pode ver a estreia de uma banda spin-off dos Radiohead.

Pelas 21h30 ainda muitos espectadores procuravam o seu lugar, embora as primeiras filas já estivessem completamente ocupadas. O calor parecia não incomodar os fãs que esperaram horas para conseguir ver em primeira mão a estreia dos The Smile, mas primeiro foi a vez do americano Robert Stillman subir ao palco. Através de um saxofone, uma série de pedais de efeitos, tape loops, samplers e um sintetizador (o lendário dos 80’s Yamaha DX7), o multi-instrumentista criou uma paisagem sonora orgânica digna de uma orquestra clássica futurista, justapondo o arcaico com o moderno, incorporando influências do jazz, do minimalismo, da música folk americana e da música electrónica experimental. Por se tratar do acto de abertura para os The Smile que durou 30 minutos, a entrada e correria de pessoas foi o suficiente para provocar um burburinho prolongado na sala de espectáculos que não deixou a maioria aproveitar o acto de abertura na sua totalidade.

Outros 30 minutos de intervalo e finalmente, pelas 22h30, Thom Yorke, Jonny Greenwood e Tom Skinner entram em cena ao som de um poema de William Blake, lido por Cillian Murphy – ator da série Peaky Blinders. Sentado ao piano, Thom introduz as primeiras notas de “Pana-vision“, tema que integra também a mesma série da Netflix. Jonny no baixo e Skinner (claro) na bateria fazem-se ouvir ao mesmo tempo com este tema desconcertante, com notas dissonantes e um compasso 7/8 – mas a métrica imposta pelo jazz de Skinner ainda agora estava a começar. Imediatamente, “Thin Thing” vê Jonny Greenwood com uma técnica impressionante na guitarra – uma mistura de um dedilhado da mão direita rigoroso com um delay específico (se quiseres tentar aprender, este vídeo ensina bastante bem a técnica). “Obrigado” dirige-se Yorke pela primeira vez à plateia.

“Thin Thing” vê Jonny Greenwood com uma técnica impressionante na guitarra – uma mistura de um dedilhado da mão direita rigoroso com um delay específico.

Um palco ornamentado apenas com luzes laterais e um painel luminoso que contrasta com as silhuetas da banda constituiu o décor por completo. Thom oscila entre um baixo Fender Mustang, um baixo Guild Starfire e ainda um baixo Gibson SG, por vezes tocando guitarra, piano, sintetizador e um vocoder Waldorf STVC. Jonny assume mais ou menos a mesma posição que nos Radiohead – guitarras delicadas ou riffs pujantes, experimentações com pedais de efeitos ou com um arco de violino num baixo elétrico, por exemplo em “Free in the Knowledge”. Em “Speech Bubbles” vai ainda mais longe, ao tocar piano e harpa (sim, ao mesmo tempo). Skinner pontua as canções com a sua bateria limpa, precisa e com intenção. Os compassos são curiosos, estimulantes e nunca aborrecidos, sem medo de recorrer a polirritmos ou mudar de métrica a meio das canções.

The Smile são uma mistura do rock dos Radiohead, com a experimentação eletrónica do trabalho a solo de Thom Yorke, com as linhas de baixo dos Atoms for Peace.

The Smile são uma mistura do rock dos Radiohead, com a experimentação eletrónica do trabalho a solo de Thom Yorke, com as linhas de baixo dos Atoms for Peace – suportados pelos novos ritmos e uma perspectiva jazz. As mudanças entre canções foram rápidas, as trocas de instrumentos dissimuladas. Além da bateria, Skinner usa ainda uma Elektron Octatrack Mk1 e uma TipTop Audio Mantis com 2 Make Noise 0-Coast e uma série de outros módulos não identificados. Este sistema modular foi usado para alguns arpegios, texturas e manipulação de som ao vivo.

“The Smoke” impressiona com a sua linha de baixo saltitona tocada por Thom Yorke, enquanto o seu falsete característico e controlado invade e reverbera naturalmente pela sala do Coliseu – por vezes foi possível sentir uma discrepância e um desfasamento entre o som perto do palco e o som mais afastado do palco, uma espécie de “slapback delay” não propositado. Foi nesta canção que o público se atreveu mais a cantar – durante a parte anterior do concerto, eram poucos os espectadores que acompanhavam as letras, talvez pelas músicas serem novas ou mesmo por não quererem interromper o momento. Em “You Will Never Work in Television Again”, Robert Stillman volta ao palco para proporcionar um momento catártico ao final do concerto – puro rock n’ roll envolto numa canção que não foge ao post punk dos 80’s e acaba em êxtase.

Após os músicos abandonarem o palco, ouvem-se pés a bater no chão que em conjunto se assemelham ao ensurdecer da passagem de um comboio – um momento clássico do Coliseu que exige um encore. “The Same” foi a primeira do encore, canção de abertura de “A Light for Attracting Attention”, com o seu sintetizador rítmico reminescente do clássico de Kid A, “Everything in Its Right Place” – “Please, we are all the same”, canta Thom Yorke com uma entoação desesperada à medida que a canção evolui com a voz de Thom manipulada ao vivo por Skinner no sintetizador modular, um momento notável no concerto. Thom aproveita a primeira canção do encore para apresentar os músicos no palco. Apenas “Open The Floodgates” ficou de fora do alinhamento deste concerto, no entanto foram apresentadas quatro canções inéditas “Bodies Laughing”, “Colours Fly”, “Just Eyes and Mouth” e “People on Balconies”. Ainda durante o encore, uma aparição em palco de um Sequential Prophet 08, sintetizador emblemático na história dos Radiohead. Thom Yorke agradece à plateia “Obrigado por terem vindo, nós somos uma banda nova”. A canção final do concerto foi “Feeling Pulled Apart by Horses”, single de 2009 de Thom Yorke que pediu que a plateia se levantasse e dançasse nesta despedida.

SETLIST

  • The Smile
    Pana-Vision
    Thin Thing
    The Opposite
    Speech Bubbles
    Free in the Knowledge
    A Hairdryer
    Waving a White Flag
    Colours Fly
    We Don’t Know What Tomorrow Brings
    Skrting on the Surface
    Bodies Laughing
    The Smoke
    You Will Never Work in Television Again
  • Encore:
    The Same
    People on Balconies
    Just Eyes and Mouth
    Feeling Pulled Apart by Horses