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A História de Zoso

A História de Zoso

Nero

Jimmy Page, o místico guitarrista dos colossais Led Zeppelin, nasceu no dia 09 de Janeiro de 1944.

Naturalmente, a sua importância na música, o seu talento único e impacto mediático, reflecte-se editorialmente, sendo um dos artistas com mais artigos dedicados aqui na AS. Aproveitamos para rever a carreira de Jimmy Page e, naturalmente, dos Led Zeppelin e compilamos alguns desses artigos, em jeito de bibliografia auxiliar. Desde logo, o mais recente, que tanto entusiasmo criou durante este último biénio.

No final de 2018, a Fender anunciava que se associaria às comemorações do 50º Aniversários dos Led Zeppelin e a Jimmy Page para recriar a mística 1959 Telecaster do guitarrista. Fora criadas quatro versões, duas de produção normal e duas de edição limitada, construídas por Paul Waller na Fender Custom Shop, recriando o visual dos espelhos circulares ou a pintura do dragão. As de produção normal são uns guitarrões, como pudemos comprovar com o excelso guitarrista português Mário Delgado, testando quer o modelo Mirror, quer o modelo Dragon.

Originalmente, Page recebeu a Telecaster em 1966, um presente de Jeff Beck após o recomendar para ocupar o seu lugar nos The Yardbirds. Ao longo dos anos, a Telecaster teve vários visuais e representou diversas personagens, consoante as personalizações estéticas e sónicas que Page lhe atribuiu. Quando a recebeu originalmente, a guitarra possuía um imaculado acabamento White Blonde de fábrica e assim ficou até Fevereiro de 1967, quando Page lhe acrescentou oito espelhos circulares ao corpo. Page usou a Telecaster espelhada durante pouco tempo no final dos The Yardbirds e, a meio de ’67, mudou novamente o visual da guitarra. Removeu os espelhos, removeu toda a tinta e pintou a guitarra pessoalmente, pintando à mão um místico dragão no corpo do instrumento.

Quando os Led Zeppelin se formaram em 1968, a Dragon Telecaster era a guitarra principal de Jimmy Page e o músico usou-a exaustivamente em palco e em estúdio até 1969. Foi a guitarra principal nas sessões do álbum de estreia da banda, “Led Zeppelin I”. Então, no regresso após uma pequena digressão, Page descobriu que um solícito amigo havia desmontado o corpo da guitarra e pintado por cima do dragão. Esta pintura comprometeu o som e o circuito eléctrico, deixando apenas o pickup do braço funcional. Page resgatou o braço, colocando-o na sua Tele com o sistema B Bender (podem ler tudo sobre esse modelo AQUI), e tornou a remover a tinta e a procurar restaurar o corpo da guitarra que reformou.

Fazendo uma retrospectiva a 50 anos atrás, Page começou por usar um modelo Supro Coronado. Este amp, após ter caído da carrinha de backline dos Led Zeppelin foi restaurado e, aproveitando a ocasião, modificado de acordo com especificações do guitarrista. De acordo com o mito, Page manteve essas especificações ocultas até hoje, em que são disponibilizadas na forma do Sundragon, na NAMM 2019. Para isso o guitarrista contou com a colaboração dos engenheiros Mitch Colby e Perry Margouleff. Podem ler com maior profundidade sobre as guitarras e o amp na edição impressa AS#62, na nossa loja.

ZEPPELIN

Os Led Zeppelin, em 1969, depois do sucesso do seu álbum de estreia, surgiam motivados pela rapidez com que os seus concertos hiper eléctricos os fizeram passar, nos Estados Unidos, de opening act para os Vanila Fudge a headliners, com actuações alargadas que deram origem a lendas como as jam em “Dazed and Confused” ou “Communication Breakdown”. Aliás, diz-se que muitos dos riffs de “Led Zeppelin II” surgiram espontaneamente desses improvisos em “Dazed and Confused”. O quarteto fixava um riff que gostava e procurava gravá-lo imediatamente. Assim, “II” acabou com 9 canções gravadas em vários estúdios diferentes – uma manta de retalhos cosida pela produção Jimmy Page e a mistura de Eddie KramerPage estava tão apaixonado pela engenharia de Kramer nos álbuns de Jimi Hendrix como qualquer um fica ao ouvir o tremendo riff de “Whole Lotta Love”.

O groove de “Good Times Bad Times”, a fúria de “Communication Breakdown” ou a acidez de “Dazed And Confused” foram acusados do roubo de leaks aos clássicos do blues afro-americano (na verdade, vários temas tiveram os seus créditos reformulados mais tarde). Então, os Led Zeppelin conseguiram no segundo disco dissipar qualquer dúvida quanto à sua originalidade e no quão influente se tornariam com o decorrer do tempo. Ainda que a imprensa não tenha amado imediatamente o disco, ele acabou por tornar-se axiomático na história do rock ‘n’ roll e do hard rock, como já se começava a apelidar a estética sonora da banda.

O som “roubado” ao blues mantém-se, mas a irascibilidade de “Whole Lotta Love”, aquele misticismo Ledder de “Thank You” (quase um preâmbulo a “Stairway to Heaven”), o balanço de “Heartbreaker” ou o épico “Moby Dick” são pegadas de gigantes cujas réplicas ainda hoje fazem estremecer as fundações da Terra. Em entrevista, publicada integralmente na AS#41, Jimmy Page fala deste mundo de fusão de ritmos e escalas, de exploração: «O que é preciso entender é que os Led Zeppelin, os seus músicos, eram uma banda mergulhada nas raízes. Cada um de nós havia sido um investigador musical. Era como se tivessemos uma licenciatura na Universidade de Vida Musical, esse era o nosso nível de compromisso. Quando nos tornámos um colectivo, surgiram estes tipos de elementos em que ouves um pouco de um “gancho” rockabilly aqui, um pouco de jazz ali, blues de Chicago acolá ou um pouco de Elvis além… Há tantos carácteres diferentes que são espelhados individualmente e musicalmente. E chega ao ponto em que – é demasiado foleiro falar num caldeirão – se torna uma fusão. Fusão musical. É isso que acontece».

A BATALHA POR STAIRWAY TO HEAVEN

As acusações de plágio são uma sombra que paira sobre Jimmy Page e os Led Zeppelin ainda nos nossos dias. Por exemplo, a banda foi processada em relação ao tema “Boogie With Stu”, originalmente creditada à Sra. Valens. Page recorda a situação: «Sim. Como costume, a intenção da banda era a melhor, o som estava na minha cabeça, mas a letra vinha daí. A parte boogie é apenas o Ian Stewart a tocar de uma forma que só ele conseguia num piano “impossível” – a acção estava tão alta que mais ninguém, a não ser o Stu, conseguia tocar. A forma como o fez, é inacreditável. Há tanta alegria na sua prestação. Era o tipo de coisa que podíamos fazer, podíamos gravar e não fazia qualquer diferença, pois na altura estávamos a viver na casa, na nossa primeira visita a Headley. Podíamos parar o que estivessemos a fazer, pegar numa coisa dessas e depois voltar à anterior. E isso era algo que necessitava de ser ressuscitado, era bom demais para colocar de parte. Foi por isso que surgiu no “Physical Graffiti”. Mas, de facto, alguma da letra usada fazia parte da versão do Ritchie Valens, então creditámos a Sra. Valens, pois o Ritchie Valens estava morto. E então acabou por ser criado um problema».

O processo mais mediático foi, no entanto, a batalha jurídica pela épica “Stairway To Heaven”. Tudo começou quando Mark Andes, baixista dos Spirit, processou a banda por plágio, afirmando que, três anos antes de “Stairway To Heaven”, os Spirit escreveram e editaram “Taurus”, depois copiado pelos Zeppelin. Mais, Andes pretendia impedir “Stairway…” de surgir nas reedições da discografia remasterizada por Jimmy Page. Andes entregou o caso a uma equipa de advogados que conseguiu fazer avançar o processo para julgamento.

Depois de um longo processo, o julgamento pela disputa de direitos de autoria do clássico “Stairway To Heaven”, iniciado a 14 de Junho de 2016, terminou no dia 23 de Junho do mesmo ano. Após um dia de deliberação, o júri considerou que os Led Zeppelin não plagiaram a canção “Taurus”, dos Spirit, escrita pelo guitarrista Randy Wolfe. Podem ler toda a história dessa disputa (que foi reaberta no final de 2019, ainda sem novos desenvolvimentos).

ZOSO

Já que falamos de “Stairway To Heaven”, é precisamente do quarto álbum dos Led Zeppelin que vem a alcunha “Zoso”, derivada dos símbolos que os quatro músicos passaram a utilizar como indentificação.

O símbolo de Page tem sido alvo de muita especulação (incluindo referências a magia negra) sobre o seu significado. John Paul Jones é representado pelo triqueta que, na sua simbologia mais simples, indica precisão e perfeição. Os anéis de Bonham representam uma ilusão: parecem idênticos, mas o seu encadeamento é impossível se os três forem círculos perfeitos e iguais. Virando o símbolo do avesso… é o logo de uma marca de cerveja! A pena dentro do círculo, de Plant, é baseada no símbolo da civilização de Mu.

Jimmy Page aprendeu a tocar guitarra a ouvir discos. «Foi exactamente assim que aprendi. Tinha que ter um disco e ser capaz de o tocar. Era nisso que gastava a mesada que os meus pais me davam, a pagar uma guitarra ou a comprar discos. Era preciso escolher bem o que comprar [risos], pensar no solo de guitarra que irias aprender ou assim. Ouvir coisas do James Burton ou do Freddie King, ou outra coisa qualquer. A tentar, o tempo todo, elevar a tua técnica, se quiseres, ou o conhecimento, expandir o intelecto».

Na construção do seu som, cruzou-se com outro nome lendário. Numa extensa entrevista com a Uncut Magazine, aborda vários assuntos como os primórdios da sua carreira, a sua relação com Robert Plant, o extraordinário legado dos Led Zeppelin e também o seu som de guitarra. Recordando vários anos atrás, Page fala na revolução que a engenharia eléctrica de Roger Mayer provocou, mudando o seu som de guitarra e o da música rock para sempre.

Sete anos depois de terem começado a tocar juntos, os Led Zeppelin fizeram o seu álbum mais experimental, “Physical Graffiti”, sobre o qual nos fala o Jimmy Page (numa entrevista exclusiva que podem ler na nossa edição física mais recente), numa altura em que se celebra o 45º aniversário do álbum e o 40º aniversário da morte de John Bonham, que deixou um grafito físico que a banda nunca conseguiu apagar. Por isso, convidámos o extraordinário baterista Alexandre Frazão, para nos falar de Zeppelin, de Bonham e da icónica bateria Ludwig Vistalite.

Depois da morte de Bonham, os Led Zeppelin nunca mais gravaram, como é sobejamente reconhecido. No entanto, o músico já revelou várias vezes o seu desejo de voltar aos palcos de forma assídua, mas isso é algo que nunca se tornou realidade. Nos últimos anos esteve activo na reabilitação da discografia dos Led Zeppelin, algo que não passou despercebido a ninguém que siga o universo rock, e também na recuperação de alguns trabalhos mais obscuros, como a banda-sonora de “Lucifer Rising”, em 2012, ou o seu trabalho anterior aos Led Zeppelin e Yardbirds.