Baroness, Caminhar no Fio da Navalha
John Baizley, fundador e único membro original dos Baroness, fala-nos de guitarras, amps, da sua marca de pedais de fuzz e da sua filosofia musical.
No final de 2015, “Purple” foi editado. O quarto álbum de estúdio dos Baroness fechou uma era complicada para a banda, ao mesmo tempo que criou um novo ciclo. O baterista Sebastian Thomson falou-nos, em entrevista, sobre todo esse processo de refundação da banda. Em 2016, Lisboa foi uma das primeiras cidades europeias a ouvir esse álbum ao vivo.
Um ciclo que terminou em 2017, quando o guitarrista Peter Adams deixou a banda. Gina Gleason foi a escolhida para se juntar a Thomson, Nick Jost e a John Baizley. A guitarrista de Filadélfia tem um percurso maioritariamente marcado como hired gun. A sua carreira já a colocou em projectos tão diversos como integrar o elenco do Cirque Du Soleil, na produção “Michael Jackson: One”, numa residência com Carlos Santana na House Of Blues, em Las Vegas, ou a ter acompanhado Jon Anderson, o génio criador dos Yes, em várias das suas apresentações, ao longo dos anos, na Winter NAMM. A guitarrista é a líder de duas bandas de tributo, com line-ups totalmente femininos, Misstallica e Queen Diamond!
Após um ano a rodar a nova guitarrista ao vivo, a banda prepara-se para novo álbum e Lisboa será uma das últimas cidades europeias a ouvir “Purple” ao vivo. Em conversa com Baizley, fundador e único membro original dos Baroness, antevimos o concerto de 27 de Junho, no Lisboa Ao Vivo, que fechou mais um ciclo, iniciando, uma vez mais, uma nova era na banda.
Podemos tocar música pesada, de afinações graves, mas recorremos às fórmulas de quem toca blues, country, ou pop.
AMPS & GUITARRAS
Na última vez que passaram em Lisboa, andavas a usar modelos Telecaster, Jazzmaster e Stratocaster. Mas não eram Fender…
Quando estávamos a trabalhar no “Purple” era patrocinado pela G&L Guitars, fundada pelo Leo Fender depois de ter vendido a empresa à CBS. E eles fazem guitarras que são muito, muito comparáveis com as Fender. Não estava interessado em tocar Les Paul ou PRS convencionais, dizendo-o de forma simplista, até por não querer humbuckers. Actualmente, estou mesmo a usar modelos Fender com bastante frequência. Após décadas a tocar música, finalmente descobri as guitarras perfeitas para o meu estilo. Comecei pelas G&L que são fantásticas, são guitarras muito bem elaboradas. Mas há par de anos, comecei a usar Fender e agora os meus dois instrumentos principais em palco são Jazzmasters e Teles. Também tenho uma Strat… Também não uso amps grandes, mas combos bastante pequenos.
Ainda em 2016, recordo-me de um Budda, um Twin Reverb, dois Jazz Chorus… Continua a ser este o rig?
Quando estamos na Europa, utilizamos o material de qualidade decente que conseguimos encontrar. Nos Estados Unidos, e agora com a Gina na banda a utilizar Fender, tocamos praticamente com a mesma configuração. Normalmente, usamos um ’57 Princeton Silverface, creio que de 15 watts, talvez até 10. A acrescentar a essa unidade usamos ou um reissue ’65 Princeton (ficando com dois Princetons por guitarrista) ou modelos Deluxe. Não é muito comum andar com o meu Twin em digressão. É muito “barulhento” e com um Deluxe posso obter sons muito similares sem ter que manter o Master Volume entre 0 e 1. Mas prefiro usar a dupla de Princetons e, tanto eu como a Gina, tocamos em stereo completo – não se trata de utilizar dois amplificadores para sobrepor volume – para realmente usufruir dos efeitos que utilizamos.
PHILLY FUZZ
No que respeita a efeitos, uma pesquisa às nossas galerias fotográficas revela unidades como um MXR Phase 90, um Memory Man, um Whammy… Mas há por ali um pedal roxo que não consegui deslindar. Que pedal é esse?
O pedal roxo é na verdade da minha empresa. A Philly Fuzz é composta por mim e dois amigos meus. Nós próprios construímos os pedais e temos 3 modelos (2 deles no mercado). São todos fabricados à mão. Começámos a empresa porque queria um pedal fuzz com uma configuração quase low gain. Na maior parte do tempo, quando estou a usar um fuzz estou a alimentá-lo com o meu pedal normal de distorção. Queria algo que não tivesse necessariamente grandes quantidades de fuzz em todos os momentos, mas algo que pudesse ir de um som AC/DC para um som clássico mais saturado. Tenho sempre um dos pedais Philly Fuzz na minha pedaleira, actualmente estou a usar um de três transístores de germânio, chama-se “The Heretic”!
Bom nome! E estás a dar-me uma grande novidade. Confesso que não sabia que construías pedais.
Colecciono tantos efeitos que pareceu-me uma coisa natural…
É um mundo no qual te podes perder?
Já estou perdido nisto há duas décadas. Acho que já não vou encontrar a saída… Não me importo, porque grande parte da minha filosofia está na utilização de efeitos e na utilização de um tipo de equipamento específico que gosto de tocar. Tento utilizar instrumentos convencionais de forma pouco convencional, para que exista uma maior hipótese de realmente descobrir algo que não conhecia anteriormente, através do instrumento. Podemos tocar música pesada, de afinações graves, mas recorremos às fórmulas de quem toca blues, country, ou pop. E, graças a isso, temos conseguido descobrir e gerar coisas que não acredito que fossem possíveis de outra maneira. Na melhor das hipóteses, alguns dos sons que fazemos e algumas das maneiras com que abordamos os instrumentos serão realmente refrescantes e novas. No mínimo, graças a isso tenho mais conhecimento sobre o meu próprio instrumento e sobre forma com o som funciona.
Tento utilizar instrumentos convencionais de forma pouco convencional, para que exista uma maior hipótese de realmente descobrir algo que não conhecia anteriormente, através do instrumento.
ATITUDE
Estás a dizer que chegas ao detalhe de criar os teus próprios pedais e depois, mandares essa minúcia “às malvas” e te desafiares com o instrumento. É um pouco paradoxal?
É completamente um paradoxo! A minha experiência, nesta indústria, diz-me que esta só é viável quando múltiplos paradoxos se alinham simultaneamente… Caso contrário o que é que eu faço? Faço muito barulho e estou a entreter pessoas? Isso não é interessante para mim. É muito mais estimulante, em determinadas coisas, não fazer ideia do que vai acontecer e poder descobrir coisas através das nossa música, partilhando depois alguma dessa surpresa e epifanias que transporto comigo. Através de uma rotina bem ensaiada, não consigo transpor-me para um concerto ou um álbum. Tenho que estar no fio da navalha. Isso torna-se excitante.
Já trabalhas com o Sebastian e o Nick há alguns anos. E mesmo a Gina já leva algum tempo convosco. Como é natural, estão a ficar cada vez mais coesos. Podes adiantar alguma coisa sobre o próximo álbum?
Existirá um quando, dentro do menor tempo possível, concluirmos um. Já está na altura. Vamos tocar algumas músicas novas em Lisboa.
“Purple”, especialmente ao vivo, soou muito Thin Lizzy em alguns momentos. Muito harmónico e cru. É uma influência a ter em conta no próximo álbum?
Sim, claro. Acho que toda a gente que toque um género aproximado à nossa música, qualquer grupo que esteja a utilizar duas guitarras de forma harmónica, sabe quem são os Thin Lizzy. Definitivamente, ouvíamos Thin Lizzy na nossa juventude. Foram muito influentes, não só para nós. Da mesma forma que os Queen foram influentes, os Metallica ou os Boston. Iron Maiden, Judas Priest… Existem montes de bandas por aí que fizeram isso, sendo estas as mais óbvias. Mas há referências mais obscuras que ouvíamos e que estavam a fazer muito trabalho harmónico de guitarra, como os The Fucking Champs que, de certa forma, agarram esta ideia e levam-na sempre ao máximo e tudo é tão harmónico. Acho que os Lizzy recebem mais crédito por isto porque as melodias que eles tocam, tu podes cantá-las, após as ouvir. Consegues sair da sala com aquele som na tua cabeça e isso sempre foi uma grande cena para mim. Tocar as coisas lentamente ou de forma simples o suficiente para que as pessoas oiçam o que estamos a fazer nas nossas guitarras e criar quase uma linha vocal ou vice-versa.