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Yamaha: 45 Anos de Sintetização

Yamaha: 45 Anos de Sintetização

Redacção

Recuando ao lançamento do SY-1 em 1974, a história entusiasmante em torno do desenvolvimento e produção de sintetizadores da Yamaha celebrou o seu 45º ano de vida.

Enquanto instrumento musical que permite criar sons inovadores e entusiasmantes e expressar-se de forma mais livre, o sintetizador tem estado sempre na ponta tecnológica do desenvolvimento da música electrónica, desde que foi criado. Mais ainda, as tecnologias aperfeiçoadas de forma a concretizar este instrumento estão agora a ser utilizadas em variadíssimos tipos de dispositivos áudio, o que nos permite afirmar que o sintetizador encarna o verdadeiro espírito evolutivo da música moderna.

Desde o seu começo em 1974, o desenvolvimento de sintetizadores pela Yamaha desdobrou-se em inúmeros outros avanços tecnológicos, nomeadamente na criação de sons, que também se iniciou nos anos 70. Exemplos notáveis são a pesquisa na sintetização FM, que se viria a tornar muito popular nos anos 80, e o sistema híbrido Pulse Analog Synthesis System (PASS), que combinava tecnologias digitais e analógicas e foi adoptado para utilização nos geradores de sons do Electone, em 1977.

Mesmo após o lançamento do Electone D-1, ainda existiam muitas questões associadas à qualidade do som. Uma questão especialmente “bicuda” assentava na dificuldade de tornar estes novos instrumentos tão expressivos como os acústicos. As mudanças em tom e volume ao longo do tempo foram identificadas como um aspecto crítico a este nível, conduzindo a uma pesquisa e desenvolvimento contínuos na procura de sons cada vez melhores de forma a ultrapassar estes problemas.

Também enquanto elemento simbólico do período de grande crescimento que a economia Japonesa conheceu nessa época, diz-se que o, então, presidente da Yamaha terá dado instruções à sua equipa para «gastar o que fosse preciso, de forma a produzir algo que seja o melhor no mundo». O desenvolvimento de sintetizadores na Yamaha durante os anos 70, mais do que dar à luz uma miríade de tecnologias originais e inovadoras, viria a abrir o caminho para a crescente popularização do sintetizador enquanto instrumento musical.

I | ELECTONE: ORIGENS DOS SINTETIZADORES YAMAHA

Tecnologias e produtos que podem ser encarados como precedentes dos primeiros instrumentos musicais eletrónicos existem desde a década de 1920, mas o órgão eletrónico destaca-se pela sua ligação à música popular. O Electone (“Electone” é o nome e marca pelo qual a Yamaha apelida os seus órgãos eletrónicos) estreou-se em 1959 com o modelo D-1. Instrumentos musicais similares, com base em tecnologia de tubo de vácuo, já existiam nessa época, mas o D-1 foi revolucionário uma vez que os seus módulos dependiam somente de transístores. Apesar de o Electone ter aberto caminho para os sintetizadores modernos a nível de sintetização de som, faltava-lhe de tal forma a expressividade dos instrumentos acústicos que o presidente da Yamaha desse período chegou mesmo a referir-se ao sintetizador como um “brinquedo musical”. O instrumento produzia um tom assim que se premia uma tecla, mas cessava de súbito com um abrupto estalido mecânico assim que se soltava a tecla.

O sistema de produção de sons empregue na primeira geração de Electones era extremamente simples. Cada tecla no teclado possuía o seu próprio oscilador, ou aquilo a que actualmente chamamos de “gerador de sons”, que produzia um som sempre que a tecla era tocada. Se o teclado tivesse 40 teclas, o instrumento teria 40 osciladores, com cada conjunto a funcionar de forma semelhante à do sistema switch and buzzer. A decisão de recorrer a novos circuitos capazes de modificar o som ao longo do tempo implicaria ser capaz de fornecer um para cada conjunto e para cada tecla do teclado. Contudo, tendo em conta os avanços tecnológicos nesse período, implementar este princípio implicaria desenvolver um design muito caro que resultaria num instrumento desmesuradamente grande.

Yamaha Electone D-1

Tornou-se claro que era necessária tecnologia inovadora de controlo sonoro, de maneira a usar um número limitado de circuitos de forma mais eficiente. Se, por exemplo, um instrumento tivesse oito circuitos de controlo poderia gerar até oito sons em polifónico, ou seja, oito notas diferentes ao mesmo tempo. Mas se tivesse, igualmente, 36 teclas numa configuração de três oitavas, esta nova tecnologia teria necessidade de identificar quais os circuitos a activar em resposta ao toque de uma tecla em particular. A solução passou por introduzir um dispositivo que pudesse atribuir circuitos a teclas, com eficiência, com base na ordem pela qual elas eram tocadas, no número de teclas a serem tocadas nesse preciso momento e considerando outras questões do género.

Este tipo de dispositivo ficou conhecido como um key assigner, o verdadeiro precursor da tecnologia actual de alocação dinâmica de voz (Dynamic Voice Allocation – DVA). Nos anos 70, quando os geradores de tons ainda dependiam da tecnologia analógica, os circuitos digitais já estavam a ser concretizados nos key assigners. Como tal, a sua adopção representou um marco histórico na introdução da tecnologia digital na época dos sintetizadores analógicos.

II | COMBOS & PORTABILIDADE

Cinco anos antes do SY-1, foi lançada a série YC de órgãos combinados para músicos de grupo. Por oposição aos Electones, que apresentavam teclados superior, inferior e de pedal, que permitiam a um único intérprete actuar como se fosse um grupo de músicos, os órgãos combinados, tal como o YC-10 de teclado único, granjearam desde logo fama graças à sua portabilidade. Em termos de conceito e tecnologia, os órgãos combinados da série YC tiveram um grande impacto no desenvolvimento dos sintetizadores modernos.

Os anos 60 assistiram ao som tocado por bandas como The Beatles e The Rolling Stones tornar-se extremamente popular por todo o mundo, o que produziu uma mudança da procura de órgãos fixos, instalados em igrejas ou instituições estatais, para a procura de órgãos portáteis para utilização em palco. Com o seu teclado único de 49 teclas, quatro variações de cores e um design compacto que cabia perfeitamente arrumado numa caixa dura, o YC-10 era um órgão verdadeiramente inovador. Também diferia acentuadamente do Electone no aspecto de que o seu som de output podia ser reproduzido separadamente, através de um amplificador de guitarra ou de baixo.

Yamaha YC-10

Chegando tardiamente à gama YC, o teclado duplo YC-45D era capaz de alternar instantaneamente entre sons – funcionalidade obtida através da adição de um grande número de alavancas de som, assim como de controladores para predefinições. Adoptando uma abordagem semelhante à do posterior CS-80, estes componentes ofereciam vislumbres para o futuro dos sintetizadores. O YC-45D vinha equipado com muitas outras novas funcionalidades que o tornavam cada vez mais próximo dos sintetizadores como, por exemplo, as teclas que podiam ser pressionadas mais para à esquerda ou para a direita de forma a produzir um efeito vibrato, enquanto que um controlador com forma de fita fornecia um suave pitch bending.

Olhando para trás, não podemos deixar de admirar os progressos tecnológicos conseguidos para aumentar a expressividade dos instrumentos de teclado.

III | SY-1: O PRIMEIRO SYNTH

Em 1973, a Yamaha terminou o projeto de desenvolvimento de um protótipo apelidado de GX-707. Com base nos controladores de voltagem em cluster, este instrumento pode bem ser considerado como o predecessor do Electone GX-1. Apesar de ser semelhante ao Electone, o GX-707 era, na realidade, um sintetizador polifónico de oito notas, especificamente os teclados superior e inferior suportavam polifonia de oito notas, enquanto que os teclados de solo e pedal eram meramente monofónicos. Com uma consola que pesava mais de 300 Kg e uma mesa separada para a edição de tons, não era um modelo adequado ao público em geral e é, até hoje, considerado um instrumento para um nicho específico de mercado.

Porém, o GX-707 apresentava geradores de som bastante expressivos, tecnologia que a Yamaha optou por empregar num produto de teclado único para os restantes modelos de Electone. Foi assim que nasceu o sintetizador monofónico SY-1 que viria a ser o primeiro sintetizador oficial da Yamaha, aquando do seu lançamento em 1974.

Apesar de o SY-1 não apresentar um key assigner, tinha contudo um controlador de sound envelope para alterar os sons em tempo real. O controlador de sound envelope empregue nos sintetizadores compreende tipicamente quatro fases, identificadas pelas letras ADSR. Por regra, usar-se-ia um controlador para cada um destes parâmetros, para conseguir ajustar a forma como o som se altera ao longo do tempo em resposta à pressão, sustentação e libertação das teclas. Contudo, o painel de controlo do SY-1 não apresenta os botões de controlo que os sintetizadores modulares apresentam, como por exemplo o Moog e o Minimoog, para configurar as etapas de amplitude e filtros de envelopes do ADSR. Em lugar disso, um par de sliders apelidados Ataque e Sustain são usados para ajustar a amplitude de envelope e uma funcionalidade conhecida como Attack Bend que permite ajustar de forma única o pitch e filtros de envelope no início de uma nota.

Yamaha SY-1

O SY-1 apresentava uma série de predefinições de envelope para recriar o som de vários instrumentos, tais como a flauta, a guitarra e o piano, que podiam ser activados com um simples movimento das alavancas de tom. Nos dias que correm nem se poderia conceber a possibilidade de não utilizar as predefinições de um sintetizador, mas a inclusão desta funcionalidade pela Yamaha no seu primeiro sintetizador analógico foi um marco de inovação singular para a época. Outra característica inovadora do SY-1 foi o controlador de toque ou sensibilidade de velocidade.

Antes do lançamento do SY-1, os orgãos electrónicos vinham geralmente equipados com um pedal de volume ou expressão que o músico usava para modular o som, de forma a dar-lhe mais expressão, quando tocava. Por essa altura, a Yamaha estava a desenvolver uma gama de diferentes protótipos com o objectivo de modulação do som com base na pressão exercida sobre as teclas. Foi este sistema que viria a estrear-se no SY-1.

IV | CS: A TRANSIÇÃO PARA SINTETIZADORES COMBINADOS

Em 1975 a Yamaha apresentou o GX-1 como um modelo Electone para concertos. Porém, os primeiros produtos fora da série do Electone a herdar as tecnologias únicas do SY-1 foram os sintetizadores combinados da série CS. Uma das características mais impressionantes dos sintetizadores CS era os circuitos integrados, empregues nos seus geradores de sons e controladores, componentes que até essa altura eram geralmente compostos por conjuntos de transístores. A integração de tecnologia de ponta cimentou o caminho para fantásticas reduções de peso e um potencial de portabilidade melhorado destes equipamentos. Considere-se, por exemplo, o GX-1 e o CS-80, sintetizador topo de gama da sua linha: apesar destes dois instrumentos certamente diferirem em termos de design e contexto de utilização, o GX-1 pesava mais de 300 kg e custava cerca de sete milhões de yens, enquanto que o CS-80 pesava apenas 82 kg e custava cerca de 1.28 milhões de yens, o que significa que um músico mais facilmente poderia adquiri-lo ou transportá-lo.

Keith Emerson (Emerson, Lake and Palmer) em sound check num Yamaha GX-1, Montreal Olympic Stadium, Canadá 1977. © Michael Putland

Os sintetizadores Yamaha, na época, apresentavam duas características bastante distintas, a primeira das quais era a capacidade de memorizar sons programados. Atualmente, a capacidade de arquivo de sons originais na memória de um instrumento é um dado adquirido, tal como gravar um ficheiro num computador. Mas nos anos 70 ainda não existia RAM ou ROM por isso foi empregue uma abordagem extremamente analógica para guardar os sons. Como já referido, os valores de resistência fixos, que correspondam a posições específicas nestas alavancas, estão integrados neste circuito. A combinação destes valores resulta num determinado som ou tom, levando estes circuitos – bastante usados na época – a serem chamados de tone boards.

Yamaha CS-80

Em instrumentos como o GX-1, os tone boards eram fisicamente inseridos e removidos para alterar sons. Como tal, a Yamaha empregava um método de armazenamento de sons semelhante aos cartuchos ROM de tipo analógico. Por outro lado, o CS-80 possuía uma funcionalidade que permitia alternar de forma instantânea entre quatro sons originais. Apresentava, na realidade, quatro conjuntos completos de elementos de memória, com um elemento de memória de cada conjunto a corresponder a um controlador específico no instrumento. Cada um dos quatro conjuntos podia, assim, ser usado para armazenar todas as posições de controladores para um som criado pelo utilizador.

O CS-80 também se encontrava equipado com uma barra portamento, também conhecida como ribbon controller, que podia ser usada para modular o som com suavidade, e uma funcionalidade de aftertouch que detectava a pressão aplicada a cada tecla sustida e alterava o tom de acordo com essa pressão.

V | DESIGNS COMPACTOS. PREÇOS COMPACTOS

Na última metade de década de 70, a série CS foi alargada para incluir sintetizadores monofónicos de baixo preço, o que levou à sua maior adopção junto de músicos amadores e popularidade crescente. Graças, em parte, aos rápidos avanços a nível dos circuitos electrónicos integrados, e aos consequentes preços mais baixos, o CS-5, introduzido no mercado em 1978 pesava apenas 7 kg e custava cerca de 62 mil yens. Muitas das funcionalidades e características tecnológicas dos sintetizadores modernos da Yamaha foram forjadas durante o desenvolvimento de instrumentos mais compactos e menos dispendiosos como estes. Por exemplo, os controladores de pitch bend e modulação com forma de roda dentada do CS-15D tornaram-se funcionalidades características nos instrumentos e são empregues nos modelos mais recentes da série MOTIF XF.

Em 1979 foi lançado o CS-20M, o que marcou a passagem para a tecnologia digital a nível do armazenamento de sons. O CS-70M, introduzido em 1981, era muito semelhante aos instrumentos modernos a nível de funcionalidades, nomeadamente no que dizia respeito à função de sintonização automática que veio resolver os recorrentes problemas de sintonização que os sintetizadores analógicos apresentavam, e que apresentava também um sequenciador integrado com base num microprocessador dedicado. O CS-01, de 1982, foi um sintetizador realmente único. Capaz de trabalhar a pilhas e equipado com um miniteclado, uma coluna integrada e possibilidade de usar à tiracolo, entre outras características, deu lugar a uma nova era tanto em termos de sintetização de som, como de utilização destes instrumentos

Yamaha CS-01

Lançado em 1982, o CS-01 apresentava um corpo compacto (48.9 x 3.6 x 16 cm) que pesava apenas 1.5 kg, permitindo aos músicos juntar uma alça e usá-lo como teclado à tiracolo. Funcionava a pilhas e vinha equipado com rodas de pitch bending e modulação no topo esquerdo do corpo do instrumento, este sintetizador permitia aos intérpretes movimentarem-se em palco de forma semelhante aos guitarristas. O CS01 oferecia capacidade de controlo de profundidade, um corpo cinzento como cor standard, e esquemas de cor em brancos, preto e cor de vinho também disponíveis (no Japão). Chick Corea foi um dos artistas que usou o CS-01 em palco (player de vídeo em baixo), tendo depois passado a usar o KX5, um controlador MIDI que podia ser usado remotamente.

A exploração tecnológica acelerou e a Yamaha introduziu conceitos como o interface de utilização, geradores de som com base em sampling, capacidade multitímbrica, até chegar ao MOTIF, ao Montage ou ao Genos. A homenagear esta ilustre história, em 2015 a marca nipónica recriou alguns dos seus synths mais icónicos na gama Reface.